[ilustração] Beco do Chá

Meu amigo Sanchez que cria uns blends de ervas que fazem parte do cardápio do O Infusionista me convidou para ilustrar a lata que iria embalar um novo sabor de CHAI, parte de uma coleção dos 4 elementos. Eu fiquei com o elemento TERRA. Chai é uma das minhas misturas favoritas, e o Sanchez faz uma versão especial, bem tropical.
Eu não perdi tempo. O Sanchez me deu total liberdade de criação com minhas ideias e meu estilo e é lógico que eu já pensei num beco mais underground, quente, com diversidade de pessoas, várias referências estéticas, intervenções, animais e qualquer coisa que a minha cabeça sugerisse na hora.

La Idea – Ilustração Original

E assim surgiu esse beco. Passagem de pessoas e mercadorias, com cartazes e adesivos colados, pixações, graffitis, personagens icônicos que vivenciam o dia a dia daquele espaço, tributos a atrações locais, ervas e temperos pendurados, gente mascarada preparando e servindo infusões, animais exóticos vivendo… Toda uma cena que rodeia o chá.


Obrigado pela confiança Sanches, curti muito o chá e a experiência de ter feito parte desse processo.

Você pode encontrar os produtos clicando AQUI ou AQUI.

Aquecendo os dedos com doodles

Uma forma de exercitar um pouco a criatividade é criando personagens aleatórios a partir de formas aleatórias. Eu pedi pra minha companheira desenhar formas numa página virtual, e a ideia era criar rostos com essas formas. É uma atividade bem divertida, que te ajuda a fugir do bloqueio criativo.

Nenhuma atividade é sem sentido. Eu gosto de usar essa técnica pra testar cores, efeitos, pra aquecer os dedos e os punhos, pra fugir do bloqueio criativo e pra me divertir também, porque não? Imaginar é uma ótima maneira de construir algo, e as diversas artes nos possibilitam materializar o que está em nossas mentes.
Segue abaixo time-lapse da atividade.

La Idea presente na III Feira do Livro Anarquista de BH

Dias 19 e 20 de Agosto estarei com banquinha montada participando da 3ª Feira do Livro Anarquista de Belo Horizonte. O evento será realizado dia 19 no Espaço Comum Luiz Estrela e dia 20 no Centro Cultural Vila Aparecida. Confira a programação a seguir:

Para mais informações acessem:
https://feiraanarquistabh.noblogs.org/
https://www.instagram.com/feiraanarquistabh/

Organização: Kasa Invisível e COMPA (Coletivo Mineiro Popular Anarquista)



La Idea presente na Feira Vendo / Nossa Feira

Anota na agenda aí:
Dia 12/08, das 10 as 18h, estarei no Arreda Galeria e Estúdio com banquinha montada participando da Feira Vendo.

Será um dia de evento de flashes tattoos, exposições e muita gente cabulosa mostrando seus trabalhos, com muita coisa massa sendo vendida pra aproveitar a celebração do dia dos pais também pra fazer girar uma verba pra quem é artista.

Feira Vendo / Nossa Feira
Sábado, 12/08, 10 as 18h, Rua dos Aimorés, 1167 (Arreda Galeria Estúdio), BH/MG

Guaxipunx por Abya Yala de volta em Pré-venda

Roba Y Comparte, o grupo de Fölk, Kümbia, Krüst formado por Guaxicrusties está de volta em pré-venda. Agora em modelo todo preto também.
A Pré-venda será até o dia 15/08, com previsão de entrega para Setembro. A primeira pré-venda feita em março se esgotou rapidamente, e agora é provável que eu não faça tantas unidades extras como na primeira vez.
ACESSE O SITE CLICANDO AQUI PARA RESERVAR A SUA

Ruim demais pra ser mentira #1

Censura

Quando eu era pequeno, gostava de escutar o disco dos Mamonas Assassinas. Na época era a melhor coisa que podíamos escutar. Me lembro bem de me fantasiar com peças de roupas aleatórias, adereços incomuns e fingir que eu cantava as músicas enquanto corria pela pequena sala, do pequeno apê em que morávamos. Ia da cozinha para os quartos, pulava de cabeça no sofá, rolava no chão. Eu sabia todas as letras de cor e salteadas, e esse momento sempre era o ápice de minha apresentação para um público insano, enlouquecido, fanático, porém imaginário.
Mas uma coisa que eu sempre quis saber é o que significavam as letras das músicas. Eu perguntava para adultos o que significava, e ninguém me explicava. Eu cantava em voz alta com uma alegria imensa, versos que continham analogias que eu não fazia ideia, e na minha cabeça tudo soava bem literal.
Eu tenho um tio que exerceu um papel importante na minha vida de descobertas. Ele me explicava o que significavam as palavras que eu dizia, seja em xingamentos, seja cantando. Uma vez eu disse que ia “arregaçar” alguém na rua. Ele me disse que “arregaçar” significava “dobrar”, e que eu não tinha condições de dobrar ninguém, afinal eu era apenas uma criança, por isso deveria parar de falar isso. Desde então, eu apenas arregaço as mangas, mas não arregaço pessoas, pois não tenho capacidade de dobrá-las.
Certa vez estávamos reunidos em família e começamos a cantar Mamonas Assassinas na sala. Aquela meninada toda berrando os versos “Roda roda vira, solta a roda e vem, me passaram a mão na bunda e ainda não comi ninguém…”. Curiosamente, meu tio começava a falar um som de “pi” horrível, estridente, enquanto cantávamos algumas partes da música: “Roda roda vira, solta a roda e vem, me passaram a mão na PIIII, e ainda não PIIII ninguém…”. De acordo com ele, essas palavras não poderiam ser ditas por crianças. Nós, como crianças responsáveis, passamos a cantar tudo com “pi” estridente, até que os adultos nos proibiram de cantar essa música, pois seus ouvidos já não aguentavam mais esse som horrível proferido pelas crianças.
Eu, como uma criança que investigava o fato, fui atrás do porque das palavras não poderem ser ditas por crianças. A palavra “COMI” eu até entendia a proibição, pois crianças ainda não conseguiam comer outras pessoas, faltavam alguns anos para que virássemos canibais. Logo, se não podemos comer outras pessoas, não podemos falar que comíamos. Mas eu até hoje nunca entendi o porque de não poder falar bunda.
Meu tio nunca explicou.


