Lapsos de Tempo #8

Diário

Hoje acordei nesse lugar estranho. Parece uma caixa com uma porta. Tem outros como eu em outras caixas parecidas. Não vejo ninguém com a cara boa dentro destas caixas. Tem algo ligado na minha veia, parece que estão me injetando um líquido transparente. Sinto uma dor abdominal tremenda, parece que falta algo. Não tenho muitas lembranças de como cheguei aqui, ou o que aconteceu nesse tempo. Tem algo enfiado no meu pescoço que me impede ver o que fizeram comigo, mas sinto uma faixa apertando o abdômen. Acho que estou sem forças…
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Vejo o casal que cuida de mim na sala de espera desse lugar horrível. Por mais que eu queira sair correndo em direção à eles, sinto muitas dores, acho que estou meio zonzo. Sinto uma fraqueza no corpo. Eles me pegam no colo e me colocam no carro. No trajeto, olho a paisagem, ainda muito desconfiado do que pode ter acontecido comigo.
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Já fazem alguns dias que sigo a mesma rotina. Me obrigam a tomar vários remédios com hora marcada. Eles são ruins, amargos, e eu sempre recuso esse tipo de tratamento. Essas pessoas que cuidam de mim me colocam deitado de barriga para cima no sofá. Eles limpam o corte fechado com pontos que tem na minha barriga. É um corte grande, e eu sinto um nervoso ao sentir esse produto de limpeza que passam. Nem vou dizer da coceira que dá quando borrifam esse trem marrom no ferimento. Eu sigo sem forças para várias tarefas, mas agora o colchão está direto no chão, eu não preciso me esforçar para dormir no quentinho.
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Hoje tiraram meus pontos. Foi um baita dum alívio. Não preciso mais usar aquele aparato no pescoço que me impede de fazer tudo. Talvez eu esteja melhor.
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Toda semana estou frequentando esse lugar, que parece o das caixas, mas que é diferente. As pessoas se parecem, mas a disposição de tudo é diferente. Entro numa sala, sempre a mesma sala quente, e fico sentado nessa mesa de alumínio. Minha pata é raspada com máquina, colocam uma agulha enfiada na minha veia ligada à esse líquido transparente. Injetam algo nessa mangueirinha e sinto algo queimando se misturando ao meu sangue. É bem desagradável. Toda semana é isso. Ao final, recebo umas agulhadas com medicamentos debaixo da pele nas costas, costuma ser bem dolorido. Eu ainda não sei o que aconteceu comigo.
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Já tem um tempo que não preciso mais ser medicado, já não me sinto mais fraco, minha vida voltou ao normal. Consigo correr, pular, latir e brincar sem sentir dores. Eu engordei alguns quilos, e nem tenho mais a aparência raquítica. Todo dia, antes de dormir, estão me dando um negócio com gosto de peixe, dizem que eu precisarei tomar pra sempre. É gostoso, faço questão de lembrá-los disso antes de deitar.
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Ultimamente tenho tido dificuldades para urinar. Eu faço bastante força, e costuma sair sangue. Eu não sei o que fazer para que as pessoas percebam essa dificuldade. Mas acho que da última vez eu urinei um pouco de sangue. Acho que eles viram o meu esforço para que saísse isso. Talvez eles me levem ao médico, sei lá.
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Que dor de cabeça horrível, odeio acordar assim. Nem acredito que estou dentro da caixa com portas de novo. Os rostos nas caixas são outros, não reconheço ninguém. Estou ligado nesse aparelho que enfia líquido na minha veia de novo. Esse troço desengonçado no meu pescoço voltou. Ainda sinto muitas dores e não consigo me lembrar de como cheguei aqui. Estava fazendo alguns exames, enfiaram umas mangueiras em mim, de repente acordo aqui. Não aguento mais isso.
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Cheguei em casa bem desanimado. Dói bastante para urinar, parece que tem pontos novamente em mim. As pessoas que cuidam de mim limpam a saída do xixi constantemente, talvez os pontos estejam ali. Retomaram com a rotina destes remédios de sabor horrível, são muitos. Me faltam forças para reagir…
