2024 – #10 – Centro

Uma sociedade aborígene de nome Mounga precisou lidar com uma certa dificuldade política. Os regimentos da comunidade eram aplicados à todas as famílias que faziam parte do território comum. Muitas famílias não concordavam com as deliberações vindas de uma força política unitária, e o descontentamento com as regras se tornou algo cotidiano.
Após diversas reuniões entre a comunidade, ficou decidido que as famílias possuiriam livre arbítrio para escreverem e praticarem seus próprios regimentos, além de firmarem suas redes de forma independente.
De início, houve certa resistência, sobretudo porque muitas famílias não conseguiam entender por onde começar a desenvolver sua própria política. Mas, aos poucos, com muito diálogo, muita disposição e muita empatia, a dinâmica de logística e de política começou a dar certo.
Ao invés de centralizar as resoluções em um local, foram criados vários pontos centrais, que se intercomunicavam entre si, com o fito de chegar a resoluções e deliberações que agradassem à todas famílias presentes no território.
Ainda que a insatisfação, a frustração e os conflitos permanecessem, eles possuíam uma intensidade muito menor que não atrapalhava a dinâmica da comunidade. Tardou muito tempo até que esse modelo fosse alcançado.

2024 – #9 – Poder

Irien nasceu com um gosto pela música. A frequência das notas, o timbre, a sonoridade, o ritmo faziam com que Irien movesse seus músculos e membros em movimentos síncronos e harmônicos. Irien hipnotizava todas as pessoas com suas danças. Podia ficar horas mexendo o corpo, pois se impressionava com seus próprios gestos, que já antecipavam tudo o que viria a seguir.
Irien sentia seu corpo guiado por algo que não conseguia enxergar, ondas abstratas que entravam pelo ouvido e refletiam nos batimentos do coração. Sentia seu sangue pulsar, levando vontade de balançar cada milímetro de seu corpo. A vida ativa não poderia existir sem a música.
Ainda que a dança fosse a razão de sua existência, Irien começou a se perguntar porque dançava tanto, já que poderia tentar criar algo que movesse outras pessoas.
Irien dançava, mas queria experimentar o poder de tocar concomitantemente.

Ruim Demais Para Ser mentira #8

Semáforo

Quando eu era pequeno, eu achava que os semáforos presentes nas esquinas das ruas eram controlados por pessoas. A minha ideia era a de que em cada semáforo havia uma câmera, e essa câmera mandava um sinal para uma televisão em uma central de comando, onde um operador decidia ligar a luz verde, a amarela ou a vermelha. Cada operador era responsável por um semáforo. E eles deveriam, sempre, ficar de olho no fluxo de carros.
A ideia era simples na minha cabeça. O sinal ficava verde e os carros aceleravam. A medida que os carros que estão no semáforo vermelho começam a se acumular em demasiado, o operador avisa que ele precisa abrir, ficar verde. Daí, o operador que estava no verde aciona o amarelo, e logo o vermelho. Desta forma, o fluxo dos cruzamentos seguiria sempre bem equilibrado.
Eu ficava encucado quando os semáforos tardavam muito a abrir, e os motoristas precisavam chamar atenção do operador (que pode ter saído para ir ao banheiro, por exemplo), por isso eles começavam a buzinar. Lembro de ficar observando o tempo que demorava entre a sinfonia horrível de buzinas e o sinal ficar verde. Geralmente funcionava e poucos segundos após o início das buzinas o semáforo abria.
Eu também imaginava que nos cruzamentos em que o sinal piscava no amarelo, provavelmente o operador não tinha ido trabalhar ou estava de férias. Então não haviam substitutos praquela função. Daí a responsabilidade do cruzamento seria a dos motoristas. A mesma lógica para as madrugadas, em que muitos semáforos piscam no amarelo ou estão desligados. Falta pessoal para operar.
Me lembro bem de estar dentro do carro com meus pais, o trânsito parado, meu pai reclamando que o engarrafamento era causado por causa dos semáforos, e eu dizendo pra ele:
-É só buzinar que o sinal abre!
Acho que ele nunca deve ter entendido minha colocação.

Impressões em parceria com Baruq na loja virtual

Já estão disponíveis na loja virtual as impressões em serigrafia que fiz em parceria com o Baruq. São registros analógicos que ele realizou em sua passagem pela europa em 2024, na ocasião do lançamento do livro “Casa Encantada”.
São cartazes tamanho A3, papel preto e áspero, impressão a duas cores (branco+cinza), ~140g.

Acessem a loja virtual clicando aqui, e vá na seção de Gravuras/Impressões artesanais.