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Serigrafia – Brinque com sua fera

Em 2023 eu fui selecionado, mais uma vez, pra participar da troca de gravuras denominada Escambo Gráfico. É uma iniciativa que o Vitor Pedroso (aka Piruá) e a Ludmila Siviero, de Araraquara, organizam anualmente. Eles fazem uma seleção “por ordem de chegada”, separam as inscrições em diversos grupos, recebem as cópias das gravuras de cada participante, criam as pastinhas de cada grupo, e reenviam para cada participante o combo de gravuras de gente do mundo todo. Mó trampo. Mas é com muita satisfação e orgulho que eu digo que gosto de participar destas trocas, conhecer novxs artistas, novas formas e técnicas de gravar e de imprimir, ver novos estilos, novas temáticas, é muita riqueza envolvida em todo esse processo. O Escambo surgiu durante a pandemia e tem produzido ótimos resultados em compartilhar ideias, técnicas e colocar pra circular conhecimentos. Só tenho a agradecer pela existência dele.

Para este ano, eu tive a ideia de criar uma serigrafia de 4 cores em um processo completamente analógico. Desde a pesquisa de referências, de temáticas, até a gravação e a impressão. A pesquisa imagética foi feita exclusivamente a partir de livros. Os esboços foram feitos a lápis em papel, todo o acabamento do desenho foi feito com caneta nanquim. Os vegetais para gravação das telas foram preparados com caneta Posca e mesa de luz. As telas foram gravadas com emulsão pré-sensibilizada (Agabê Unifilm-WR) em poliéster amarelo, 90 fios. Foram utilizadas tintas a base de água Gênesis Grafcryl e a impressão foi feita em papel Vergê Plus, 220g, cor Ônix. Essas últimas informações foram essenciais para se pensar no que é surpresa em um processo de impressão artesanal.

O esboço foi feito em um papel branco utilizando nanquim preto. Já a impressão foi feita em papel preto e o desafio maior foi pensar em como ficariam as cores na impressão, já que eu não usei nenhum tipo de recurso digital para fazer esse teste antes. Todas as sombras, luzes e detalhes foram somente imaginados em como poderiam resultar ou funcionar. Foi um verdadeiro achômetro, ainda mais partindo de alguém que é daltônico. Muita ousadia de minha parte. O resultado foi esse, um caos de linhas, ora luzes, ora sombras, ora pinturas corporais. Uma cena, talvez noturna ou aquática, de duas crianças indígenas brincando com sua fera, enquanto esta utiliza uma máscara de dragão e se emaranha com as sutilezas das crianças.

Não aprisionar, não maltratar, não ter medo. Brinque com a fera.
Esta gravura está disponível para venda clicando aqui.

O Escambo Gráfico é um projeto cuja participação é 100% gratuita. Porém, possui custos elevados de logística. Todos os participantes que podem, doam alguma quantia de qualquer valor para ajudar nos gastos, mas ainda assim há muitos artistas que não podem doar. Se você quer ajudar o projeto, compre a gravura na minha loja virtual que eu repasso parte do valor da venda para ajudar o projeto, ou faça uma doação de PIX de qualquer valor para a chave graficoescambo@gmail.com
Obrigado.

Brinque com a Fera – Serigrafia em papel Vergê Plus 220g – Tiragem: 48 cópias – La Idea 2023
Veja o processo de produção neste vídeo

Desaparecer virtualmente (ou uma paralaxe analógica)

Outro dia eu me dei conta de que eu nunca me vi. Faço uma ideia de como seja minha aparência, mas eu mesmo nunca conseguirei saber realmente como sou. Bom, através do tato consigo sentir meu rosto, a textura da minha pele, as curvas salientes, meus curtos pelos arrepiados ou a barba grossa. Consigo sentir a gordura da pele, a maciez da carne ou a dureza do osso. Consigo sentir as lágrimas saindo dos meus olhos e escorrendo pelas bochechas, enquanto minhas mãos tentam enxugá-las. E, talvez, próximo disso seja tudo que conseguirei experimentar e descrever sobre minha aparência real.
Quisera eu saber realmente como sou, pois apenas me conheço virtualmente. Necessito da lente de uma câmera, de uma superfície espelhada, dos olhos de outra pessoa que me observa por alguns instantes e marca no papel o que foi registrado em sua memória sobre a minha aparência. Para eu saber como sou, dependo sempre de outra pessoa, de outro objeto, de algo que capte a luz refletida pelo meu rosto.