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É estranho mijar por esse orifício que abriram em mim. Eu não sei porque fizeram isso, mas imagino que deva ser pela dor que eu sentia quando tentava fazer xixi. Agora não dói, mas ainda é estranho, talvez seja difícil de acostumar.
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Fazem alguns meses que me sinto super bem, ativo como nunca. Não me levam na clínica há tempos, não sinto dores. Talvez sejam novos tempos, o sol até brilha mais forte que o normal.
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Ultimamente tenho me sentido desanimado, o sol está queimando mais que o normal, tenho buscado sombras. As pessoas que cuidam de mim jogam uma bolinha ou um ossinho de corda, mas não sei se tenho muitas energias para interagir agora. Eu olho para esses objetos e fico pensando se vale a pena o esforço. Não vale.
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Hoje aconteceu algo terrível. Fui tentar fazer cocô e senti algo que não devia escapar pelo ânus. Não era cocô, doía bastante e eu fiquei sem saber o que fazer. Corri para uma das pessoas que cuida de mim e fiz um estardalhaço. Ele me pegou no colo e fomos para a clínica. Lá, me deram uma injeção que eliminou a dor, e enfiaram de volta pra dentro o que não devia ter saído. Fizeram alguns pontos para evitar que saísse de novo. Foi horrível.
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Os últimos dias foram complicados. O que não deveria sair pelo ânus saiu mais 3 vezes. Em duas delas, foi feito o mesmo procedimento de injeção e retorno pra dentro com o conteúdo. Na última vez, me sedaram. Acordei na caixa com porta, bem zonzo, tonto, desorientado. Sentia a dor abdominal, só que desta vez era diferente. Eu não aguento mais esse lugar.
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As pessoas que cuidam de mim me buscaram, desta vez eu nem fiz festa, não tinha energias para isso, além de estar de saco cheio desse lugar. Em casa voltou a rotina dos remédios e da limpeza nos pontos. Eu já nem me importava mais com nada. Me sentia muito fraco para qualquer coisa.
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Fazer cocô é uma atividade muito custosa, me traz muitas dores, e não sai nada. Toda vez que faço força, algo que não deveria sair pelo ânus escapa. Eu não aguento mais isso.
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Me abriram de novo, não quero mais acordar nesse lugar… O que está acontecendo? Desta vez me deixaram aqui por uns 10 dias, morando nesta caixa com porta. Eu observava os rostos, muito desanimados, desolados, tristes… Não desejo isso para ninguém.
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Estou em casa, as pessoas que cuidam de mim fazem carinho na minha cabeça. Não sei porque, mas minhas patas traseiras estão dormentes, não consigo levantar. Apenas tenho movimento nas dianteiras e no pescoço. Fico encarando as pessoas para ver se elas estão percebendo isso.
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Minhas patas dianteiras param de funcionar, estão dormentes, não as sinto. Apenas meu pescoço se mexe. Uma das pessoas me carrega para o quarto e me coloca em um pano macio. Ela fica fazendo cafuné na minha cabeça a noite toda.
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É de manhã, eu apenas consigo mexer os olhos. É uma sensação horrível, parece que não há nada no corpo que não sejam os olhos. Eu solto um grito de dor involuntário, e começa a faltar ar. Um das pessoas se senta ao meu lado chorando, fazendo carinho em mim e dizendo algo que não entendo. Apenas enxergo parte de toda a situação. Eu fico cada vez mais ofegante, respirando muito fundo, escutando um choro ao lado.
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O último ar que circulou dentro de mim levou consigo toda minha essência. Já não pertenço mais à este lugar.
Obrigado por tudo,
e nos veremos em breve!