Relatos ressuscitam

Vou descrever algo que na hora me soou indescritível
Minha memória falha a esta hora, mas juro que irei tentar
Era uma cena, um quadro, uma fotografia ou uma pintura
Nela, eu via um conjunto de ossos, um ossário
Estavam repousando em uma maca reclinada
No entorno haviam pessoas, talvez também um bestiário
Eram poucas pessoas, atentas
Muitas criaturas, dispersas
Logo à frente havia uma grande janela
Nela se viam construções naturais e sintéticas
As naturais tinham cores quentes e vibrantes
As sintéticas, frias e duras, predominavam
Atrás, só havia escuridão
Neste ato de lembrança, trago um relato do que vivi
Ou talvez sonhei
Nesta época estava diante de um combate que não foi adiante
Fôlego distante de estar disposto naquele instante
As criaturas carregam em direção ao sol que nasce
Algo que não enxergo, não reflete luz
Não é matéria
Me lembro daquela claridade oriunda do calor cromático
Seus raios nos atingindo, tentando iluminar a escuridão
Poucas pessoas não podiam nada fazer
A não ser assistir e esperar
Isto não é tudo, pois nada jamais é tudo.
***
Em outra cena as cores são quentes
Não há nada sintético, nada é rígido
A ossada agora é cinza, com uma memória do calor
São muitas pessoas, poucas criaturas
As criaturas, desta vez, apenas assistem
As pessoas movimentando o vento
Carregam a matéria, e a despejam na água
Que flui
No que vejo, uma caixa de correios flutua na corrente
Ali as criaturas pegam cartas
Cartas que nós escrevemos, cartas que nós escutamos
Aqui, te ressuscitamos
Só para dizer que não acabou, porque jamais terminaria.
São os mortos que reclamam a necessidade de serem lembrados?
Somos nós que lhes imputamos esse desejo?


25/01, dia em que me dedico a escrever sobre a morte. Tomei a liberdade de te trazer mais uma vez, pai, neste quarto ano de seu falecimento. A cada ano, dedico este dia para pensar sobre a morte, sobre o luto, sobre a ausência. Sobre os processos que me fazem lembrar de celebrar a vida.
Hoje, me inspirei no texto “Pesquisar junto aos mortos” de Vinciane Despret, que chegou até mim nos encontros do Bora Falar de Amor que tive a honra de participar ano passado. Maria Caram, a mediadora, me fez pensar no luto enquanto processo de amor. Hoje escrevo sobre isso de maneira mais leve.

P.s.: Os destaques em itálico são citações diretas do texto de referência. O desenvolvimento dele foi uma espécie de cut-out desconstruído. Outro conhecimento adquirido no Bora Falar de Amor.
P.s.2: Tô testando um formato novo de escrita, rs. Não estranhem.


2024 – #8 – Grão

A pequena comunidade de Sasya conseguiu desenvolver um método de organização urbana que compreende espaços de moradia, de vida pública e de produção agrícola de subsistência. O método consiste em criar passagens concêntricas, como se fosse uma espiral, onde às margens dos passeios teríamos locais de moradias alternando com espaços de vida pública, parques, praças, passeios e locais de interesse como bibliotecas, centros de compartilhamento e feiras. No espaço compreendido entre fundos das moradias, existem plantações diversificadas, que vão de hortas a cereais e leguminosas, que se estendem entre passagens espiraladas.
O formato de desenvolvimento concêntrico ficou conhecido por seu habitantes como Grão, pois possui uma estrutura mais externa (locais de vida pública), uma mediana (moradias) e uma central protegida (plantações). Todas conformadas por passagens que, querendo ou não, te fazem trafegar por todos estes ambientes.
Sasyans compreenderam que construindo desta forma, todos seus habitantes poderiam usufruir das plantações e da vida pública, além de conseguirem ter relações aproximadas com seus vizinhos, que nunca estariam longe demais. Não existem passagens retilíneas e esquinas, mas trechos sinuosos que seguem um formato condizente com uma espiral.
Também, desta forma, não há construções que atrapalhem a passagem dos ventos, das águas e nem atrapalha o ecossistema de uma maneira geral. A forma que a comunidade se desenvolve respeita o traçado orgânico do meio ambiente.

2024 – #7 – Esperança

No Vale do Rio Nancíbio havia um pequeno povoado que, outrora nômade, se instalou na região de várzea para evitar que a comunidade fosse contaminada por um vírus que rondava o mundo. Ficaram sabendo da epidemia através de rumores, e decidiram se isolar por décadas até que seguro fosse retomar a caminhada.
Acontece que com a instalação e criação de residências e hortas, o povoado se complicou para seguir com os hábitos ciganos, e as gerações mais novas desconheceram o hábito do deslocamento para regiões mais prósperas, ou que promovessem o rotatividade de culturas e recuperação do solo. Com o tempo, inclusive, as oralidades e manualidades que eram passadas a cada geração, foi-se perdendo com hábitos cada vez mais rotineiros.
Também a vegetação no entorno cresceu durante décadas a ponto de encerrar o povoado na várzea, próximo da mata ciliar do Rio Nancíbio, promovendo poucas oportunidades de saídas sem equipamentos e ferramentas adequadas para tal.
Certo dia Org, um jovem adulto que nasceu na região e desconhece a vida fora dela, pescava seu almoço quando se perguntou de onde vem a água com esses peixes. Nunca tinha imaginado que a água poderia se originar em outro lugar.
Org decidiu se jogar na água e nadar contra a correnteza na região de mata ciliar fechada, cheia de raízes e entroncamentos estranhos e complexos para descobrir de onde vem tanta abundância.
Org não conseguia ver o fim do curso de água, pensava o tempo todo em como e quando voltaria para contar tudo o que viu no trajeto, talvez uma possível descoberta.
Muitas histórias ele contaria em seu retorno, quando conseguisse alcançar algo que ele teria certeza de que foi a origem da água.

