[Stencil] A Grande Onda de Kanagawa

Interesse

Não me lembro bem quando foi que essa imagem se fixou tanto no meu imaginário. Mas gosto de pensar que o interesse que tenho em fenômenos da natureza geraram essa fixação. Em 2004, acompanhei atentamente todos os vídeos curtos e de baixa qualidade que circulavam na internet mostrando o tsunami da Indonésia. Tragédia que eu assistia o tempo todo, cada segundo de gravação. Quando entrei no curso de Geografia em 2009, devorava os livros de geologia e de cartografia, minhas áreas preferidas. A primeira e única vez que vi um vulcão foi em 2012, sobrevoando a Cidade do México. Paixão à primeira vista. Vejo vídeos de terremotos em diferentes localidades e fico imaginando como será essa sensação da terra se mexendo. Vi praticamente todos os vídeos do tsunami de Fukushima, 2011, além de ver vários vídeos de erupções vulcânicas, inclusive o canal ao vivo das Ilhas Canárias. Me lembro bem da minha professora Mônica, de geologia, falar sobre vulcões que expeliam lava continuamente na América Central. E até hoje eu tenho o desejo de ver isso ao vivo. Natureza que tudo destrói. Não é um sonho de destruição, mas uma certa admiração da nossa pequenez frente ao mundo.
Esse interesse que eu tenho de vivenciar certos fenômenos que inexistem atualmente nesse pedaço de terra em que vivo são algo que me movem. Imagino que observar a gravura “A Grande Onda de Kanagawa”, do mestre Katsushika Hokusai, talvez me traga um pouco dessa sensação. Não me lembro qual a primeira vez que a vi, mas me lembro bem de analisar cada centímetro desta gravura.

Produção

Foi em 2013 que eu tive a ideia de começar a reproduzir “obras de arte” com a técnica do stencil. Me propus a cumprir o desafio de logo começar com a imagem que circula no meu imaginário. De tanto observar os elementos da gravura, já tinha uma noção de como fazer. O processo não foi nada fácil. Na época, eu não sabia fazer separação de cores no Photoshop, e o processo foi completamente manual. Fiz uma impressão da gravura em tamanho aproximado de A3. Separei uma dúzia de radiografias, papel carbono branco, e fiz o decalque e as separações de cores de forma completamente manual. Não tinha noção de como iria ser o resultado, até porque tinha dúvidas se meu daltonismo me permitiria compreender as diferenças tonais. Mas não perdi muito tempo com a ansiedade e logo já comecei os cortes.
As camadas possuíam diferentes níveis de complexidade. O que era água, seriam três cores, sendo a primeira com muitos detalhes e dando contra forma à parte branca da onda, e outras duas camadas tonais complementares.
O céu, apenas duas camadas, envolvidas em borrifos e degradês para simular os tons da gravura original. As canoas, duas camadas de cores, tom sobre tom. As pessoas, apenas a camada das roupas.
Por último, o mais complexo. Uma camada de linhas finas que estariam em toda a imagem; repleta de pequenos detalhes essenciais para uma boa visualização; e uma última camada com as bolhas brancas saindo das ondas, além do papiro de informações sobre a obra que, nesta imagem, está presente no céu. Ambas camadas apenas funcionariam se todo o encaixe das cores anteriores estivessem perfeitos.

Uma questão que me deixou bastante inseguro no início foi a utilização das cores. E, nesse sentido, me esbarrei em duas questões:
– Em primeiro lugar, cada referência da imagem que eu encontrava nas buscas online me traziam cores distintas para a água e, de forma ainda mais evidentes, para o céu ao fundo. As variações eram enormes.
– Em segundo lugar, eu estava sujeito à disponibilidade das cores em spray que eu encontrava. Não é uma tarefa fácil achar a tonalidade certa, depende da marca e da disponibilidade da loja em ter o que precisamos. Isso, sem contar, que a cor de referência da lata nem sempre é a mesma da tinta quando pintada.

Lágrimas

Em 2015, tive a oportunidade de ver uma impressão da gravura ao vivo, no Metropolitan Museum. Vi tudo com meus próprios olhos e boatos dizem que algumas lágrimas escorreram. Ver a gravura in loco é muito diferente de ver as digitalizações, com suas correções de matiz e contrastes. Ver de perto cada veio da madeira que aparecia na impressão, a utilização das cores e degradês, cada detalhezinho de entalhe. Tudo isso me emocionou bastante.

