Esbarrando nas próprias limitações

Toda produção artística é um processo. Por vezes lento, por vezes doloroso, mas produzir e conseguir colocar um ponto final na obra é uma sensação indescritível. Ultimamente andei trabalhando em uma pintura acrílica para uma amiga, e me deparei com mais frustrações do que o normal. Minha falta de prática com pintura (fazia muitos anos que não pintava) me deu várias voadoras, e acabei esbarrando com várias questões que me incomodaram muito. Uma delas é o fato de ser daltônico, e isso me impede de conseguir perceber tonalidades e de clarear/escurecer cores. O daltonismo para mim nunca foi um problema, aceito muito bem essa deficiência e não me importo com essa questão quando produzo algo meu, que tem a ver comigo e que eu nem sei se será comercializado. Porém, foi uma questão bem pesada ao trabalhar nessa pintura, encomendada por esta amiga. Detalhes pequenos, que deveriam ser feitos trabalhando diferentes tonalidades da mesma cor, acabaram sendo deixados de lado. Foi uma alternativa na qual optei para não atrapalhar as imagens. Sombras e luzes de personagens e de cenas foram ignoradas e ficaram apenas símbolos e características onde se consegue perceber o que está acontecendo, porém sem muitos detalhes. Isso nunca me incomodou como incomodou nesta situação. Esbarrei em uma limitação genética, onde não consegui achar outras alternativas para resolução destas questões. Decidi colocar um ponto final pois não há onde mexer de forma que não atrapalhe todo o resto. Tive uma professora de pintura há 7 anos atrás que dizia que nós artistas deveríamos colocar um ponto final, antes de mexer demais e ter que resolver outras questões que antes não existiam. Eu nunca sei quando colocar esse ponto final, pois para mim sempre há algo em que eu devo mexer mais, talvez por isso eu Não possuo pinturas minhas em casa, pois me dá vontade de alterar todo o tempo. Ter colocado um ponto final nesse processo foi doloroso, minhas questões com a deficiência de enxergar cores e de não conseguir compreender com quais tonalidades estou trabalhando me incomodaram muito, pela primeira vez na vida. Mas acho que é melhor finalizar como está, e deixar o tempo cicatrizar essas questões antes de partir para a próxima.

Escrita de fluxo

Toda terça-feira de noite eu participo de um Laboratório de Fanzine online, ofertado pelo Estratégias Narrativas e ministrado pelas minhas amigas Bianca de Sá e Mariana Zande a.k.a Papelícula, e ontem foi um dia interessante onde começamos fazendo um exercício de escrita, para desembolar as ideias de maneira livre durante 10 minutos, e eu escrevi sobre o que eu fiz durante meu dia. Segue a transcrição na íntegra:

“Hoje eu passei o dia testando cores. Já tentou fazer mistura de cores com tintas não-primárias e sendo daltônico? É um sistema muito complexo. Para fazer o verde sabemos que se utiliza o amarelo com o azul. Mas temos amarelo-limão, amarelo-ouro e amarelo-ocre. Temos azul-marinho, azul-médio, azul-claro, azul-petróleo. Pode-se misturar todos que o verde que tenho em mente nunca sai. Adiciono branco opaco e branco transparente, adiciono preto, adiciono aditivo para a tinta ficar menos espessa, nada. Não chega. Vou para a tentativa de criar um azul-turquesa. É um azul que também é verde. Mas que não há definição precisa sobre o que seja. Alguns enxergam uma coisa, outros enxergam outra. Parece com o mar, mas parece com uma piscina. Eu nunca vi uma pedra de turquesa, e fico pensando se parece com turquesa. Não dá certo, chego perto, mas ainda muito diferente. Alguns dizem que falta mais verde para chegar na cor turquesa, outros dizem que falta mais azul. Enquanto isso eu enxergo tudo cinza. Um amigo me disse que os tons azulados vibram na mesma frequência que os tons cinzas. E eu paro para pensar porque se chama verde-turquesa, já que não vibra no mesmo tom dos verdes. Desisto, vou tentar fazer um marrom. Vermelho com preto, fica bonina. Adiciono amarelo, adiciono verde, não fica marrom. Eu vejo um bonina e vejo um marrom. Não sei diferenciar. Penso em um pote de açaí. É marrom? É bonina? É roxo? Toda loja que vende açaí tem as paredes pintadas de roxo.”

Meu texto terminou aí pois se acabaram os 10 minutos de escrita desembolada. Poderia escrever muito mais sobre o tema, mas por hoje é isso aí.