#literotubro #toranjanews

Caminhar, uma filosofia – Frédéric Gros

Há muito eu não escrevia minhas impressões sobre um livro. Hoje me deu vontade de fazer isso. Em meio à vida caótica, que meneia entre frustrações, pressões e desesperos, decidi começar a ler este livro no último dia de 2024. Sim, eu tinha uma pilha de outras coisas para ler, mas não consigo organizar minha cabeça para dar conta das coisas que eu realmente preciso.
Conheci esse livro através de um amigo, que leu um texto meu mais antigo e disse que se parecia muito com esta obra de Gros. Ele me mandou um pdf para ler, e eu, completamente de saco cheio de ler coisas virtualmente, acabei comprando o livro.
Ele ficou guardado por alguns meses até que, na minha atual sensação de estagnação, me bateu a vontade de lê-lo. É impressionante como os olhos nadam no fluxo das palavras, como se estivéssemos navegando junto com a corrente, ao termos na nossa frente algo que parece dialogar tanto com a gente.
Eu caminho desde que me entendo por gente, e essa prática foi parcialmente substituída pelo bicicletear na vida adulta, onde precisei de um pouco mais de velocidade e autonomia nos trajetos.
Eu não consegui parar de ler, devorei o livro rapidamente, e agora tenho ganas e vontade de caminhar por todos os cantos do globo terrestre. Essa cidade onde moro ficou limitada demais nos meus planos.

“Tudo o que me liberta do tempo e do espaço me afasta da velocidade.”
“A ilusão da velocidade consiste em acreditar que ela faz ganhar tempo.”

Nunca tinha lido, ou sequer sabia dos hábitos de caminhada de Nietzsche, Rimbaud, Thoreau, Rousseau, Gandhi e outras personalidades citadas no livro. Alguns eu curto, outros não. Mas fiquei impressionado com o fato de que a caminhada era um hábito, e cada um a fazia por suas próprias razões, pois sabiam que geravam mudanças, movimentos necessários para fazer a engrenagem da mente funcionar.
Como descrito no livro, caminhar não é uma ação esportiva, é uma ação básica de todo ser humano (saudáveis, sem dificuldades motoras, de locomoção, etc.). Eu sempre pensei assim, e eu só escrevi o texto do Lapsos de Tempo porque tinha sido questionado, pois não queria sair por causa de um cansaço extremo, mas topei voltar caminhando para casa (em torno de 30 minutos de caminhada).
Esses 30 minutos me revigoram, muito mais que me cansam. O que me cansa é ter que esperar ônibus (que envolve caminhada até a parada, uma longa espera, e outra caminhada da parada até minha casa), ficar esperando um táxi ou ter que lidar com a inconsistência de aplicativos tipo Uber. Se é uma distância plausível, eu realmente prefiro ir caminhando, pensando na vida, observando os elementos do espaço urbano. Não vejo nada disso como um problema.

“O verdadeiro sentido da caminhada não é na direção da alteridade (outros mundos, outros rostos, outras culturas, outras civilizações), mas estar à margem dos mundos civilizados, quaisquer que sejam eles. Caminhar é pôr-se de lado: à margem dos que trabalham, à margem das estradas de alta velocidade, à margem dos produtores de lucro e de miséria, dos exploradores, dos laboriosos, à margem das pessoas sérias que sempre têm algo melhor a fazer do que acolher a doçura pálida de um sol de inverno ou o frescor de uma brisa de primavera.”

Caminhar tem essa coisa de ir contra a forma do sistema mesmo, de você ter uma certa autonomia do caminho, do trajeto, da velocidade, das pausas. Sorte é de quem consegue manter esse hábito. Lendo as páginas deste livro, percorri uma boa parte da minha vida enquanto ser caminhante, que sempre preferiu gastar a sola dos tênis movimentando-se na descoberta de novos e velhos lugares.
Foi a caminhada que me fez o hábito de fotografar coisas quaisquer na ruas, de aguçar a percepção, de entender o que é novo naquele espaço, do que é velho e rotineiro, habitual. Há muito que eu não lia algo tão eu, mas tão eu, a ponto deu achar que foi escrita para mim, pensando em mim. Me sinto próximo de Frédéric Gros, sem nunca ter ouvido falar de sua existência.
Foi caminhando, observando e refletindo sobre tudo isso que envolve o viver, que eu comecei a produzir arte e arriscar escrita. Eu crio a partir do que vivo, do que penso, do que vivencio enquanto um sujeito que almeja descobrir o mundo, e tudo que gira junto com ele.
Enfim, grato por finalizar 2024 e iniciar 2025 com essa leitura. Por mais caminhadas por esses percursos e trajetos tão incertos que compõem a vida.