Outro dia, caminhando pelas ruas de BH, me deparei com algumas vidraças espelhadas. Ainda que eu tentasse fugir do meu reflexo, meus olhos sempre enxergavam minha imagem. Meus olhos são dois globos captadores de luz, dispostos na cabeça de uma maneira que captem luz de diferentes ângulos, e meu cérebro faz o serviço de juntar essas duas imagens em apenas uma imagem coerente. Nossos dois olhos enxergam muito mais do que a gente supõe ser real. Nossos olhos nos tiram da superfície plana e nos fornece algo de profundidade, de forma, de relevo.
No reflexo das vidraças, alguma parte de mim sempre aparecia. Não consegui me esconder por inteiro, meus olhos me enganavam. Decidi registrar essa tentativa frustrada de não aparecer, de ver meu reflexo como eu me vejo.

Portava comigo uma câmera Olympus Pen-EE, com um filme PB Double-X, ISO 200, vencido. Através do visor posso ter apenas uma noção do que será registrado na película. O que eu miro não é o que a câmera capta. Eu sempre via algum reflexo de mim na vidraça, uma parte do corpo cuja luz não escapava aos meus olhos. A câmera, com sua lente única, apenas compreende o sentido de planificar a luz sob o mesmo ângulo. Ela não capta a luz como meus olhos. A fotografia me forneceu o momento de desaparecimento, de não me enxergar virtualmente, de não me enxergar mesmo com ajuda do espelho. Era pra registrar a frustração de enxergar uma imagem sempre virtual, e a câmera possibilitou que eu enxergasse o sujeito que se deteve alguns minutos para registrar o momento. Me encontrei na ausência.

Eu sou real, estou aqui, não me vejo. Todos me veem de alguma forma, sempre diferente do que eu imagino. Nesta fotografia, apenas o eu real, fotógrafo-artista-andarilho-flaneur-amador sem saber o que faz da vida, existe. Ou existiu naquele momento passado analógico.

La Idea, 2023

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NUH! Festival de Artes Gráficas

Dias 16, 17 e 18 de junho eu estarei na Funarte participando do NUH! Festival de Artes Gráficas. Serão 3 dias de atividades, mostras de vídeos, feiras, palestras, exposições, mostra de vídeos, live-painting, DJ´s, etc… Estarei com todo meu leque de gravuras, camisetas, adesivos, zines, spokecards, prints e cartazes para venda.

16 de Junho – Sexta – das 18 às 21h
17 e 18 de Junho – Sábado e Domingo – das 11 às 19
Funarte – MG: Rua Januária, 68 – Centro de BH

