Estava dando uma olhada nos meus arquivos e me deparei com a foto do meu primeiro estêncil, feito em 2007. É uma estrela com as letras EZLN logo abaixo. Cortei esse estêncil para poder pintar uma camisa e ter, finalmente, a tão sonhada camisa do Movimento Zapatista. Depois da camisa, comecei a espalhar essa imagem por Belo Horizonte, e mal eu sabia onde que tudo isso iria chegar.

Minha curiosidade pela técnica foi muito além do que eu imaginaria. O ato de cortar uma placa de radiografia me dava tanto prazer, que eu tinha começado a cortar de tudo quanto é imagem. Alguns deles foram para as ruas, outros ficaram confinados às paredes do meu quarto (meu quarto era um caos imagético, todo mundo intervinha lá).
Nessa época, eu achava que já estava no auge da produção, tendo chegado ao limite e esgotado as possibilidade de exploração da técnica. Mero engano. Na internet circulavam várias fotografias de arte produzida com estêncil de um sujeito chamado Banksy. Este artista britânico, com suas obras irônicas e críticas à sociedade atual, me fez perceber que eu não estava nem próximo de um limite, quanto mais de um auge. Eram verdadeiras intervenções em diversos tamanhos, formatos e cores, com contraste, luz, sombra, detalhes. Me lembro de ficar caçando na internet cada vez mais imagens desses graffites, que me deixavam cada vez mais perplexo.
Acho que foi nessa época que eu comecei a perceber, também, os trabalhos do Cidadão Comum (Hoje, apenas Comum) pelas ruas de Belo Horizonte. Eram cartazes produzidos com estêncil, impressões em várias combinações de cores, rica em detalhes e sempre com a inscrição do autor em algum lugar da imagem.
Foi a partir daí que eu comecei a experimentar o uso de mais cores e alguns formatos maiores. Na época eu também não tinha acesso à tintas melhores, e usava sprays horríveis, desses de depósito de bairro. E isso não ajudava muito no processo. Não consegui encontrar muitas fotos de trabalhos assim, mas nessa época eu deixei de arriscar nos muros da cidade para estampar em camisas que eu vendia a preços simbólicos.
Nessa mesma época, comecei a arriscar a pintar as camisas com pincel a fim de complementar as estampas feitas com estêncil, colocar alguns detalhes, uma luz, algo que a deixasse mais artística. Isso deu tão certo, que culminou na melhorias das minhas habilidades com desenho, e foi quando ingressei na Escola Guignard, no curso de Artes Plásticas. Foi na faculdade que eu tive contato com esse mundo da arte, e é possível ver um salto nas questões técnica e estética das matrizes.
Comecei a ter mais cuidado com os detalhes, e a ter mais paciência na hora de produzir uma matriz. Testei outros suportes também, como discos de vinil e telas de pintura, e cada vez me davam ideias de tentar algo novo. Nessa mesma época comecei a produzir imagens com a finalidade comercial, fazia muitas coisas com temas de filmes, músicas, séries, temas políticos ou apenas decorativos. Com os discos de vinil, também era possível vendê-los na forma de relógios de parede.
Em 2012, após passar um semestre em Ciudad Juárez, México, e conviver com artistas de diversos coletivos (Rezizte, Puro Borde, Hunab Ku, CLVR…), foi quando eu finalmente compreendi a finalidade estético-política que se pode alcançar com o estêncil. O contexto em que vivíamos (Gastos desnecessários com Copa do Mundo e Olimpíadas, Despejos, Gentrificação, Manifestações…) fez com que “minha” criatividade (digo “minha” porque todo o resultado do meu trabalho a partir desta época foram frutos de ideias, discussões e eventos compartilhados e vividospor todxs que fazem/faziam parte da minha vida) borbulhasse, e eu passaria um bom tempo trabalhando em matrizes que foram o marco inicial do “La Idea” nas ruas.
Conduzido pelos cartazes do Rezizte, que retratavam a vida fronteiriça (US/MX), e pegando um gancho nos trabalhos do Comum, iniciou-se uma produção em larga escala de cartazes produzidos com estêncil. A primeira ideia foi fazer um menino jogando bola de chinelo, para mostrar que o futebol está além daquele que é vendido pela FIFA e pela mídia. Juntamente com a criança, estariam dizerem contra a Copa do Mundo. A segunda ideia foi pegar a fotografia que saiu na capa de um jornal do Rio de Janeiro, onde um indígena da Aldeia Maracanã olha para o céu, após sair a notícia que o Museu do Índio seria demolido para dar lugar a um estacionamento no Maracanã. A terceira ideia, e talvez o que seria a imagem mais conhecida do “La Idea” foi o rosto do El Marquéz, lutador de Lucha Libre, de Ciudad Juárez, e símbolo do Coletivo Puro Borde. Foi uma maneira de homenageá-los. Desta forma, a vida nas ruas começava a tomar forma. As matrizes eram feitas em diversas cores, eram bem chamativas, e possuíam tamanho A2.
Depois desses, vieram várias ideias de fazer cartazes sobre outros temáticas, e ainda ampliar a quantidade de lutadores. Essa insistência rendeu várias postagens nas redes sociais, e eu via uma resposta positiva quanto aos cartazes que eu produzia, afinal, eles começaram a ser requisitados para venda.
Faltam alguns trabalhos que eu não consegui achar fotos no caos virtual do HD, mas assim que eu der uma organizada, darei um jeito de colocar aqui.
Para terminar essa jornada no desenvolvimento da técnica, minha última empreitada no estêncil foi tentar reproduzir obras de arte, da maneira mais próxima possível. É claro que igual nunca ficará, mas eu tentei ser bem fiel ao original (imagem virtual).

Essa reprodução de uma obra de Hokusai foi minha primeira tentativa de cópia. É bem complicado tentar chegar em uma combinação de cores que seja plausível, mas a riqueza em detalhes me ensina que é preciso ter calma, paciência e precisão na hora de cortar um estêncil. Foram 9 matrizes em tamanho A3, 11 cores em spray e muitos minutos de trabalho minucioso. Eu fiquei bem satisfeito com o produto final, muitas pessoas compraram e acho que também curtiram bastante essa reprodução. Se não me engano, isso foi feito em 2014. De lá para cá, minha produção deu uma diminuída, mas em 2018 é algo que eu irei retomar. Acho que não estou nem perto de esgotar as possibilidades da técnica. Vejo trabalhos do ELK, da Austrália, ou do SHIT, aqui de BH mesmo, que estão ultrapassando vários limites, e chegando cada vez mais longe no desenvolvimento da técnica. Imagino que eles também tenham começado como eu, formas simples, letras, e na insistência e persistência conseguiram chegar onde estão hoje.
Vejo uma evolução tremenda em todas essas fotos que eu publiquei, e nunca imaginei onde eu poderia chegar. Continuo sem imaginar, e não vai ser agora que eu vou parar.











