Sobre concluir as coisas que começo

Já tem um tempo que eu ando em uma bad produtiva. É uma sensação estranha, não dá vontade de produzir nada e eu acabei entrando em um looping de procrastinação de um nível absurdo. Ontem eu fiquei pensando sobre essa bad produtiva, e imaginei que ela é causada pelo medo. Não digo medo de algo concreto, nem medo de filmes de terror, mas é um medo de começar algo. Como assim?

Nessas últimas semanas eu fiquei com vários trabalhos sem conclusão. Não conseguia terminar, e a maioria eu custei para começar. Parece bobo dizer essas coisas, mas é uma questão que me atinge diretamente. Esse medo de começar ou continuar algo passa por uma ansiedade devida à falta de perspectiva (eu acho) no campo profissional. Já tem um tempo que ando buscando outras formas de ganhar dinheiro porque apenas como artista eu já entendi que não rola, pelo menos por enquanto. Andei buscando outras áreas pra me dedicar e conseguir colocar em prática meu conhecimento de vários campos, mas esse medo estranho me deixou meio paralisado, sem ganas de começar qualquer processo.

Hoje de manhã, enquanto dava aula online de desenho para um aluno/amigo, conversamos sobre processos, e sobre a importância de concluir as coisas. Eu olhei para o meu atelier, enxerguei 4 pinturas inacabadas, vários post-its de projetos/trabalhos faltando conclusão e alguns testes de impressão serigráfica na fila, apenas esperando a minha boa vontade.

Depois do almoço eu decidi que iria prosseguir com os trabalhos em andamento, mesmo sem vontade e sem disposição. Foi tiro e queda. Em uma tarde muito produtiva eu consegui dar continuidade à pintura grande (110×70 cm), e concluí 3 pinturas pequenas (20×20 cm). Além disso, concluí um projeto de estampa que vai virar camisa e pôster em breve e agora estou animado para lavar a pilha de louça suja que se acumulou na pia.

Vim aqui escrever isso porque só bastava 1 comentário pra me fazer refletir sobre esse medo bizarro e estranho de dar continuidade aos projetos. Justo eu, que prezo pelo processo muito mais que pelo resultado, me encontrei travado nesse mar de dúvidas.

E que importância teve essa ação de conclusão. Um dia muito produtivo.

Prestação de serviços em serigrafia

Durante a quarentena tive a oportunidade de trabalhar como impressor serígrafo para dois artistas. Na real, os trabalhos eram para ser entregues antes da pandemia, mas o isolamento acabou atrapalhando um pouco meu processo.

O primeiro trabalho foi para o artista André Nicolau, que me procurou para fazer impressões de suas ilustrações, e parte foi para o Projeto Arte Pela Cesta, que trocava cestas básicas por arte e ajudava pessoas e comunidades em situação de carência e vulnerabilidade. A arte em si tava bem massa, a gravação ficou muito boa, mas eu tive um pouco de dificuldade com a mistura de cores pra poder imprimir, rs. Daniel de Carvalho, Natália e o próprio artista André Nicolau me auxiliaram nessa fabricação. O processo em time lapse bem como o resultado pode ser conferido no vídeo a seguir.

Por intermédio do Ricardo Reis Erre Erre, fiz essa impressão em três cores com a ilustração de B. Perini. Essa foi um desafio um pouco maior, pois tive que fazer alterações manuais no laser film que estava causando diferenças tonais e marcas que não deveriam haver. Filmes corrigidos, telas gravadas e 150 cópias em 3 cores (450 impressões, ufa). O processo em time lapse e o resultado da impressão pode ser conferido no vídeo a seguir.

Referências para criar

Uma das coisas mais difíceis na hora de produzir é saber exatamente o que fazer. Vou tentar elencar algumas coisas que me ajudam a movimentar as ideias para tentar chegar a algum lugar. Nesse post tento dialogar, novamente, com Priscapaes que é uma artista que tem me dado alguma luz nesse túnel que é o processo de produção.