Acho que essa experiência me trouxe uma sensação de que tudo que eu tinha visto antes era bem diferente, que as imagens de internet são em muito superadas pelas experiência ao vivo. Pra quem curte pensar na técnica, no processo, penso que somente o contato direto dos olhos com a impressão nos permite ver a grandeza e a riqueza dos detalhes, a forma de entalhe e tratamento da madeira, o sangue e o suor que ali foram depositados.
Por incrível que pareça, ver a gravura ao vivo me deixou mais confiante em experimentar outras combinações de cores, tentar criar outras atmosferas, ousar mais.

Acho que a experiência de ter feito esse stencil, todo de forma manual, me trouxe uma sensação das próprias limitações das técnicas, apresentando suas diferenças estéticas e uma sensação de que, cada vez mais, a xilogravura é algo muito mais complexo que uma mera estética.
“A Grande Onda de Kanagawa”, com toda sua fúria e sua beleza, abraçando o Monte Fuji, enquanto navegantes são espectadores e participantes deste momento, é algo que me toca profundamente.

Vídeo curto sobre as etapas de produção

Talvez as pessoas não tenham noção do que foi pensar e produzir essa impressão em stencil. Do trabalho em cortar, do trabalho em imprimir todas as 9 camadas de matrizes, com aproximadamente 14 cores sendo utilizadas. A dimensão disso tudo se perde com o tempo, e apenas o produto é apresentado, com suas falhas de impressão, borrões de tintas, inexatidão de cores. Mas acho que talvez tenha sido um processo tão relevante e significativo para mim que não posso ignorá-lo do meu histórico. O tempo de observação, os cuidados com o corte, a reflexão sobre as cores. O processo de impressão em time-lapse pode ser conferido a seguir. Produção de várias impressões em spray, muitas delas com cores experimentais e muita paciência.

Processo completo de impressão de todas as camadas

Halftone invertido

Se tem um recurso gráfico de impressão que eu tenho curtido estudar é técnica de halftone (meio tom). Tudo isso consiste em efeitos (que podem ser linhas, pontos, elipses, círculos, etc) que enganam o nosso olhar e nos fazem enxergar “fotografias” bem realistas, utilizando poucas cores, ou até 1 cor apenas.
Nessa post eu gostaria de mostrar-lhes os estudos de halftone invertido. Essa técnica consiste em utilizar as luzes da imagem como recurso para impressão em suportes escuros. Eu já cheguei a fazer estampas de camisas em serigrafia assim, e o resultado, mostrado a seguir, foi bem satisfatório:

O fato é que eu experimentei, também, um halftone de linhas para ser feito em stencil e impresso no papel preto. Foi um processo bem trabalhoso, mas que rendeu uma produção bem massa. Utilizei a fotografia de uma fila de zapatistas na Selva Lacandona. A fotografia tinha uma certa névoa, e isso casou bem com o efeito do spray esfumaçado/borrifado no papel.

Impressão com spray branco em MDF pintado de preto e com moldura.

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Stencil Halftone em duas cores

Halftone” ou “Meio Tom” é um recurso gráfico muito utilizado nas técnicas de impressão por conseguir simular, com poucas cores, um certo realismo na impressão. Sabe quando você vê uma fotografia antiga nas páginas do jornal e ela é formada por diversos pontinhos? Isso é um halftone.

Já faz algum tempo que eu tenho estudado um pouco disso nas minhas impressões, sobretudo trabalhando os efeitos no Photoshop, e transpondo para impressões feitas de forma artesanal. Aqui, aqui e aqui tem alguns modelos de impressão em halftone que andei testando aqui no meu estúdio.

Há alguns meses iniciei um projeto para trabalhar halftone em stencil com duas camadas de cor. A ideia é trazer mais realismo à imagem final. O formato escolhido foi o A2, por ser grande o suficiente para conseguir se tornar cartaz lambe-lambe posteriormente. A foto que usei de modelo se refere à um encontro Zapatista, e nela uma mulher amamenta uma criança enquanto participa da deliberação de alguma pauta. Uma imagem forte, que me traz elementos de organização, resistência e maternidade.