Fragmentos #3

Leia os capítulos anteriores na seção Fragmentos do Menu

Capítulo 3

A semana passou voando. Muitas reflexões de como conseguir ministrar uma oficina nestas condições e pensando em como minimizar os efeitos dos conflitos que poderiam ser gerados ali. Fiquei pensando que seria interessante se os jovens pudessem continuar o desenho que começaram na última oficina, dando um acabamento ao desenho que talvez pudesse conferir à atividade um sentimento de que o processo funciona e que é importante, e o acabamento é o último que fazemos. É o ponto final que damos à imagem depois de esboçar todas as partes necessárias. 
Pareceu-me uma ótima ideia, ao mesmo tempo em que uma insegurança voltou a tomar conta de mim. E se houvesse jovens que não estavam ali no dia da última oficina? E se os jovens que não se interessaram pela oficina seguissem apáticos sentados à mesa, completamente desinteressados? E se os jovens da última semana fossem escalados para a atividade externa e eu tivesse que lidar com jovens ainda desconhecidos por mim?
Tive que me sentar novamente e repensar todas essas possibilidades. Se fossem jovens novos eu ministraria a mesma atividade da semana passada. Se fossem os mesmos, eu falaria para eles darem acabamento ao desenho que iniciaram na última semana. Se fossem jovens mistos, eu mesclaria as atividades. Sim, agora estava mais seguro. Mas e aqueles jovens que fizeram desenhos que foram considerados apologias? Eles deveriam começar outros desenhos? E os que escreveram ao invés de desenhar, como proceder com estes? Por mais que eu planejasse cada passo dentro da Casa, na hora da oficina provavelmente eu teria que lidar com várias questões espontâneas. Precisaria lidar com várias angústias ao retornar pra casa também. Tudo que acontece nesse espaço-tempo chamado trabalho, reflete no meu descanso, nas minhas horas vagas. Estamos sempre trabalhando a cabeça, maquinando formas de fazer diferente, de melhorar, de desenvolver algo mais interessante.
Depois do almoço, pego minha mochila, subo na bicicleta rumo à Zona Norte. A sensação de distância durante o trajeto já começa a parecer mais curta. Aprendo novas rotas e ruas para cortar caminhos. Mas quando chega na lagoa não tem jeito. Talvez seja a parte mais longa e plana do trajeto, de onde não há escapatórias ou atalhos. Ali é um misto de brisa úmida com sol a pino. Ingresso no bairro por uma avenida larga, com ciclofaixa no canteiro central. Me mantenho na avenida por um tempo tão curto que não vale a pena o risco de atravessar a via para alcançar a ciclofaixa. Desço rápido pela direita, satisfeito com o espaço da pista ocupado por mim. Morros vêm e vão, e chega a descida íngreme antes do ribeirão. Desacelero e vou com cuidado já sabendo dos riscos iminentes. Mais uma subida e chego à Casa.
Novamente aperto a campainha, um funcionário pega meus documentos e me deixa na rua esperando por alguns minutos. Isso me irrita um pouco, não era minha primeira vez ali. Após um tempo eu entro, cumprimento todos que estão presentes na sala principal trabalhando e vou direto pra sala ao fundo. A Terapeuta vem conversar comigo. Ela diz que hoje tem menos jovens. Houveram algumas situações na Casa no decorrer da última semana, e que hoje a oficina seria para apenas cinco jovens. Houve evasão de vários deles, que saíram para suas atividades rotineiras, como trabalho e escola, e não retornaram. Os juízes responsáveis emitiram mandados para buscar esses jovens, mas ainda não sabem seus paradeiros. 
Eu separo material suficiente para cinco jovens, praticamente os mesmos utilizados na semana passada, mas adiciono materiais como caneta esferográfica, hidrográfica e marcador permanente. Agora iremos trabalhar com contraste, com acabamento também. Separo vários papéis virgens e também os desenhos inacabados da semana passada. Pode ser que tenham jovens ali que queiram finalizar seus desenhos. O Agente não me aguarda descer para fazer a contagem e conferência do material. Ele sobe até a sala onde eu estava com os materiais. Enquanto ele conta e anota, me faz várias perguntas pessoais, onde moro, de onde sou, porque venho de bicicleta? Eu respondo, não tenho nenhuma questão com isso. Ele afirmou que eu era louco de pedalar isso tudo. Ele me disse que morava mais perto que eu e fazia questão de vir de carro. Eu disse que não tinha carro, e nem fazia questão de ter. 
Desci portando o material. Um outro Agente abriu o portão que dá acesso ao pátio para mim. Os jovens estavam dispersos, e o local não estava preparado para receber a oficina. Dois jovens vieram me perguntar o que eu fazia ali. Eu não os reconheci, devem ser novatos ali na Casa. Eu disse que dava oficinas de artes visuais e solicitei que me auxiliassem na organização do espaço para receber a oficina. Pegamos a mesa grande, a colocamos em uma parte coberta, e dispusemos os bancos ao redor. Chamei o restante dos jovens para nos acompanhar à mesa na oficina, e os três se sentaram conosco. Eu também não os reconheci, tampouco eles me reconheceram. Eram cinco jovens que eu desconhecia, e que não haviam produzido nada comigo na semana passada. Tive que me apresentar de novo. 
Novamente um Agente seleciona o material que eu coloco na mesa, levando para sua sala o apontador e afirmando que os jovens precisam solicitar à ele para apontar os lápis. Eu dou as instruções de como seria a oficina, e começo a esboçar formas básicas com a finalidade de construir a imagem aos poucos, planejando os tamanhos e as posições de cada elemento. Os cinco jovens parecem mais interessados que os da semana passada, e observam atentos às explicações e aos esboços que faço no papel. Eles também arriscam, criando suas composições, encaixando cada elemento onde devem ficar. Um deles me diz que vai fazer uma rosa dentro de um rolo de dinheiro. Ele diz que já foi grafiteiro, e que usava essa técnica de esboço para pintar nos muros do beco onde ele ralava. Na hora eu fico em dúvidas se um maço de dinheiro configura algum tipo de apologia. Nunca se sabe qual interpretação a Instituição terá de determinada imagem. Eu ignoro essa dúvida e digo para ele seguir desenvolvendo seu projeto.