1 – Tenha um caderninho de rascunhos, sketchbook, ou o celular sempre disponível. Eu costumo ter ótimas ideias enquanto pedalo, e antes eu sempre perdia essas ideias por esperar o momento certo para anotar. Eu comecei a usar o recurso “Mensagens Salvas” do Telegram para me lembrar dessas ideias. O celular está sempre próximo enquanto pedalo, e acho que não custa nada anotar ou gravar essas ideias para não se perder. Quando preciso esboçar alguma coisa, sempre busco na nuvem do Telegram essas ideias que eu guardei.

2 – Prestenção nas músicas que você escuta e nos livros que você lê. A partir dessas duas dificílimas tarefas é de onde vem várias de minhas ideias. Sou muito influenciado pelas bandas que escuto. Punk, Hardcore, Rap, Cumbia, sempre tem alguma ideia nas letras que te faz querer produzir sobre. Com as leituras acontece o mesmo. Livros são ótimas referências de ideias. Uma boa literatura de ficção, sociedade, contos, registros, tudo isso eu trago para o que eu faço.

3 – E sua rotina, onde entra nisso? Em tudo. Muito do meu trabalho dialoga com os meus afazeres diários. Pedalar, ouvir música, ler, brincar com o cachorro, lavar vasilhas, assistir/jogar rugby. Tudo tem a ver, e por mais que você não perceba, isso aparece nos seus esboços de forma frequente.

4 – Uma das ferramentas mais interessantes para começar a produzir é o diálogo. Diálogo com outros artistas, com sua mãe, seu pai, seu cachorro, com o vizinho, com alguém que você não conhece. Diálogo com o que você lê, com o que você escuta, com o que você vive e com o que sente. Quando você fala sobre seu trabalho, ou sobre o que pretende trabalhar, e escuta sobre o que outras pessoas fazem, produzem, trabalham, pensam, sua mente vai a milhão, fervilhando ideias que dialogam com essas interações. Nunca subestime o poder do diálogo.

5 – Recentemente, em uma oficina de Zines com a Papelícula, descobri sobre a escrita de fluxo. É algo que a gente faz para começar a movimentar as ideias. Consiste em escrever o que está pensando naquele exato momento, ainda que seja para narrar as tarefas do dia, descrever algo para o qual estamos olhando, qualquer coisa. Apenas escreva o que vier na cabeça, sem planejar muito, sem se importar com ortografia. Esse texto pode chegar a lugar algum, mas vai colocar a cabeça para trabalhar um pouco e isso pode ser a faísca que faltava para começar a criar.

6 – Busque referências sempre. Claro que nem tudo vai servir de boa referência, mas é importante entender as soluções estéticas e técnicas que outras pessoas utilizaram para produzir alguma coisa. Isso já dá uma ideia do resultado que você almeja e vai te incentivar a buscar esse conhecimento de produção. O Pinterest é uma fonte interessante, onde você pode guardar no seu banco de imagens as referências que te interessam, mas tem muita porcaria lá também, inclusive muita propaganda, tome cuidado com isso. Mas guardar imagens que sirvam de referências é uma ideia interessante, e você pode, muito bem, fazer isso fora do Pinterest ou da internet. Você encontra muitas referências visuais no ambiente urbano, nos livros, na imaginação, nos encartes de discos. Entenda como discernir as boas referências.

7 – Registre o processo de produção sempre. Quando você ver que as coisas começam a fluir, escreve sobre isso, anote, deixe registrado. Isso pode te ajudar a desembolar alguma outra ideia, é sério. O que você tentou fazer para uma determinada imagem não deu certo, mas pode dar muuito certo em outra imagem, em outra ideia. É sempre bom revisitar esses registros de processos e eu, pelo menos, considero uma parte importante da produção.

Eu escrevo aqui essas coisas até para me ajudar a me lembrar de todas essas táticas para conseguir sair do lugar. Produzir não é fácil, eu acho bem difícil, mas essas coisas ajudam a sair um pouco do lugar da inércia.