Fotografia de Emiliano Thibaut

Como o papel tem fundo branco, pude trabalhar com duas cores mais escuras em meus modelos virtuais. Optei por fazer haltone de linhas, em que o que engana nossos olhos e nos faz enxergar a fotografia é somente a diferença de espessuras das linhas. Para dar um efeito interessante, cada camada de cor teria uma inclinação de 45° em direções opostas, formando algo parecido com uma tela. Decisões tomadas, fiz a impressão e comecei o processo de corte, começando pela camada superior e mais trabalhosa.

A camada inferior, além de menos detalhada, preferi fazer as linhas com uma espessura maior, para diferir das linhas mais finas da camada superior. Era para servir como base, como uma cor intermediária antes dos detalhes e do contraste final.

O resultado dos cortes ficaram bem interessantes. Eu usei plástico de encadernação transparente, pois é bem fino e resistente, sendo mais fácil de cortar que um acetato, por exemplo, também conferindo mais resistência à umidade e ao calor.

Na hora da impressão, pensei em um vermelho como cor intermediária na primeira camada, e preto como fechamento, pra subir o contrate final. Mas duas coisas aconteceram nesse processo:
1 – O preto por cima do vermelho tampou os detalhes da camada vermelha;
2 – A junção preto + vermelho escuro deixou a imagem desnecessariamente escura, como se fosse uma foto de ISO100 no final de uma tarde nublada.
Desta forma, ao invés de utilizar o preto chapado, optei por um preto transparente, conhecido como Fumê, para manter uma cor intermediária mais suave. Este último resultado me agradou mais.

Enfim, todo processo feito à mão, cortado com estilete, acaba tendo suas limitações, e a questão é buscar a melhor forma de concluir a impressão de uma maneira que agrade aos olhos. O processo de ser artista consiste nessa reflexão a cada etapa, fazendo escolhas para seguir adiante da melhor forma possível. A impressão do vermelho escuro combinado com o fumê foi a que mais me agradou, deixou os traços mais suaves, os detalhes mais aparentes.

O que acharam?

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Como fazer stencil?

Olá a vocês que acompanham as postagens daqui. Venho lhes dizer que está no ar mais uma aula no canal de Youtube, e desta vez eu ensino como transformar uma imagem em um stencil utilizando o aplicativo Photoshop, e também utilizando o editor de fotos simples do celular para chegar no mesmo resultado. Espero que gostem, abraço.

Colar lambe-lambe

Colar lambe-lambe é uma prática universal e que me dá muito orgulho de fazer parte do movimento. Eu faço a produção toda em stencil e em serigrafia, e a minha cola é bastante espessa, uma mistura melequenta de água, polvilho azedo e soda cáustica. Faz tempo que dei um tempo nas tarefas de intervenção pela cidade, mas hoje deu saudade e pretendo retomar em breve os rolés.

Stencil em Halftone

Halftone (ou Meio Tom) é um técnica de criar efeitos de degradês e luz e sombras, utilizando apenas uma cor chapada. Consiste em utilizar formas em diferentes tamanhos e espessuras para “enganar” o olho e simular uma imagem como se fosse real.

Muito utilizado em técnicas como serigrafia, xilo/linóleo e stencil, o Halftone é a principal técnica de simplificar a matriz para conseguir um bom resultado de impressão artesanal.

Nesse caso, eu peguei uma foto antiga, de uma modelo que pousou para o artista Alphons Mucha, e fiz uma versão em Halftone em stencil, utilizando linhas. Repare que as linhas possuem diferentes tamanhos e espessuras.

Esta é a foto original, que serviu de modelo para meu stencil.

As impressões podem ser adquiridas na minha loja online.

Stencil Mars Blackmon/Spike Lee

Conheci o personagem Mars Blackmon assistindo ao seriado “Ela Quer Tudo”, dirigida por Spike Lee. É uma série adaptada do filme homônimo dos anos 60, dirigido e estrelado por Spike Lee também. A série/filme gira em torno das experiências sociais, amorosas, profissionais de Nola Darling, e Mars Blackmon é um dos personagens coadjuvantes.

Comecei a ver a série por conta do visual do personagem Mars, com Anthony Ramos fazendo seu papel. Messenger com single speed, visual a caráter bem estiloso, cap de ciclista, personalidade própria, o personagem com quem mais me identifico dos três coadjuvantes. Essa imagem me fez querer acompanhar a série e, posteriormente, ver o filme.