Os outros quatro jovens têm mais dificuldades em desenvolver seus desenhos. Fico imaginando se isso é falta de referências visuais, de prática de observação ou de má compreensão da atividade. Tento iniciar algumas conversas que podem auxiliar no desenvolvimento do desenho e faço perguntas do tipo “Imagina algum objeto que vocês gostem, como ele é?” ou “essa paisagem que você está desenhando é real ou imaginária?”. Minha intenção é tentar com que busquem diferentes referências, em diferentes espaços da memória. O jovem já iniciado no graffiti também tenta ajudar. Ele esboça alguns objetos que ele se lembra e diz para outros jovens copiarem e complementarem em seus desenhos.
Os jovens estão bem tranquilos, me dizem que a Casa está bem tranquila esses dias, e que eles ainda estão lá para cumprir os primeiros 45 dias de reclusão. Um deles diz que vai voltar a estudar para sair da vida do crime, que nada daquilo compensa. Ele fala sobre sua mãe enquanto tenta desenhar uma máquina de costura. A mãe dele sempre costurou e ele diz que ela fazia colchas com os retalhos que ele buscava atrás das confecções do Centro quando era criança. Hoje ele diz ser uma decepção na família.
O jovem iniciado no graffiti fala que não se arrepende de nada. Faria tudo de novo. Os outros três jovens apenas observam o diálogo. Não falam nada, mas escutam atentos às palavras proferidas naquela mesa. Eu não pergunto muito, prefiro não invadir o espaço deles, e eu até prefiro não saber sobre seus crimes. Eu entendo que isso não irá interferir na oficina em si, mas nós vivemos em sociedade e aprendemos a conviver julgando outras pessoas, mesmo que pelas costas. Isso iria acabar me trazendo alguns conflitos também, e eu preferia ter uma relação mais profissional ali.
A Pedagoga desceu neste momento para verificar o andamento da oficina. Ela chamou dois dos jovens para conversar em particular. Eles subiram com ela, restando apenas três jovens no pátio participando da oficina. Depois de esboçar os desenhos, iniciamos o processo de acabamento, reforçando as linhas e zonas de contraste com marcadores permanentes. Eu ensino a técnica de hachura, fazendo traços paralelos e/ou cruzados para demarcar zonas de sombra e de penumbra. Os jovens tentam reproduzir a hachura em seus desenhos. Alguns com sucesso, outros com mais dificuldades.
O tempo de oficina termina e eu peço para que assinem seus desenhos. Os três jovens se despedem de mim e retornam aos alojamentos. O Agente me ajuda a recolher o material que estava na mesa, e aproveita para fazer a conferência também. O Agente abre o portão e me autoriza subir. Recolho todos os materiais e fico pensando que nenhum dos jovens perguntou se podia ficar com seus desenhos. Talvez eles não tenham gostado da atividade. Subo as escadas e vou em direção à sala dos fundos para guardar os materiais e preencher o Livro de Relatório. A sala está ocupada pela Pedagoga com os outros dois jovens. 
Dirijo-me à sala principal e fico aguardando a liberação da sala. O Advogado me cumprimenta e pergunta como foi a oficina. Eu digo que foi boa, mais tranquila, mais fácil de trabalhar assim. Além do mais, os jovens presentes pareceram mais interessados nas atividades. Ele me disse que cada dia ali iria ser diferente, que eu poderia me preparar para isso. Em cada dia seriam diferentes jovens, diferentes dinâmicas, e que tudo que acontecia ali não poderia me afetar tanto, que deveria se restringir àquele espaço. Eu disse que isso seria complicado, pois o planejamento de uma oficina começa muito antes da minha presença na Casa. É impossível chegar para trabalhar sem um planejamento, sem um programa, sem ter nada definido. 
Essa fala do Advogado me incomodou um pouco. Fiquei pensando nessas hierarquias laborais, em como ele deveria receber um salário muito maior que o meu, e que o tempo de pensar o trabalho dele era restrito àquele espaço. Em compensação, eu recebia R$120 a cada ida à Casa, mas haviam várias horas de planejamento de oficinas não remuneradas, e que eram impossíveis de serem desconsideradas ou ignoradas enquanto eu não estivesse trabalhando na Casa.
Fiquei um tempo olhando para o Advogado, sem saber muito bem o que responder naquele momento. Fiquei sem saber se era um momento de desconforto ou constrangimento de minha parte, pois visivelmente fiquei incomodado com essa situação. 
A Pedagoga liberou a sala, saiu com os dois jovens que se despediram de mim ao me cruzar no corredor, e eu pude guardar os materiais. No relatório eu não registrei nada demais. Como não havia ninguém vigiando a oficina, eu simplesmente escrevi o nome dos jovens, e que eles participaram como desejado das atividades propostas. Essa talvez seja a parte mais chata deste trabalho. É como se fosse elogiar por mérito burocrático, sem compreender minimamente a diferença que aquela atividade possa exercer na vida daqueles jovens. Eu fiquei desejando, por um momento, que fossem representados qualquer coisa que poderia ser considerada apologia. Gostaria de enxergá-los pela ousadia representada através de imagens, criar diálogos a partir de seus desenhos. Talvez assim conseguiríamos compreendê-los.
Olhei para os papéis: Uma rosa dentro de um rolo de dinheiro, uma máquina de costura, nuvens flutuando com um sol triste, um pergaminho inacabado, um campo de futebol inacabado. Tudo para se manter dentro das regras da Instituição. 
Guardo os desenhos na pasta e vou embora. Durante o trajeto fico pensando na funcionalidade daquela Casa, para que ela serve? Jovens precisam ir ali cumprir penas alternativas. São todos menores de idade? Que diferença aquela Casa de passagem irá representar no futuro desses jovens? Porque uma oficina de artes visuais existe em um espaço onde tudo é enclausurado, limitado, excluído, reprimido? Tudo o que estudamos sobre a expressão, a comunicação e a criação de sentidos que a arte proporciona não funciona naquele lugar. A arte deveria se adaptar ao meio. E como fazer tudo isso dar certo, ser interessante? Como fazer com que essa passagem pela Casa seja proveitosa para esses jovens?
Foram tantas reflexões que eu nem percebi o tempo passar. Chego em casa sem ter sentido o caminho. Foi um daqueles dias que tudo pareceu tão automático que nem me senti cansado ao pedalar. Repouso no sofá pensando o que fazer em uma semana, em como mudar essa situação. Minha mirada está perdida em algum lugar da parede. Eu adormeço sem perceber.

