**Provavelmente conterá spoiler**
Eu ainda estou tentando digerir um pouco da leitura d’O Estrangeiro, de Albert Camus. Não é em si uma obra muito difícil de ler, é bem fácil até, uma leitura bem fluida, com capítulos curtos. Mas foi uma história que me deu agonia do início ao fim. Monsieur Meursault é uma pessoa inafetável. Nem sei se esse termo existe, mas o protagonista não se sensibiliza com praticamente nada que aparece no decorrer das páginas. Parece que ele compreende os acontecimentos como uma linha que já foi escrita, que tudo precisa ser dessa forma, e que a ação dele não mudaria nada. Ele se mostra solícito com alguma situação apenas quando solicitado for, nunca por vontade própria. Ele não questiona acontecimentos, decisões, vontades, apenas aceita e convive com tudo isso, aparentemente, numa boa. Um falecimento, um emprego, um relacionamento, um caso de violência doméstica, um adoecimento, uma perseguição, um assassinato. Tudo passa com uma naturalidade que não transpassa a superfície das emoções, fica só ali, como algo que aconteceu. Nesse terreno infértil, talvez a reação impensada seja a única resposta que possa desenvolver.
É óbvio que existe um certo exagero, mas não duvido que existam pessoas assim, completamente superficiais, que apenas vivem o que deve ser vivido. Existe um curso da vida que a gente segue cegamente, sem ser afetado pelas margens? Tenho minhas dúvidas.
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Acho que vale a pena mencionar a influência desta obra no último episódio da sitcom Seinfeld. A espetacularização do julgamento e da sentença, baseada na falta de sentimentos dos réus, em um resgate histórico de atitudes apáticas, reacionárias e talvez até desrespeitosas. Nem a prisão consegue afetar esses sujeitos de forma mais profunda. É apenas uma aceitação de que isso ocorreu e, portanto, devemos aceitar. A arte imita a arte.