O filme é diferente, traz elementos do contexto da época, e Spike Lee soube aproveitar bem o tempo/espaço, e as discussões e reflexões que os acompanham, em cada cena. Ambos trazem reflexões sobre a vida na cidade, racismo, relações humanas, cultura. Acho que vale a pena assistir.

Esses stencil que eu fiz é uma homenagem a esse personagem, Mars Blackmon, e seu criador, Spike Lee.

A impressão deste stencil pode ser adquirida através da minha loja virtual.

Stencil com referência pronta, mudando apenas o foco.

Stencil em 4 camadas

Revisitando trabalhos antigos, achei essas fotos tiradas pela minha querida amiga Raquel Pinheiro. São dois posters produzidos com stencil, provavelmente nos anos de 2014 e 2015. Eu realmente curto trabalhar com referências fotográficas, retirando elas de contexto e focando numa expressão de algum personagem. Essa foto original possuía vários outros elementos, tudo em tons de cinza.

Não sei quem é o autor da fotografia, nem de onde retirei ela. Eu coleciono muita imagem digital, e faz mais de 20 anos que sou assim.

Fazendo estampas de camisas

Olá, subi mais um vídeo pro meu canal do YouTube. Desta vez ensino a fazer estampas em camisas utilizando a técnica do stencil. É uma técnica simples, que você consegue reproduzir em várias camisas, misturar cores e estilos.

O vídeo é gratuito, mas se você quiser colaborar com qualquer volar, segue o link para a doação: https://laidea.minestore.com.br/produtos/doacao-para-cursos-online

No mais, espero que gostem. Qualquer dúvida, sugestão ou comentário, entre em contato pela caixa de comentários do WordPress ou do YouTube.

Abraços

 

 

Sobre vídeos

Ultimamente ando me arriscando na produção de vídeos. São tutoriais, processos, fragmentos de rolés, algumas aulas… Tudo será disponibilizado no canal do Youtube e no IGTV.

É uma ótima forma de registro do processo de trabalho, pois ver o produto sem saber por tudo o que passou antes de se tornar aquilo se perde um pouco da experiência.

O primeiro vídeo é um processo de corte e pintura de um stencil de 4 camadas. Foi todo filmado em Time-Lapse.

 

O segundo vídeo postado são de fragmentos de rolés, com cenas tomadas entre 2012 e 2019, em diversas cidades. São pequenos trechos de colagem de cartazes lambe-lambe e de stickers.

 

No canal do Youtube seguirei postando vídeos, tem muito material guardado aqui, que eu filmei há muitos anos e não sabia o que fazer com isso. Também estou me arriscando na edição, não conheço muito, mas estou fazendo o que posso.

Reflexões sobre a oficina no Memorial

No dia 27/07 eu fui convidado para propor uma oficina voltada para crianças no Memorial Minas Vale. Enviei duas propostas e a equipe do educativo curtiu a proposta de uma oficina de impressão de estêncil. Colocamos as diretrizes: média de idade entre 7 e 12 anos, público passante, estêncil com referências ao acervo do local, máximo de 15 pessoas na oficina para não tumultuar, oficina com 2 horas de duração. Tudo certo. Eu e minha esposa fomos ao Memorial fotografar algumas peças para usar de referência e tivemos várias surpresas. Não sei se é o meu preconceito com Museus e Galerias, ou com o Circuito da Pça da Liberdade, ou com as grandes empresas que dominam tudo, mas o local me impressionou bastante. Muitas obras sobre Minas Gerais, praticamente contando a história da Estado, tem pintura rupestre, objetos, maquetes, referências contemporâneas, literárias, tem coisa do Sebastião Salgado, sala multimídia… te confesso que me deu um certo pesar de não conhecer este espaço antes.

A oficina foi em um sábado e eu passei toda a sexta feira cortando estêncil para a oficina. A maior parte das matrizes foram sobre pinturas rupestres. Fiz também o mapa regional de Minas Gerais em três matrizes, fiz um de uma decoração do Memorial e outro de um objeto bem específico, mas que representa bastante MG.

Chegamos em ponto e começamos a arrumar a mesa. Alguns membros da equipe do educativo me auxiliaram durante o processo, bem como minha esposa, parte essencial da fluidez do trabalho.