“Escrever deveria ser isto: o testemunho de uma experiência muda, viva. Não o comentário sobre outro livro, não a explicação de outro texto. O livro como testemunho. Mas eu diria “testemunho” no sentido do bastão numa corrida de revezamento: passa-se o “testemunho” a outra pessoa, e esta, por sua vez, começa a correr. Assim, o livro, nascido da experiência, remete à experiência. Os livros não são o que nos ensinaria a viver (esse é o triste programa dos que têm lições a dar), mas o que nos dá vontade de viver, de viver de outra maneira: encontrar em nós a possibilidade da vida, seu princípio. A vida não cabe entre dois livros (gestos monótonos, cotidianos, necessários, entre duas leituras), mas o livro dá a esperança de uma existência diferente. Logo, ele não deveria ser o que permite fugir da monotonia da vida cotidiana (o cotidiano é a vida como o que se repete, como o Mesmo), mas o que faz passar de uma vida a outra.”

“Como é vão sentar-se para escrever quando nunca se levantaram para viver.” Henry David Thoureau

Lapsos de Tempo #13

Nada é linear

Andar e caminhar sem destino.
Acionar o corpo para privilegiar o movimento nem sempre é fácil. Primeiramente, é sempre interessante encontrar uma boa razão para tal ação. Segundo, é importante pensar em alguns critérios. Terceiro, há de saber como desfrutar destes momentos.
Boas razões temos aos montes. O tédio causado pela vida contemporânea que praticamente nos obriga a interagir com uma tela todo o tempo, a falta de motivação para o lazer ou para o trabalho, um passeio externo para ajudar a arejar a cabeça e as ideias, a apatia da vida comum e monótona que nada traz de novidade, solidão.
Critérios, esses sim precisam ser tidos com mais cuidado. É importante pensar em um local com calçadas largas, quarteirões curtos, comércios, áreas verdes, vestimentas e calçados adequados. Sair sem rumo requer que, minimamente, passemos por paisagens agradáveis, sem grandes monotonias, mas também sem a agitação de um centro urbano densamente povoado. A busca pelo equilíbrio entre algo onde absolutamente nada chama atenção, e de onde existem tantos estímulos sonoros e visuais que chega a doer a cabeça. Lugares com muitos obstáculos tendem a ficar cansativos rápidos demais, com seus desvios e trombadas. É importante esse espaço equilibrado, de respiro e atenção ao infraordinário, às coisas que acontecem e que são de uma grandiosidade comum duvidável. Praças, parques, comércios, cafeterias, lugares comuns, pontos de interesse turístico, obras de arte, calçadas, arquiteturas urbanas que fluem o olhar e os trajetos, barraquinhas nas ruas, rios e canais limpos. Qualquer cena que agrade ao olhar e nos faça ter mais vontade de conhecer cada centímetro dos espaços.
O desfrute é algo que cada sujeito desenvolve por si próprio. Um sujeito enxerga a possibilidade de sair da estagnação quando pensa em se movimentar. Os olhos treinam para enxergar as pequenas coisas do trajeto, os rostos familiares, pixações, bancos, lojinhas, pessoas aleatórias, animais, prédios, praças, áreas verdes… Tudo que pode existir no caminho faz parte do movimento. Há alguns que curtem fotografar algumas coisas que lhe chamam atenção, outros se detém por um momento para desenhar ou versar sobre como se sentem. Outros apenas guardam tudo isso na memória, como algo que foi vivido e que fez parte deste momento do corpo em ação, em uma das habilidades mais básicas do ser humano: caminhar.

La Idea, 2023 – Olympus Pen-EE, Shangai GP3 100 PB

Desimportância

Não importa a passagem dos cursos de água, nem das correntes de vento.
Não importa o percurso de quem caminha ou se locomove na urbe ou na imaginação.
Tampouco importa se haverá onde descansar o corpo, as vistas ou a mente.
Tudo é atropelado e sobreposto em camadas e camadas de informação inútil, que se apodera de todos os campos e não nos fornece muitas alternativas.
Subverter não é ir contra o estabelecido, mas criar caminhos outros apresentando a não-linearidade das formas, sejam físicas ou ideológicas.
Subverter é sair da total desimportância de tudo, que mantém a inação dos sujeitos, para dar importância a tudo que construímos e para um local onde somos alguém, onde somos alguém que desejamos ser. Livres e fortes.

La Idea, 2023 – Canon BF-800, Double-X 200 PB

2024 – #6 – Água

Após décadas de uma seca devastadora que nunca havia acontecido antes, o pequeno povoado de Ariropalo compreendeu que talvez não haveria mais água no local. Foram décadas dependendo da pouca chuva que caía em um período curto de poucas semanas durante o ano e do caule de cactos e nopales, que armazenavam o líquido.
Porém, os recursos ficaram tão escassos, que o povoado decidiu se reunir para discutir e tentar encontrar soluções possíveis para o problema.
A primeira ideia, e a que pareceu mais plausível, foi a perfuração de um poço artesiano. Porém, com quase 1km de profundidade, o lençol freático não havia sido alcançado. Também, o custo para esta operação era demasiado alto, sem condições para o povoado.
A questão que bateu mais forte foi a de que talvez não haveria outra ideia de como conseguir recursos hídricos para a manutenção da vida no povoado.
Com o receio da iminente desaparição das pessoas e dos animais, o povoado se reuniu novamente e decidiram mover-se para outro lado.
Saíram de completa estagnação em busca de um vale onde pudessem existir.