Imprimindo linoleogravuras

Recentemente tenho feito alguns testes de impressão de linoleogravuras que eu já tinha gravado faz um tempo. Trata-se de uma gravura de bandana e outra de uma mãe zapatista amamentando o filho. Inicialmente as matrizes foram concebidas para serem impressões distintas, gravuras diferentes, mas entendi que elas funcionavam bem melhor quando juntas em uma pequena experimentação que fiz.

A matriz da bandana foi bem complexa de gravar e o processo foi bem longo. São muitos detalhes e eu usei a goiva micro V da Speedball para que a linha ficasse bem fina e os detalhes bem delicados.

A matriz da Madre Zapatista foi mais tranquila de gravar. É uma matriz com fundo removido, quase impossível de fazer registro se associada à outra matriz, e eu cheguei a fazer alguns testes de impressão utilizando papel amarelo Canson, tinta vermelha e uma prensa de tortillas mexicanas. O resultado me agrada, mas depois que eu fiz o teste de impressão com as duas matrizes juntas, o resultado é muito mais satisfatório.

Ao final, consegui isolar uma parte da impressão da bandana, e depois encaixar a matriz da Madre meio que no olhômetro. Fiz testes em três qualidade de papéis distintas: Hahnemühle, Arroz Japonês e Fibra Artesanal. Todas as impressões finais foram feitas com tinta de xilogravura a base de água e a impressão foi feita com baren, de forma bem artesanal. Todas as cópias disponíveis já estão à venda na loja online, com frete grátis para BH.

Litografia, e as saudades de uma época de pesquisa intensa

Recentemente postei um vídeo no YouTube sobre a litografia. É um compilado de pequenos vídeos gravados entre 2014 e 2017, nos tempos em que eu estudei litografia na Casa da Gravura, da Escola de Belas Artes da UFMG. Entre 2014 e 2015, eu trabalhei no atelier por 3 semestres, e ainda prestei serviços de impressão em 2016.

Para quem não sabe, litografia é uma técnica de impressão em pedra calcária. A pedra, muito sensível à gordura, é granitada para planificar a superfície e eliminar rastros de gordura. Logo após, faz-se um desenho com material gorduroso (tusche ou crayon são os mais comuns, mas pode-se usar lápis dermatográfico, carbono, suor, digitais, óleo de cozinha ou qualquer material gorduroso) e o mesmo é fixado na pedra com a utilização de ácido nítrico e/ou fosfórico diluída em goma arábica. A concentração da solução de ácido e o tempo de exposição determinam o quão escuro ou claro ficará os traços que você fez. Pode-se isolar alguns lugares com goma árabica pura, bem como fazer margens. Ainda no processo de gravação, antes de remover a goma acidulada, há de remover os resíduos de gordura com aguarrás e substituir por “tinta miolo”, que é um tipo de tinta gráfica. Repete-se o processo de limpeza e ácidos, remove-se a tinta miolo com solvente e a pedra já está pronta para início de impressão. Nesta parte é imprescindível que a pedra esteja sempre úmida para receber o rolo de tinta gráfica e a tinta fixar em sua quantidade correta apenas nas áreas de gordura do desenho. A impressão é feita colocando a pedra entintada e um papel sob o desenho, e passando por uma prnesa que chamamos “prensa de faca”, pois a pressão é feita por uma superfície plana que concentra a força em apenas um feixe da pedra. Pode parecer complicado e trabalhoso, e realmente é, mas essa parte é o que faz da litografia ser tão especial na minha vida.

Durante pelo menos 4 anos eu pesquisei intensamente a técnica, ajudei muitos alunos, prestei serviços para artistas experientes, até me formar e ainda não consegui montar aparatos no meu atelier para voltar a trabalhar com a técnica. Tenho saudades de trabalhar com isso, e me admira muito quem conseguiu fazer isso fora do ambiente universitário.