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Logo foram chegando o público do museu, e muitos já chegavam cedo para a oficina, para não perder lugar. A partir daí foram as duas horas mais curtas pelas quais eu já passei na minha vida. Chegavam e chegavam pessoas, traziam seus filhos, perguntavam coisas, pediam papel, eu e Natália, minha esposa, naquela correria de tentar atender todo mundo, explicar como funcionam as técnicas de impressão, como fazer com a tinta, etc. Nusga, quando vi já estava quase na hora de encerrar a oficina. Crianças e adultos de todas as idades acabaram fazendo a oficina. Isso mesmo, não se limitou à faixa entre 7 e 12 anos. Tinham crianças mais novas, adolescentes, jovens, adultos, muitos pais fazendo acompanhando filhos mais novos, sobrinhos e sobrinhas, muitas pessoas de outros estados passaram por ali, e eu pensando em quão rica pode ser uma experiência assim em uma manhã de sábado. Uma mãe presente me disse que gosta de ir fazer essas oficinas porque são os momentos em que ela consegue distrair do cansaço do dia a dia. Outro pai foi ajudar o filho, e o filho não gostou, então ele mesmo foi fazer a pintura/impressão dele. Vários familiares perguntando sobre os materiais, pois viram que são coisas simples de se fazer, e que, apesar da bagunça, entretém as crianças muito mais que um celular brilhando na cara delas. Algumas crianças se sujavam, pintavam com as mãos, outras eram mais sérias, queriam fazer algo esteticamente interessante, outras fizeram várias composições. Cabuloso. Muitas crianças vieram me agradecer ao final da oficina, e nisso eu me derreto. Adoro quando me agradecem por algo que eu compartilhei/ensinei/ajudei. Talvez seja o grau de satisfação que me eleva e me faz entender que estou na área certa, apesar dos pesares.

Enfim, só tenho a agradecer a todxs que participaram e ajudaram nesse rolé. Foi muito massa.

Requebra!

Domingo vai rolar um evento bem massa em BH. Dá uma olhada!!
As inscrições podem ser feitas clicando aqui.

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Em momentos de crise, reinventar é mais do que necessário, REQUEBRAr! Permitir enxergar por um outro olhar, mexer o quadril e por que não rebolar?!

Propomos um momento de colaboração, trocas e fomentação da cultura criativa independente. Um dia para vivenciar novas linguagens, formatos e possibilidades.

O REQUEBRA é um evento para a venda de produtos gráficos, oficinas, collab e discussões sobre empreender e criar.

           ********    PROGRAMAÇÃO:     ********

Oficina de Aquarela ———– com Prisca Paes — 10h às 12h

– Stencil —————————– com La Idea — 14h às 16h

– Oficina de Tag —————- com Fhero — 16:30h às 18:30h

– Desenhos de Letras aplicados em Lambe com Leoni Paganotti 

Gustavo Machado — 16:30h às 18:30h (pintura de letras)

             20h saída para aplicar os Lambes

********    SOBRE:     ********

OFICINA DE AQUARELA – Prisca Paes

É hora de você que sempre quis pintar – mas que não sabia por onde começar – descobrir a melhor maneira. Entender o que é preciso para começar a fazer as primeiras manchas e o melhor: colocar em prática!

Vem pintar com a gente?

 

Conteúdo programático: conhecendo os materiais, técnicas básicas: fundo seco, fundo molhado, sal, giz, máscara, usos do branco, preparação da tinta, Construção da palheta de cores, Prática e experimentações a partir do desenho

Materiais fornecidos pela Espaco Quebra: papel para aquarela Canson Mondval, estojo com bisnagas Pentel, pincéis para aquarela (pequeno, médio e grande), lápis para desenho, fita crepe, borracha, flanela, gode reservatório para água

OFICINA DE STENCIL – La Idea

La Idea é um projeto/pseudônimo de experimentação artística nascido em 2008, com o intuito de estudar, compartilhar e produzir arte em diferentes suportes. Entre as especialidades estão a produção de stencil, xilogravura, serigrafia, litografia, pintura, street art e muralismo. Além da graduação em Artes Visuais na UFMG e da passagem pela Escola Guignard da UEMG, foram realizados intercâmbios em Cuidad Juárez, México (2012), e Tucumán, Argentina (2016), onde foram realizados trabalhos de muralismos, gravuras, e o primeiro curso de stencil fora do Brasil.

