Ruim demais para ser mentira #11

Camping

Quando eu era pequeno me lembro de ter ido num camping com minha família. Tenho memórias bem difusas deste dia, mas a incredulidade com que as pessoas recebem esta história fazem com que ela tenha algo bastante especial.
Primeiro falaremos sobre o cenário: uma área verde com muitas árvores, que agora me parecem que estavam meio secas, gramado, sol, praia. Uma criança de sunga, vulgo eu, corria para cima e para baixo brincando de algo completamente aleatório. Provavelmente com a pele já muito lastimada pelo sol enquanto me perdia nas marés de água salgada.
Dormíamos em uma barraca bem estruturada, composta de dois quartos e uma varanda, e eu me lembro até de um churrasco ter sido feito na área externa. Quando eu digo dois quartos, pode parecer que é algo bobo e apertado, mas eram dois fucking quartos bastante espaçosos, impensáveis para pessoas que já nasceram na era das barracas que são montadas apenas com uma varinha no iglu feito de lona.
Fico imaginando esse tipo de barraca old school sendo carregada por neohippies brancos de dreads em seus mochilões por regiões indígenas, exigindo brunch de algo que não existe ali. Algo completamente impensável.
A lembrança que eu tenho do lugar traz algo mais especial ainda: o bar. Aquele espaço raiz interiorano, uma janelinha onde se pede bebidas e tira-gostos, um alpendre coberto, nas paredes haviam pinturas e propagandas do que se vendia ali, tudo muito bem ventilado no espaço, mesas de madeira acompanhada de bancos que lembram muito o refeitório de uma universidade. Me lembro de ter música ao vivo e de jogar baralho com minha família enquanto eles se deliciavam com uma cerveja gelada (eu espero) naquele calor praiano de algum lugar que eu não lembro onde era.
No bar todas as pessoas do camping se encontravam, e eu me lembro que iria muito lá. Mas minha memória quer muito me enganar, pregar peças na minha realidade infantil e plantou uma situação muito inusitada. Tenho uma memória muito nítida de uma noite no bar em que foi feita uma encenação da Escolinha do Professor Raimundo. Sim, estávamos sentados na mesa, e os personagens foram se sentando junto da gente nos bancos sem encostos, e todos riam a cada piada que era proferida. Eu não entendia bem o que estava acontecendo, mas me lembro de ter sentido muita raiva nesse momento. O personagem do Seu Boneco sentou-se à minha frente, deu as costas pra mim e eu não possuía nenhum campo de visão que não fosse as costas dele de regata surrada e da nuca vestida com uma meia-calça velha rasgada. Eu não conseguia acompanhar o que estava acontecendo e tratei apenas de esperar que o evento acabasse.
Na minha concepção de tempo aquilo tudo durou uma eternidade, e esses programas besteiróis que simulam escolinhas com atores velhos falando baboseiras é algo que eu não curto nem fudendo. Inacreditável como tudo isso pode ser facilmente inventado por uma mente viajandona como a minha né? Quando eu conto ninguém acredita. Nem eu acreditei em mim mesmo.
***
Recentemente interpelei minha mãe e minha irmã sobre essas lembranças. Eu realmente achava que eu tinha sonhado com isso tudo. Minha irmã sempre me contava histórias aleatórias de como ela enxergava as situações, e eu sempre acreditei em tudo independentemente se fosse verdade ou mentira. Minha mãe me respondeu de forma simples, direta e rápida: “Sim!! Foi na Praia do Siri.” e seguiu com outra mensagem curta: “A barraca tinha 2 quartos e uma varanda.”. Eu comecei a rir muito, porque eu realmente achava que tinha sonhado com isso tudo. Sobre a Escolinha, minha mãe confirmou a veracidade do ocorrido e completou: “Teve. Vc ficou puto e começou a chorar. Foi numa área de camping” enquanto minha irmã se limitou a confirmar com um intenso “Simmmm”. De acordo com elas, existem fotografias deste dia, de uma criança, no caso eu, dormindo na imensa barraca.