#literotubro #toranjanews

2024 – #5 – Controle

Manipular as emoções. Esta foi a forma desenvolvida por Ângelo para construir as relações com os integrantes de sua comunidade.
Certo dia Ângelo acordou e descobriu que suas palavras ecoavam de uma maneira impositiva, e seus vizinhos passavam a internalizar tudo como se fossem ordens. Ângelo não acreditou em sua capacidade logo de início, e precisou de um tempo para se acostumar e aprimorar a forma como proferia cada sentença. Compreendeu, com o tempo, que conseguia facilmente manipular emoções, humores, hábitos, fazer com que toda a vida da comunidade seguisse apenas um parâmetro.
Por um tempo, viu a comunidade crescer, se desenvolver, cultivou a flora e fauna a partir de seus próprio gosto, onde as decisões tomadas sempre foram de acordo com tudo o que pensava.
Certo dia, Ângelo acordou sem sua língua.
Durante uma madrugada, vários membros da comunidade invadiram sua residência e deceparam o músculo de Ângelo. A partir deste dia ele perdeu a habilidade da fala.
Ângelo pensava estar fazendo o melhor para seus conterrâneos, mas não conseguiu compreender a insatisfação e a revolta que se nutria no submundo.

#literotubro #toranjanews

Lapsos de Tempo #12

Calma

Não sei se isso te toca tanto quanto toca a mim. Sinto uma pressão interna, ela é quente e sufocante. Me faz suar e ter vertigem, mesmo estando com os pés no chão. Já tentei respirar fundo, fechar os olhos e me deter por um período de tempo para ver se passa, mas nada adiantou. Começou quando a passagem de ar foi bloqueada, por vidro, por concreto e por metal. Toda essa matéria erguida cospe em mim a radiação, tirando minhas forças. Eu transpiro sem ar, enquanto o calor afugenta minha vontade de seguir. Sinto que este lugar não me quer, torna cinza tudo o que toca. Meus olhos ardem enquanto tentam focar em algo, mas só sinto hostilidades.
Outro dia mesmo estive em um lugar onde sentia as correntes de ar, onde meu nariz não entupia e onde o calor não me sufocava. Onde me dava vontade de caminhar e descobrir onde tudo isso vai dar. Será que ainda é possível?
Fico pensando no termo que me lembro de haver descrito para tal sensação: Calma.
Calma foi como descrevi um estágio onde, por um curto período de tempo, o caos e a entropia se detiveram. E a vontade de seguir sentindo isso foi grande.

La Idea, 2023 – Olympus Pen-EE, Shangai GP3 100 PB

Trabalho

– Olá, olá, sejam muito bem vindos! Por favor, podem entrar, sintam-se a vontade. Não se acanhem, a porta está sempre aberta para melhor recebê-los. Venham, venham ver as novidades quentíssimas no interior de nossa loja. Tem produtos eróticos para a Senhora, tem chicotes sustentáveis para o Senhor, tem filtro solar para o bebê, tem tapetinho de LSD pro pet! É isso mesmo que você ouviu, tem produtos para toda a família! Ei, você aí, você mesma, não perca a grande oportunidade de ver ao vivo o sugador anal sendo utilizado em 15 funções distintas. Apenas hoje, promoções no cinto de castidade que você encontra no corredor F2, logo à direita; também descontos imperdíveis em telefone celulares de última tecnologia, com reconhecimento de emoções básicas na palma de sua mão. Logo adiante, após os caixas, roupas de algodão importado da Antártida, feito com as menores mãos para garantir o não-encolhimento, disponíveis em várias cores e tamanhos. Vamos entrar na loja, só assim você poderá verificar com seus próprios olhos o fenômeno do Natal: o cruzamento da ovelha com a rena, pilhas inclusas. Não percam esta oportunidade única de abastecer sua despensa com vaselina, pimenta do reino, creme de alho e água mineral. Passem, passem! Você de camisa amarela que está sorrindo para mim, não subestime meu trabalho e vá logo garantir os melhores quadrinhos pornográficos do sudeste iraquiano, disponíveis em apenas 3 idiomas. Compre 2 quadrinhos e leve de brinde um chaveiro com abridor de garrafas. Apenas hoje. Eu disse “Apenas Hoje!”. Amanhã não posso garantir os preços incríveis de hoje. Desodorante vaginal, cobertores, lâmpadas, barbeadores elétricos no precinho. Não percam. Entrem, entrem, entrem, por favor, entrem!