Sobre o Curso:

O stencil é uma técnica milenar, tendo registros de sua utilização em pinturas rupestres, guerras, movimentos sociais, e atualmente muito presente nos movimentos de pós-graffiti. A técnica consiste em criar um molde vazado, que delimita a passagem de tinta em diversos locais da matriz para formar a figura. Nesta oficina, além de aprendermos o processo de iniciação da técnica, incluindo o desenho, os cortes e a aplicação de tinta, trabalharemos a construção de stencil com várias cores, e a produção de cartazes com a técnica.

OFICINA DE TAG – Fhero

Espaço ideal para quem quer um contato inicial com o graffiti e com as tags, letras típicas dessa cena mundial. A oficina busca trazer um outro olhar sobre a nossa escrita, abordando outras alfabetos e estilos tipográficos.

Conteúdo: desenvolvimento e criações de tipografias

PINTURA DE LETRAS APLICADOS EM LAMBE LAMBE – Leoni Paganotti e Gustavo Machado

A oficina será um espaço experimental onde os participantes entrarão em contato com o universo do desenho de letras. Haverá uma introdução teórica, básica e, em seguida, a experimentação de técnicas de escrita com materiais diversos.  Ao final da atividade cada participante irá produzir um lambe-lambe tipográfico personalizados que, mais tarde, serão colados na rua, conjuntamente.

Conteúdo pragmático

  1. Conceitos básicos: caligrafia, Tipografia, Desenho de letras / Lettering, Tipografia vernacular
  2. Explorando os Materiais: Lápis, canetas brush pen, pinceis, carcadores em geral, squeezers, tinta aquarela líquida, tinta acrílica, guache
  3. Produção: experimentação e produção dos lambes tipográficos
  4. Corre:Colagem dos lambes na rua

*Os materiais são empréstimos do Espaço QUEBRA, para uso exclusivo durante o workshop.

 

 

 

 

 

Sobre a técnica de estêncil

Estava dando uma olhada nos meus arquivos e me deparei com a foto do meu primeiro estêncil, feito em 2007. É uma estrela com as letras EZLN logo abaixo. Cortei esse estêncil para poder pintar uma camisa e ter, finalmente, a tão sonhada camisa do Movimento Zapatista. Depois da camisa, comecei a espalhar essa imagem por Belo Horizonte, e mal eu sabia onde que tudo isso iria chegar.

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Primeiro estêncil.

Minha curiosidade pela técnica foi muito além do que eu imaginaria. O ato de cortar uma placa de radiografia me dava tanto prazer, que eu tinha começado a cortar de tudo quanto é imagem. Alguns deles foram para as ruas, outros ficaram confinados às paredes do meu quarto (meu quarto era um caos imagético, todo mundo intervinha lá).

 

Nessa época, eu achava que já estava no auge da produção, tendo chegado ao limite e esgotado as possibilidade de exploração da técnica. Mero engano. Na internet circulavam várias fotografias de arte produzida com estêncil de um sujeito chamado Banksy. Este artista britânico, com suas obras irônicas e críticas à sociedade atual, me fez perceber que eu não estava nem próximo de um limite, quanto mais de um auge. Eram verdadeiras intervenções em diversos tamanhos, formatos e cores, com contraste, luz, sombra, detalhes. Me lembro de ficar caçando na internet cada vez mais imagens desses graffites, que me deixavam cada vez mais perplexo.

Acho que foi nessa época que eu comecei a perceber, também, os trabalhos do Cidadão Comum (Hoje, apenas Comum) pelas ruas de Belo Horizonte. Eram cartazes produzidos com estêncil, impressões em várias combinações de cores, rica em detalhes e sempre com a inscrição do autor em algum lugar da imagem.

Foi a partir daí que eu comecei a experimentar o uso de mais cores e alguns formatos maiores. Na época eu também não tinha acesso à tintas melhores, e usava sprays horríveis, desses de depósito de bairro. E isso não ajudava muito no processo. Não consegui encontrar muitas fotos de trabalhos assim, mas nessa época eu deixei de arriscar nos muros da cidade para estampar em camisas que eu vendia a preços simbólicos.

 

Nessa mesma época, comecei a arriscar a pintar as camisas com pincel a fim de complementar as estampas feitas com estêncil, colocar alguns detalhes, uma luz, algo que a deixasse mais artística. Isso deu tão certo, que culminou na melhorias das minhas habilidades com desenho, e foi quando ingressei na Escola Guignard, no curso de Artes Plásticas. Foi na faculdade que eu tive contato com esse mundo da arte, e é possível ver um salto nas questões técnica e estética das matrizes.

