Amor
Você me ama?
Acho que sim.
Você acha que me ama?
Hmmm, acho… Bom, primeiro, talvez, preciso que você defina o que você entenda que seja amar. Para saber se eu te amo nos termos que você entende como amar.
Amar é… é um sentimento muito forte que você tem por outra pessoa, a ponto de querer fazê-la feliz e estar sempre próximo.
Hmmm…
Sabe? Querer viver a vida com essa pessoa em toda sua plenitude, ser feliz juntos.
Bom, tenho minhas dúvidas se penso como você. Acho que amar, na minha concepção, trafega em outras vias.
Como assim? Você ama diferente?
Não que eu ame diferente. Mas acho que amor vai além de querer fazer alguém feliz, ou querer passar a vida com ela.
O que é amar para você?
Acho que para mim o amor é um sentimento muito forte, como você disse, mas extrapola a questão da felicidade ou da companhia.
Como assim?
Acho que se uma pessoa ama outra, ela não precisa fazê-la feliz ou querer toda a plenitude da convivência e do afeto, mas também estar plenamente satisfeito com a felicidade da outra.
E como isso se diferencia?
Acho que se você está feliz, independente do motivo, isso me traz um sentimento alegre, pois eu te amo a ponto de desejar que você seja feliz. E felicidade pode vir de qualquer forma. Podem ser relações sociais, profissionais, viagens, habilidades novas adquiridas, preocupações, cuidados, um momento em que você se sentiu bem, um abraço em qualquer momento e por qualquer motivo, uma pintura bem feita, um livro lido que foi tão bom a ponto de te fazer olhar para o céu por um instante imaginando os personagens na vida real. Se essas coisas te fazem feliz, isso me deixa feliz. E isso me satisfaz enquanto prática do amor.
Mas se você define assim o amor, porque uma pessoa decide se relacionar com alguém por um longo tempo, namorar, morar junto, essas coisas? Isso não é amor?
Acho que sim. Todas estas práticas talvez façam sentido se existe um sentimento mútuo que surge quando compartilhamos as nossas vidas. Acho que o amor permeia esses rios. Em vidas compartilhadas ambas pessoas deveriam desejar a felicidade da outra, e das outras em um contexto mais amplo. Acho que uma forma de pensar e agir não deve se sobrepor à do outro, muito menos largada nas mãos do outro como se lidar com as questões individuais fosse um dever do outro, sabe?
Como assim?
Ahhh, tipo se pensar em ciúmes, por exemplo. Ciúmes é um sentimento que todas as pessoas sentem, sem exceção. Eu sinto, você sente, e todas as pessoas ao nosso redor sentem. E esse sentimento chega em maior ou menor grau. A questão que eu penso é que meus ciúmes devem ser lidados por mim, e não por você. O ciúme nunca deixará de existir, ele pode incomodar bastante e fico pensando em como lidar com isso… Eu posso tentar encontrar o que me causa ciúmes, posso verbalizar isso para você. Mas quem precisa encará-lo de frente sou eu.
Mas se isso fosse uma regra as pessoas não se relacionariam. Os ciúmes existem porque o outro nos causa algo.
Mas esse algo tem a ver com o quê? Insegurança?
Pode ser que sim…
Mas a insegurança é sua. Se a nossa relação, nosso convívio, nossa história, e todos os sentimentos que lidamos mutuamente não são suficientes para que você lide com essa insegurança, eu preciso abandonar minha felicidade por você? Você não se sente feliz ao me ver feliz? Você não é feliz?
Sim, mas, pode ser por medo também.
Medo de que?
Da perda, por exemplo.
Perder a relação? Perder algo que é ou era muito bom? Acho que nos resta entender que as relações vêm e vão. A cada momento faz sentido estar mais próximo de alguém, isso não é algo fixo. Pode ser por um tempo curto, podem ser por várias décadas. Cada pessoa tem seu tempo. As pessoas que eu me interessava na adolescência não são as mesmas pelas quais eu me interesso hoje. O fluxo da vida exige esse tipo de trânsito. A metáfora que eu uso é a da estrada ou das ruas. A gente as segue, vamos fazendo nosso caminho. E outras estradas e ruas vão cortando esse nosso trajeto, encontrando, desencontrando, indo junto, separando… Acontece. A perda também faz parte da ação amar. Entender e deixar ir…
Mas eu quero ser o motivo da sua felicidade. Eu quero te fazer feliz! Isso é amor.
Você quer ser um dos motivos da minha felicidade, mas é impossível você ser o único motivo, a única razão. Se eu reduzir amar ao que sinto por você, ou ao sentimento que você causa em mim, você está me dizendo que eu deveria ser triste em todos os outros aspectos da minha vida. Isso é muito injusto comigo. Isso não é amor.
Não é ser a única razão, mas ser a mais forte.
Eu não consigo entender as razões enquanto uma competição de importância na felicidade de alguém…
Hmmm… Mas então, você me ama?