MOTIM – Um fim de semana em Brasília

Sexta-feira, 05/05 foi um dia agitado. Após dois turnos tendo aula e apresentando trabalho sobre Foucault, retorno à minha casa para me preparar pra viagem. Enquanto organizo minhas coisas, o Wallison, da Editora Impressões de Minas, passa na minha casa pra deixar as caixas de livros pr’eu levar pro Motim também. São 3 volumes e eu ainda levaria minha mochilona mensageira de 48 litros e mais uma pasta A2 com minhas gravuras. Eu não andava tão empolgado por conta de uma alteração que a Buser fez na minha passagem de ida. Transformou o Leito que eu comprei, já imaginando que eu estaria cansadérrimo, em um Semi-Leito. Inclusive, mudou a empresa terceirizada que faria a rota também. Alegaram problemas mecânicos no ônibus contratado.
Chegando no local do embarque, o motorista me informa que as caixas não são bagagens, são mercadorias, e que eu deveria pagar R$15 por volume. Eu pergunto se eu deveria pagar pelo aplicativo e o motorista me pergunta se sou professor. Sim, também estranhei na hora. Eu disse que era professor de artes visuais, e ele me diz que “vai me dar uma moral na mercadoria” por eu ser professor e guardou as caixas e a pasta A2 no bagageiro do veículo.
O ônibus saiu às 20h em ponto com destino a Brasília. Talvez o meu cansaço me impediu de processar toda aquela situação. Eu apaguei durante a viagem.

Plano Piloto

Como é de costume, despertei pouco antes do nascer do sol. Adentramos Brasília já nos primeiros minutos de luz e a chegada ao Hotel Nacional para o desembarque ocorreu às 7h em ponto. A pontualidade me impressionou bastante. Como a montagem do evento seria somente a partir das 8:30, liguei pro meu amigo Dois Sete pra dar um pulinho na casa dele antes do evento. O Dois Sete e sua companheira Natália iriam me alojar durante minha estadia na Capital, e essa passadinha na casa deles antes do evento foi fundamental para usar o banheiro, me alimentar, conversar um pouco sobre a cidade e dar um tapa na aparência, pois a cara de derrota era evidente. O Dois Sete é amigo meu há uns 20 anos se pá, e nesse rolé em Brasília foi fundamental o apoio que ele me ofereceu em meio à minha correria.

É curioso como as imagens imaginárias que temos de lugares que nunca fomos são sempre diferentes, e os lugares in loco nos surpreendem muito. Não fazia a menor ideia de que haviam árvores em Brasília. Eu sei, é bobo pensar assim, mas é um imaginário que eu tinha. Também imaginava uma cidade só de prédios, sem gente. Mas o final de semana que passei pude perceber muita gente nas ruas, de verdade. Pode ser que seja por causa do fim de semana e nesse recorte espacial do evento, mas é uma impressão que tive.
Mas o Dois Sete e a Natália estavam me dizendo várias curiosidades sobre a cidade, a quantidade de parques e áreas verdes, parques abertos, locais de práticas esportivas, de lazer, como funcionam os setores do comércio. Fiquei muito curioso pra entender qual a lógica dessa cidade, como ela funciona. Eles me disseram que as Regiões Administrativas (Cidades Satélites) são bem diferentes do Plano Piloto, e que depois vale a pena ir com mais calma pra conhecer esses locais.

Chegando no evento

O Dois Sete me ajudou a colocar minhas coisas no carro e me deu carona pra Galeria dos Estados, onde ocorreu o evento. A Galeria fica embaixo do “Eixão”, como os locais chamam a via que faz uma ligação Asa Norte/Asa Sul, e é um vão livre, todo grafitado, com áreas verdes ao redor. Se servir de comparação (e eu não sei se estou certo) me lembrou um pouco a parte debaixo do Viaduto Santa Tereza em BH, pensando nas intervenções artísticas, no espaço em si, e em como a população utiliza o local.
Rapidamente encontramos as mesas, que estavam numeradas, colocamos o forro preto que foi disponibilizado pela produção do evento, e já começamos a montar tudo. Digo ambos, porque o Dois Sete me ajudou a abrir as caixas, dispôs os livros e organizou boa parte da mesa da Impressões de Minas. Também me ajudou e passar um barbante pelo cabo de aço que estava no teto para podermos criar um varal para deixar as gravuras mais a mostra.