 

Comecei a ter mais cuidado com os detalhes, e a ter mais paciência na hora de produzir uma matriz. Testei outros suportes também, como discos de vinil e telas de pintura, e cada vez me davam ideias de tentar algo novo. Nessa mesma época comecei a produzir imagens com a finalidade comercial, fazia muitas coisas com temas de filmes, músicas, séries, temas políticos ou apenas decorativos. Com os discos de vinil, também era possível vendê-los na forma de relógios de parede.

 

Em 2012, após passar um semestre em Ciudad Juárez, México, e conviver com artistas de diversos coletivos (Rezizte, Puro Borde, Hunab Ku, CLVR…), foi quando eu finalmente compreendi a finalidade estético-política que se pode alcançar com o estêncil. O contexto em que vivíamos (Gastos desnecessários com Copa do Mundo e Olimpíadas, Despejos, Gentrificação, Manifestações…) fez com que “minha” criatividade (digo “minha” porque todo o resultado do meu trabalho a partir desta época foram frutos de ideias, discussões e eventos compartilhados e vividospor todxs que fazem/faziam parte da minha vida) borbulhasse, e eu passaria um bom tempo trabalhando em matrizes que foram o marco inicial do “La Idea” nas ruas.

Conduzido pelos cartazes do Rezizte, que retratavam a vida fronteiriça (US/MX), e pegando um gancho nos trabalhos do Comum, iniciou-se uma produção em larga escala de cartazes produzidos com estêncil. A primeira ideia foi fazer um menino jogando bola de chinelo, para mostrar que o futebol está além daquele que é vendido pela FIFA e pela mídia. Juntamente com a criança, estariam dizerem contra a Copa do Mundo. A segunda ideia foi pegar a fotografia que saiu na capa de um jornal do Rio de Janeiro, onde um indígena da Aldeia Maracanã olha para o céu, após sair a notícia que o Museu do Índio seria demolido para dar lugar a um estacionamento no Maracanã. A terceira ideia, e talvez o que seria a imagem mais conhecida do “La Idea” foi o rosto do El Marquéz, lutador de Lucha Libre, de Ciudad Juárez, e símbolo do Coletivo Puro Borde. Foi uma maneira de homenageá-los. Desta forma, a vida nas ruas começava a tomar forma. As matrizes eram feitas em diversas cores, eram bem chamativas, e possuíam tamanho A2.

 

Depois desses, vieram várias ideias de fazer cartazes sobre outros temáticas, e ainda ampliar a quantidade de lutadores. Essa insistência rendeu várias postagens nas redes sociais, e eu via uma resposta positiva quanto aos cartazes que eu produzia, afinal, eles começaram a ser requisitados para venda.

 

Faltam alguns trabalhos que eu não consegui achar fotos no caos virtual do HD, mas assim que eu der uma organizada, darei um jeito de colocar aqui.

Para terminar essa jornada no desenvolvimento da técnica, minha última empreitada no estêncil foi tentar reproduzir obras de arte, da maneira mais próxima possível. É claro que igual nunca ficará, mas eu tentei ser bem fiel ao original (imagem virtual).

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Essa reprodução de uma obra de Hokusai foi minha primeira tentativa de cópia. É bem complicado tentar chegar em uma combinação de cores que seja plausível, mas a riqueza em detalhes me ensina que é preciso ter calma, paciência e precisão na hora de cortar um estêncil. Foram 9 matrizes em tamanho A3, 11 cores em spray e muitos minutos de trabalho minucioso. Eu fiquei bem satisfeito com o produto final, muitas pessoas compraram e acho que também curtiram bastante essa reprodução. Se não me engano, isso foi feito em 2014. De lá para cá, minha produção deu uma diminuída, mas em 2018 é algo que eu irei retomar. Acho que não estou nem perto de esgotar as possibilidades da técnica. Vejo trabalhos do ELK, da Austrália, ou do SHIT, aqui de BH mesmo, que estão ultrapassando vários limites, e chegando cada vez mais longe no desenvolvimento da técnica. Imagino que eles também tenham começado como eu, formas simples, letras, e na insistência e persistência conseguiram chegar onde estão hoje.

Vejo uma evolução tremenda em todas essas fotos que eu publiquei, e nunca imaginei onde eu poderia chegar. Continuo sem imaginar, e não vai ser agora que eu vou parar.