La Idea, 2023 – Olympus Pen-EE, Shangai GP3 100 PB

Ruim demais para ser mentira #7

Corrida

Quando eu era pequeno, eu e minha irmã saímos correndo na rua buscando algo. As ruas eram de terra, chão, alguns poucos cascalhos, estávamos descalços. O sol já havia partido há muito tempo, e me lembro de um ambiente escuro, com poucos focos de iluminação.
Corremos por uns três quarteirões em perseguição. Vários pedregulhos machucavam as solas de nossos pés. No ar, uma mistura curiosa de calor com vento fresco e maresia.
Corremos nos comunicando sobre o alvo a ser perseguido. Parecia até que tínhamos uma estratégia definida. Apenas a troca de olhares já nos fazia saber para onde deveríamos ir.
As pessoas que estavam sentadas no bar da esquina sorriam de maneira irônica. Não nos importávamos com nada disso. Nossa perseguição parecia nunca ter fim. Me lembro de um trajeto curto, apesar de demorado. Tudo se confundia, e de alguma forma eu tinha certeza sobre o nosso destino. Acho que minha irmã também tinha essa certeza.
Fomos extremamente rápidos em um dos momentos mais demorados da minha memória.
Perseguimos uma luz vermelha, que até hoje parece real na minha cabeça. Eu tenho absoluta certeza do que vi e corri atrás.
Os pés sujos e machucados desagradaram aos adultos que nos aguardavam na casa de praia.
Entramos e nos deparamos com adultos lamentando: “Vocês não foram rápidos o suficiente…!”
Olhei para o chão onde estava a árvore de plástico enfeitada, recheada de caixas com embrulho.
Não conseguia acreditar que corremos atrás do Papai Noel, e ainda assim ele deixou os presentes sem que eu pudesse vê-lo.
Foi frustrante saber que a luz vermelha não quis me esperar.

***

Este pequeno texto foi gestado a partir de um exercício proposto na Mediação de Escrita “BORA FALAR DE AMOR”, onde deveríamos descrever uma memória sem dizer ou explanar o que era esta memória. Aqui, eu fiz algumas adaptações para se adequar à esta seção de histórias da minha infância. Minha irmã e minha mãe se lembram deste fato. Minha irmã correu comigo atrás de algo, e minha mãe nos enganou para que saíssemos de casa.


2024 – #4 – Extinção

Tudo começou quando a água deixou de sair da torneira. Moradores estranharam o fato de que, apesar de viverem próximo à regiões de nascente no chamado Morro do Dinheiro, a água havia acabado. O Morro do Dinheiro estava situado em uma região chuvosa, rica em recursos aquíferos, e apropriada para moradias pequenas e sistemas de agricultura familiar.
No local foi desenvolvido todo um sistema de coleta e distribuição da água, onde tudo poderia ser reaproveitado através de um complexo sistema de decantação. O sistema envolvia bambus presos com cipó, circulando entre árvores, estacas e residências. A coleta era feita através de poços estrategicamente localizados.
Desde o surgimento da comunidade no Morro do Dinheiro, toda demanda de lavagem, hidratação e irrigação foi suprida com este sistema.
Quando a torneira deixou de sair água, os moradores da comunidade se reuniram para tentar compreender o que se passava. Subiram aos poços e verificaram que todos estavam secos. A água não chegava mais ali.
Foi decidido, em um primeiro momento, que aguardariam o retorno da água. Esperaram pacientemente até que as torneiras abertas começaram a gotejar novamente.
Mas o líquido era turvo, escuro, com sabor adocicado, bolhas. Imprópria para irrigação, lavagem ou hidratação de qualquer coisa, pois foi percebido que as roupas não ficavam limpas, a pele rachava facilmente, e todas as plantações decresciam.
Os moradores se reuniram, e começaram a buscar a origem do líquido estranho.
Descobriram galpões escondidos no alto do Morro. Tudo foi muito estranho. Os galpões foram construídos com uma espécie de espelho, que fazia com que sua superfície externa se tornasse vegetações densas e complexas, impossíveis de serem percebidas de longas distâncias.
Era ali, possivelmente, que todos os recursos hídricos eram drenados e secados.
Os moradores se reuniram novamente e decidiram colocar em prática um plano para lidar com a situação. Primeiramente, e de forma silenciosa, iniciaram um movimento de transpor a comunidade para outro local próximo, e com condições adequadas de moradia e de plantio. Posteriormente, utilizaram os antigos poços para iniciar uma série de túneis, que ligavam de forma clandestina e escondida a nova comunidade com os galpões secretos. O sistema de distribuição e de decantação foi todo readaptado para coletar a água antes da chegada delas no galpão, levar os recursos para a nova comunidade, e despejar os restos da decantação de volta para a água que chegava ao galpão.
O líquido turvo se tornou uma fonte inesgotável de coliformes fecais, sujeiras, minerais e partículas diversas.
Os galpões deixaram de existir pouco tempo depois, sem nenhuma explicação aparente.