Motim no Sábado

No sábado o público demorou um pouco para começar a chegar, pelo menos na mesa em que eu estava. Já eram mais de 14h quando as vendas começaram. E tudo que foi tranquilo nas primeiras horas, virou um caos chegando no final. Como eu estava cuidando de duas banquinhas, percebi, e acabei aceitando, que sempre uma delas ficaria negligenciada. Não dá pra atender à todos com a calma necessária para explicar tudo. (E se alguém que passou pela mesa não curtiu o atendimento, peço minhas mais sinceras desculpas aqui).
Participar de feiras, ter contato com o público, trocar ideias, trocar materiais, tudo isso exige tempo e disposição, pois essas coisas não são fáceis. São cansativas, e ali eu era dois. Demorei um pouco pra me acostumar com essa dinâmica.
Quando o público começou a aparecer de verdade não tive tempo de comer. Por sorte, a Natália me presenteou com uma marmitinha de frutas antes de sair pro evento, e isso foi essencial para segurar a fome durante a tarde. Também não havia ponto de energia pra carregar qualquer coisa, e a maquininha de cartão da Impressões de Minas estava descarregada. Por isso, precisei me concentrar pra anotar todas as vendas que eu fiz e que não são parte da minha produção. Tudo para não confundir tudo e depois se tornar um imbróglio, um pepino pra resolver.
Apesar do cansaço, da fome e da correria, deu tudo certo. Um amigo meu, o João, brasiliense que estou comigo na UFMG, deu uma passada por lá pra gente trocar ideia e ele buscar um queijo canastra meia cura que eu levei pra ele. Ele também me ajudou em alguns momentos com o atendimento à clientes quando eu estava ocupado. Foi tudo na raça.
Aproveitei o fim de feira para buscar minha camisa do Motim com o Leandro Mello, organizador da feira. Também aproveitei pra bater papo com algumas pessoas conhecidas que estavam por ali, outros feirantes.

Sábado de noite

No final da tarde, já escuro, Dois Sete apareceu na Feira e nos ajudou a desmontar as mesas. Saímos de lá, buscamos a Natália no caminho e fomos comer em food trucks estacionados num gramadão que é o canteiro central do Eixão. Comi batata rosti de brócolis, cenoura e abobrinha. Tava bem gostoso. Estávamos sentados comendo numa mesa de plástico e conversando, quando eu percebi todos estavam com agasalho, menos eu. Eu coloquei a camisa do Motim por cima da regata que eu estava usando. Nunca achei que eu sentiria frio em Brasília. No plano aberto corria uma brisa fresca que eu nunca achei que existiria em Brasília. Voltando ao carro, a primeira coisa que fiz foi colocar agasalho. Brasília sempre me pareceu um lugar quente, pelando, infernal. Mais uma surpresa.
Saímos de lá e fomos parar em um local chamado Infino´s, onde os jovens locais se encontram pra interagirem entre si. O Infinu´s é uma casa de show bem apertadinha, situada dentro de um passeio/beco cheio de comércios. Haviam muitas pessoas tomando cervejas, drinks, comendo fatias de pizza, um DJ tocava mais ao fundo, e algumas pessoas vendiam discos de vinil. Fiquei tentado a comprar algumas pérolas do punk e do crossover, mas acho que daria trabalho demais carregar discos a noite toda.
Ficamos um tempo ali trocando ideia, e depois entramos para assistir ao show de uma banda do sul que eu não lembro o nome. É um som bacana, limpo, bem trabalhado e que parecia ter muitos fãs locais. Dois Sete e eu ficamos o tempo todo assistindo à apresentação e trocando ideia sobre nossas profissões, nossas vidas, nossas dificuldades. No local eu tomo uma água e coco e uma água mineral. O cansaço já batia à porta.
Olho na parede do local e vejo uma colagens bem interessantes de autoria de alguém que tem o arroba de Tem Wifi na Lua. Esse nome não me era estranho.
A noite já estava terminando, entramos no carro e fomos pra casa. Chegando lá eu tomo um banho quentinho, e o abraço da água foi o convite pra ter uma noite se sono tranquila e pesada.

Domingueira

Domingo, pra variar, eu desperto cedo. Fico lendo alguns livros na estante da casa enquanto os anfitriões não acordam. Aproveitei para fotografar algumas ilustrações da biografia do Fela Kuti que eu busquei por anos na internet e não achava em nenhum lugar. Também contemplei o horizonte de Brasília enquanto tomava água e guardei as maquininhas de cartão e o celular que passaram a noite carregando a bateria. Brasília tinha um céu muito azul, muito vivo, sem nuvens. Muito diferente da massa carregada que paira sobre o ar parado de BH.
Os anfitriões acordam e tomamos café enquanto batemos papo. Aprendo mais ainda sobre a cidade. Conversando com os dois minha curiosidade sobre a região só aumenta. Nunca achei que eu fosse me interessar por Brasília.
Após o café, pegamos as coisas e rumamos pra Galeria dos Estados para o segundo dia da feira. Montamos as mesas com mais rapidez, já tínhamos prática. Dois Sete não ficou muito, logo retornou à sua casa para descansar mais. Na paradeira do domingo de manhã, fui tentar fortalecer algumas redes. Troquei mais ideias com o Oberas e o Kustella, que estavam logo ao lado da minha banquinha. Também troquei ideia com a Bea Lake, do coletivo Basuras que estava em frente. Ela mora em BH, mas fomos nos conhecer apenas em Brasília. Ao lado dela, a Flaviana estava com sua banquinha montada. Ela atende com o perfil Tem Wifi na Lua (sim, o mesmo que eu tinha visto no Infinu´s na noite anterior) e eu fui lá dar um Oi. Também conheci o Fernando da Amebis, o Rafel Trinco, a Dona Dorah, tirei uma foto com o Caio Gomez (que a Rebeca Prado me disse que eu TINHA que conhecê-lo) e também conheci o Diogo Rustoff, uma das grandes referência na técnica do stencil e dos cartazes lambe-lambe, sou fã mesmo.
Não deu pra circular muito no domingo, pois o Eixão estava fechado para os carros e o fluxo de pessoas era bem grande, o movimento na Feira começou cedo.