Desde 2017 que eu tenho um desejo real de estudar no Instituto Tamarindo, referência em litografia no mundo, mas minhas condições financeiras não permitem, pois estudar e morar nos Estados Unidos não é nada barato.

Claro que o processo que eu descrevi acima é muito simplório, e faz tanto tempo que eu não trabalho com isso que eu posso me enganar em alguma parte do processo. Sem prática isso acaba sendo normal. Enquanto meus planos não se concretizam, eu me divirto e fico saudosista com os vídeos da época de faculdade.

A trilha sonora é toda da banda H2O.

Bons tempos.

 

Vídeos sobre processos

Olar pessoal. Andei gravando e editando alguns vídeos mostrando o processo de impressão de estampas em serigrafia. São vídeos gravados, em sua maioria, em time-lapse, com edições bem cruas. A ideia é depois fazer uns vídeos mais explicativos, mas ainda preciso aprender a trabalhar com essas novas mídias.

O primeiro vídeo foi do processo de impressão em duas cores do poster “La Idea/Puro Borde”, com as cores preta e branca na camisa amarela. Minha companhia no trabalho foi da @nataliaumm e o vídeo pode ser conferido abaixo. A trilha sonora ficou por conta da banda Deez Nuts, tocando “Fight For Your Rights” da lendária Beastie Boys.

A camisa pode ser comprada através da Loja Virtual

 

O segundo vídeo é o processo de impressão na camisa preta, com tinta branca, na frente e nas costas da camisa. A tinta de cor clara em superfície escura precisa receber várias mãos de tinta para que o branco fique branco. Nesse caso, após a passada da camada de tinta, aproximamos o soprador térmico para secagem instantânea da tinta, e assim receber outra camada de branco. Nesse processo, eu e @_marcoscortez produzimos as camisas do Estúdio de Tatuagem Skins, de Conselheiro Lafaiete. A trilha sonora é do Freddy Madball, com as músicas “The New Black” e “Y que?”.

 

 

Tentarei sempre criar vídeos dos processos de produção. Se houver algo que você queira ver, me dá ideia pelos comentários.

Sobre vídeos

Ultimamente ando me arriscando na produção de vídeos. São tutoriais, processos, fragmentos de rolés, algumas aulas… Tudo será disponibilizado no canal do Youtube e no IGTV.

É uma ótima forma de registro do processo de trabalho, pois ver o produto sem saber por tudo o que passou antes de se tornar aquilo se perde um pouco da experiência.

O primeiro vídeo é um processo de corte e pintura de um stencil de 4 camadas. Foi todo filmado em Time-Lapse.

 

O segundo vídeo postado são de fragmentos de rolés, com cenas tomadas entre 2012 e 2019, em diversas cidades. São pequenos trechos de colagem de cartazes lambe-lambe e de stickers.

 

No canal do Youtube seguirei postando vídeos, tem muito material guardado aqui, que eu filmei há muitos anos e não sabia o que fazer com isso. Também estou me arriscando na edição, não conheço muito, mas estou fazendo o que posso.

Xilogravura, turma 1

Passadas 3 aulas com a primeira turma do Curso de Xilogravura, escrevo agora sobre tudo que rolou até agora.

O cronograma está sendo cumprido à risca, e acho que conseguimos ver muito material audiovisual, matrizes e gravuras impressas para ter uma pequena noção do mar de possibilidades existentes na técnica da xilo.

Na primeira aula, conversamos sobre o termo “xilogravura”, o que significa, e como se diferencia de outras técnicas de reprodução da imagem. Vimos vários vídeos sobre o processo, folheamos livros, vimos muuuuitas imagens, e iniciamos o processo de fabricação de Baren, ferramenta de impressão manual.

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Na segunda aula, seguimos no processo de construção do Baren, e iniciamos a marcação do desenho na matriz de linóleo. Foi uma aula um pouco menos cansativa, mas o pano escolhido para montar o Baren estava um pouco grosso, e não foi possível terminá-lo neste dia.