2024 – #3 – Liberdade

Desconhecer tudo aquilo que a impede de chegar a algum lugar. Foi assim que Nena deu os primeiros passos para uma mudança radical em sua vida. O desconhecimento a fez perder o receio de tentar, de experimentar, de redescobrir os possíveis caminhos e trajetos até qualquer coisa.
Desconheceu barreiras, limites, desconfianças. Reconstruiu tudo que poderia servir de útil no percurso e deixou de lado o inútil para servir apenas de auxiliar para se pensar em algo diferente.
Assim desconheceu o tempo, a neurose, as correntes que a prendiam em um lugar concreto. O mesmo lugar concreto que deixou de existir, pois caiu no ostracismo com o desconhecimento.
À esta atividade de conhecer tudo novamente, Nena nomeou Liberdade.
No desconhecimento, tudo ganhou um novo significado.
Nena se tornou livre.

Ruim demais para ser mentira #6

Doppelgänger

Quando eu era pequeno eu tinha a certeza de que em cada país existiam sempre as mesmas pessoas. Não me lembro bem se eu achava que eram exatamente os mesmos núcleos familiares, mas cada sujeito tinha sua versão em cada país. Todos eram sempre contemporâneos e eu sabia que se eu visitasse algum país, eu iria acabar encontrando a minha versão local. A única diferença era a de que existiria uma barreira intransponível da ordem do idioma.
Passei dias e noites a pensar em como seria este encontro. A lembrança que tenho é de que nos encontraríamos na rua. Eu, passeando com minha família em um lugar qualquer, veria alguém exatamente igual a mim, cruzando e me encarando com tanto estranhamento, que eu teria dúvidas sobre o que realmente estava vendo. Eu me via, eu o via ou ele me via?
Talvez nessa época eu não tenha imaginado um contato mais profundo, pois sabia das limitações do idioma. Hoje eu sei que me reconhecer em algum lugar é algo complicado, pois só conheço quem eu sou externamente através de uma imagem planificada e distorcida de mim. Já me vi em fotografia, em vídeos ou em espelhos, mas nunca me vi com meus próprios olhos.
Essa ideia de existir outros eus em cada país faz sentido para mim. Vira e mexe eu vejo ou conheço pessoas que se parecem muito entre si e que, incrivelmente, têm o mesmo nome. Conheci três Andrés em momentos diferentes, e na minha memória, eles eram muito parecidos. Da mesma forma, Annas, Jéssicas e Natálias também conheci duas de nome e aparência parecidas. Inclusive, as Natálias que conheci que eram parecidas, tinham irmãs gêmeas (porém, com outro nome). Acho que eu pensava nisso inconscientemente como um erro da Matrix, ou algo assim. No Brasil, que eu tinha noção de ser um país tão grande, não é possível que não poderiam ter mais de uma versão da mesma pessoa.
Acontece que eu nunca conheci a minha versão estrangeira. Mas vejo fotografias de pessoas e fico com muitas dúvidas se sou eu na foto ou não. Ainda hoje eu acho isso muito incrível.
***
Me lembro de perguntar pro meu pai quando eu encontraria com minha versão dos Estados Unidos. Meu pai não deve ter entendido nada. Hoje nem tenho como tirar essa dúvida, pois meu pai está presente apenas em outros planos. Mas gosto de saber que minha imaginação fértil me fazia querer pensar e perguntar sobre coisas que as pessoas não faziam a menor ideia do que se tratava. Eu criava minhas próprias teorias sobre tudo e seguia com muito afinco as teorias que eram explicadas para mim.

Foto que não é na hora, Foto!!! #2 – Jay F

No segundo experimento impresso desta série de fotografias da rede La Idea, novamente uma fotografia da Jay foi escolhida. O processo, como explicado no post anterior, foi bem simples. Juntamos uma equipe curatorial especializada, composta por eu, minha mãe, minha companheira, minha irmã e minha cunhada, e votamos nas fotografias que mais gostamos e que queríamos ver impressas.
Desta vez, a escolhida foi a televisão abandonada no trilho.
Eu gostei desta foto por vários motivos. O primeiro, e assim como na foto anterior, nota-se o vestígio da presença humana na paisagem, na cena. O rastro deixado em algum caminho, afirmando que alguém passou por ali e deixou algo. Diferentemente da foto anterior, que traz alguns elementos muito mais culturais (a meu ver), esta carrega em si o descarte de algo que não pertence mais ao nosso tempo. Um objeto que hoje possui apenas valores estéticos e saudosistas, largado para a destruição do trem que se aproxima (será que este trilho ainda é utilizado?). Não sabemos se a locomotiva virá mesmo, se o objeto será destruído, mas ele está situado neste lugar indeciso sobre seu futuro. A boa utilização das linhas de fuga proporcionadas pelo trilho traz essa sensação de passagem, de caminho, de que algo ainda irá acontecer.
Uma fotografia marcante, cujo olhar sensível da Jay carrega várias de nossas memórias e imaginações.