Finalmente, na terceira aula e com o pano certo, finalizamos o Baren, e já começamos a melhor parte, que é a de cavucar a superfície do linóleo para gravar a imagem. Agora sim o assunto ficou sério. Conversamos sobre segurança, sobre estilos, como amolar as ferramentas, qual a finalidade das diferentes ferramentas e como devemos manusear as matrizes durante o processo de gravação.

Em todos os dias de curso eu ofereço lanche vegano feitos pela Abarca Cattering, da minha amiga Dani, e tem dado ótimos resultados. Comida gostosa deixa as pessoas mais alegres e dispostas.

Nas próximas duas aulas já iniciaremos o processo de gravação em madeira e o de impressão. Ansioso para esse dia chegar e poder mostrar o resultado dos trabalhos.

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Sobre a técnica de estêncil

Estava dando uma olhada nos meus arquivos e me deparei com a foto do meu primeiro estêncil, feito em 2007. É uma estrela com as letras EZLN logo abaixo. Cortei esse estêncil para poder pintar uma camisa e ter, finalmente, a tão sonhada camisa do Movimento Zapatista. Depois da camisa, comecei a espalhar essa imagem por Belo Horizonte, e mal eu sabia onde que tudo isso iria chegar.

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Primeiro estêncil.

Minha curiosidade pela técnica foi muito além do que eu imaginaria. O ato de cortar uma placa de radiografia me dava tanto prazer, que eu tinha começado a cortar de tudo quanto é imagem. Alguns deles foram para as ruas, outros ficaram confinados às paredes do meu quarto (meu quarto era um caos imagético, todo mundo intervinha lá).

 

Nessa época, eu achava que já estava no auge da produção, tendo chegado ao limite e esgotado as possibilidade de exploração da técnica. Mero engano. Na internet circulavam várias fotografias de arte produzida com estêncil de um sujeito chamado Banksy. Este artista britânico, com suas obras irônicas e críticas à sociedade atual, me fez perceber que eu não estava nem próximo de um limite, quanto mais de um auge. Eram verdadeiras intervenções em diversos tamanhos, formatos e cores, com contraste, luz, sombra, detalhes. Me lembro de ficar caçando na internet cada vez mais imagens desses graffites, que me deixavam cada vez mais perplexo.

Acho que foi nessa época que eu comecei a perceber, também, os trabalhos do Cidadão Comum (Hoje, apenas Comum) pelas ruas de Belo Horizonte. Eram cartazes produzidos com estêncil, impressões em várias combinações de cores, rica em detalhes e sempre com a inscrição do autor em algum lugar da imagem.

Foi a partir daí que eu comecei a experimentar o uso de mais cores e alguns formatos maiores. Na época eu também não tinha acesso à tintas melhores, e usava sprays horríveis, desses de depósito de bairro. E isso não ajudava muito no processo. Não consegui encontrar muitas fotos de trabalhos assim, mas nessa época eu deixei de arriscar nos muros da cidade para estampar em camisas que eu vendia a preços simbólicos.

 

Nessa mesma época, comecei a arriscar a pintar as camisas com pincel a fim de complementar as estampas feitas com estêncil, colocar alguns detalhes, uma luz, algo que a deixasse mais artística. Isso deu tão certo, que culminou na melhorias das minhas habilidades com desenho, e foi quando ingressei na Escola Guignard, no curso de Artes Plásticas. Foi na faculdade que eu tive contato com esse mundo da arte, e é possível ver um salto nas questões técnica e estética das matrizes.

 

Comecei a ter mais cuidado com os detalhes, e a ter mais paciência na hora de produzir uma matriz. Testei outros suportes também, como discos de vinil e telas de pintura, e cada vez me davam ideias de tentar algo novo. Nessa mesma época comecei a produzir imagens com a finalidade comercial, fazia muitas coisas com temas de filmes, músicas, séries, temas políticos ou apenas decorativos. Com os discos de vinil, também era possível vendê-los na forma de relógios de parede.