Especificações técnicas

Impresso com tintas Gênesis Hidrocryl Cromia em papel Canson 200g (branco e creme)
Tamanho A3 – 42×29,7 cm – formato paisagem
Preparação: 300 pixels/polegada, 20 linhas/polegada, formato elipse
Tela: Poliéster amarelo, 90/77 fios, chassi de alumínio
Rodo: Cabo de madeira, borracha amarela

A impressão serigráfica pode ser adquirida em nossa loja virtual (clique aqui)

Banditismo

Enquanto for vigente a lógica de um sistema que preza pela manutenção da exclusão, da opressão e da miséria, vocês não terão um segundo de paz.

La Idea * Festival Nuh | BH * 12 e 13 de Outubro * 2024

Foto que não é na hora, Foto!!! #1 – Jay F

Não é de hoje que eu quero testar minhas habilidades em fazer impressões de quadricromia CMYK utilizando a serigrafia artesanal que é praticada aqui no meu atelier. No passado, fiz uns testes com fotografias da Martha Cooper e uma foto de internet que eu não sei a autoria. O resultado ficava legal, o público curtiu e saíram muitas cópias.
Mas este ano consegui colocar em prática algo que era de meu desejo há muito tempo, e que eu tenho a impressão de que irá dar um gás nesse processo: A associação com pessoas que fotografam.
Sim, aqui na região tem muita gente que fotografa cenas belíssimas, tem olhares sensíveis, possuem técnicas e gosto pela atividade. Nada melhor para este projeto do que começar a imprimir em serigrafia as fotografias destas pessoas.
O processo foi simples. Primeiramente eu fiz um convite para a artista Jay, que fotografa de forma analógica, pinta aquarelas, vestuário, faz grafite, ou seja, multiartista. Ela tem um olhar bem sensível, a meu ver focando muito em coisas do cotidiano, objetos, passagens, curiosidades e suas fotos sempre me chamaram atenção. Conversei brevemente com ela sobre este projeto e ela topou no hora. Ela fez uma curadoria de algumas fotos que ela gostaria de ver impressas e me enviou através de uma nuvem. Aqui, juntei uma equipe nada especializada composta por eu, minha mãe, minha companheira, minha irmã e minha cunhada, e fizemos uma pequena votação das que nós gostamos mais. Acabou que não conseguimos decidir sobre apenas uma, e eu acabei imprimindo duas fotografias, ainda com chances de imprimir uma terceira. Porém, serão tópicos para postagens futuras.
Depois de trabalhar no Photoshop, fazer a separação de cores, regular os devidos ajustes, gravei as telas e logo comecei o processo de impressão.

Sobre a foto

Eu não posso falar pelas outras pessoas que participaram do processo decisório, mas irei soltar algumas palavras sobre o porque eu votei nesta foto.
Eu olho para a imagem e vejo uma cena de interior, comum, e que, de alguma forma, é universal. Um crânio de boi no poste, de olho em tudo que acontece. Espanta o que deve ser espantado, atrai o que deve ser atraído, inclusive nossos olhares. O crânio ocupa metade do quadro, e a outra metade o céu divide espaço com fiações do poste. Tudo está interligado. Cena pacata e cativante, bruta e serena, ofensiva e relaxada…

Especificações técnicas

Impresso com tintas Gênesis Hidrocryl Cromia em papel Canson 200g (branco e creme)
Tamanho A3 – 42×29,7 cm – formato paisagem
Preparação: 300 pixels/polegada, 15 linhas/polegada, formato diamante
Tela: Poliéster amarelo, 90/77 fios, chassi de alumínio
Rodo: Cabo de madeira, borracha amarela

A impressão serigráfica pode ser adquirida em nossa loja virtual (clique aqui)

2024 – #2 – Ilegal

Joan não entendia muito bem como foi que chegou naquele lugar. Tudo começou com uma curiosidade.
Joan morava em um pequeno povoado no interior. Este povoado sobrevivia da extração clandestina de metais preciosos do solo, que eram exportados para a metrópole. O pequeno povoado era constituído por cerca de cinquenta famílias, que trabalhavam exaustivamente na extração dos metais. Os pólos extrativistas situavam-se cerca de quinhentos metros da borda do povoado, e eram constituídos de dois grandes tambores, camuflados de montanhas, com vegetação abundante. Uma paisagem deslumbrante ao lado de uma pequena população.
Dentro destes tambores, que possuíam entrada através de uma gruta, uma série de escadarias e passarelas foram construídas para que os trabalhadores pudessem descer e acessar a região extrativista. A vista interna parecia um espaço completamente oco, um túnel horizontal vazio com um complexo de estruturas de metal para circulação de pessoas e de metais.
Mas Joan não sabia nada disso. Joan tinha uma curiosidade específica na entrada da gruta, um lugar tão precário e abandonado, mas sempre tão vigiado por câmeras.
Certa madrugada, Joan subiu o morro e começou a cavar a vegetação, pois queria acessar a gruta para entender como era sua cavidade.
Joan cavou tanto que provocou um enorme deslizamento de terra, que abalou a estrutura dos tambores. Tudo desmoronou.
Joan foi soterrade juntamente com toda matéria que escondia a extração clandestina. Joan abriu os olhos sob escombros e viu os cadáveres de antigos trabalhadores que haviam desaparecido.
Sem empregos, a população local passou a se dedicar à agricultura.