 

Em 2012, após passar um semestre em Ciudad Juárez, México, e conviver com artistas de diversos coletivos (Rezizte, Puro Borde, Hunab Ku, CLVR…), foi quando eu finalmente compreendi a finalidade estético-política que se pode alcançar com o estêncil. O contexto em que vivíamos (Gastos desnecessários com Copa do Mundo e Olimpíadas, Despejos, Gentrificação, Manifestações…) fez com que “minha” criatividade (digo “minha” porque todo o resultado do meu trabalho a partir desta época foram frutos de ideias, discussões e eventos compartilhados e vividospor todxs que fazem/faziam parte da minha vida) borbulhasse, e eu passaria um bom tempo trabalhando em matrizes que foram o marco inicial do “La Idea” nas ruas.

Conduzido pelos cartazes do Rezizte, que retratavam a vida fronteiriça (US/MX), e pegando um gancho nos trabalhos do Comum, iniciou-se uma produção em larga escala de cartazes produzidos com estêncil. A primeira ideia foi fazer um menino jogando bola de chinelo, para mostrar que o futebol está além daquele que é vendido pela FIFA e pela mídia. Juntamente com a criança, estariam dizerem contra a Copa do Mundo. A segunda ideia foi pegar a fotografia que saiu na capa de um jornal do Rio de Janeiro, onde um indígena da Aldeia Maracanã olha para o céu, após sair a notícia que o Museu do Índio seria demolido para dar lugar a um estacionamento no Maracanã. A terceira ideia, e talvez o que seria a imagem mais conhecida do “La Idea” foi o rosto do El Marquéz, lutador de Lucha Libre, de Ciudad Juárez, e símbolo do Coletivo Puro Borde. Foi uma maneira de homenageá-los. Desta forma, a vida nas ruas começava a tomar forma. As matrizes eram feitas em diversas cores, eram bem chamativas, e possuíam tamanho A2.

 

Depois desses, vieram várias ideias de fazer cartazes sobre outros temáticas, e ainda ampliar a quantidade de lutadores. Essa insistência rendeu várias postagens nas redes sociais, e eu via uma resposta positiva quanto aos cartazes que eu produzia, afinal, eles começaram a ser requisitados para venda.

 

Faltam alguns trabalhos que eu não consegui achar fotos no caos virtual do HD, mas assim que eu der uma organizada, darei um jeito de colocar aqui.

Para terminar essa jornada no desenvolvimento da técnica, minha última empreitada no estêncil foi tentar reproduzir obras de arte, da maneira mais próxima possível. É claro que igual nunca ficará, mas eu tentei ser bem fiel ao original (imagem virtual).

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Essa reprodução de uma obra de Hokusai foi minha primeira tentativa de cópia. É bem complicado tentar chegar em uma combinação de cores que seja plausível, mas a riqueza em detalhes me ensina que é preciso ter calma, paciência e precisão na hora de cortar um estêncil. Foram 9 matrizes em tamanho A3, 11 cores em spray e muitos minutos de trabalho minucioso. Eu fiquei bem satisfeito com o produto final, muitas pessoas compraram e acho que também curtiram bastante essa reprodução. Se não me engano, isso foi feito em 2014. De lá para cá, minha produção deu uma diminuída, mas em 2018 é algo que eu irei retomar. Acho que não estou nem perto de esgotar as possibilidades da técnica. Vejo trabalhos do ELK, da Austrália, ou do SHIT, aqui de BH mesmo, que estão ultrapassando vários limites, e chegando cada vez mais longe no desenvolvimento da técnica. Imagino que eles também tenham começado como eu, formas simples, letras, e na insistência e persistência conseguiram chegar onde estão hoje.

Vejo uma evolução tremenda em todas essas fotos que eu publiquei, e nunca imaginei onde eu poderia chegar. Continuo sem imaginar, e não vai ser agora que eu vou parar.