O domingo de feira foi bastante corrido. Bem que todas as pessoas nos avisaram que o movimento iria ser maior. Não consegui ter muito descanso e isso, de certa maneira, foi muito bom. Eu gosto muito quando as pessoas param pra trocar ideia sobre as gravuras, onde eu posso explicar um pouco as minhas ideias, as técnicas que eu uso e os porquês das temáticas, e gosto quando elas também compartilham comigo as impressões que elas têm sobre minha produção. Isso é algo muito enriquecedor.
No domingo eu já estava mais acostumado à dinâmica de vendas nas duas banquinhas e me fiz mais esperto pra conseguir atender todo mundo. Também aproveitei o desconto do Gomes e Bebes pra comer um sanduba veggie de almoço, tava bom pra caramba. O entregador levava lá na mesa o rango em uma geladeirinha portátil. Isso salvou.
Tentei colocar um caderninho de sketchs pra rodas entre os feirantes, mas acabou que na correria consegui sketchs de poucas pessoas, mas valeu a pena os laços feitos.
Durante o domingo também pude trocar ideia com o pessoal do Miolo Frito, do Quadradinhas.LTG, da Santa Blasfêmia, da Ju Serejo e com o cara daquelas tirinhas do Capirotinho. Vi também brevemente o Hyper e a Estranha Dupla em raros momentos de tranquilidade. Não pude interagir muito, mas foi massa demais ter conhecido a galera. Tava precisando disso, de fortalecer um pouco a rede. Teria sido mais legal se eu tivesse a oportunidade de circular mais, conhecer outras pessoas que estavam expondo e ver banquinhas que eu conheço apenas de forma virtual. Nas próximas isso irá rolar com mais facilidade.
A Galeria dos Estados e seu entorno estavam lotados. Tinha muita gente que passou a dia ali. Você olhava pra feira e pra parte externa e haviam muitas pessoas. Achei o máximo o evento contar com muito público o dia todo.

Domingo de noite e saldo da correria

A noite chegava no domingo, a iluminação já não estava tão boa e o público começava a se dispersar. Aproveitei que Dois Sete e Natália já estavam no local e começamos a arrumar as coisas. Em termos de vendas foi bem proveitoso, tanto pra mim quanto pra Impressões de Minas. Não posso falar pela editora, mas eu nunca tinha chegado nem perto de vender a quantidade de coisas que vendi em Brasília. Isso me deu muito ânimo de continuar.
Me despedi das pessoas que conheci e com quem convivi na Feira durante o fim de semana, troquei rapidamente alguns materiais e já partimos pro carro em direção a algum lugar para comer. Meu ônibus partiria às 20:30 e eu não queria atrasar.

Fomos parar em um setor onde haviam vários restaurantes veganos. Escolhemos um que se chamava Japa Vegana, e logo já devoramos um Sushirrito (mistura de sushi com burrito). A comida tava muito boa, insanamente gostosa, e foi o fechamento perfeito desse final de semana intenso que eu passei em Brasília. Dois Sete e Natália me ajudaram muito, e a foto final, prestes a comer é muito simbólica do que foi tudo isso.

Volta pra Beagá

Claro que na volta pra BH tinha que ter acontecido alguma coisa. Da mesma forma como ocorreu na ida, o motorista implicou com as caixas. Disse que era mercadoria e que não poderia embarcar (diferentemente do outro que tentou me extorquir). Ao invés de três, agora eram apenas duas caixas e minha pasta A2. O motorista só aceitou despachar a mala depois que eu concordei em assumir o BO das caixas caso o ônibus fosse parado pela fiscalização. A alegria da volta, foi a surpresa de ter comprado um Semi-leito e ter ganhado um Leito individual. Pro meu conforto e pruma boa noite de sono, eu estava mais que satisfeito. Apaguei como uma rocha. Cansado, exausto, mas feliz com tudo que tinha acontecido no Motim.
Beagá, por sua vez, me recebeu de braços abertos e me apertou forte com um engarrafamento na BR-040, de Neves até a Delta, e depois na Tereza Cristina. Foi ótimo ver o trânsito parado, acompanhando a massa de ar seco que pairava no horizonte.
Só tenho a agradecer à todos que conheci em Brasília, à quem adquiriu obras, a quem compartilhou, ao Mello pelo evento fantástico, e aos amigos que reencontrei por lá.
Me sinto bem.

Transfluência

O trabalho de pesquisa e produção de arte perpassa algumas atividades que precisam nos afetar de alguma maneira, mexer com o sensível, uma faísca que será o disparador de algo mais forte. Eu tive isso enquanto lia “Mobilidade Antirracista”, obra organizada por Daniel Santini, Paíque Santarém e Rafaela Albergaria e que foi publicada pela Autonomia Literária e pela Fundação Rosa Luxemburgo em 2021. O livro todo, em si, é um espetáculo de ativismo pela mobilidade universal e acessível, mas um capítulo me tocou de maneira mais forte: Capítulo 4.1 – Entrevista com Nego Bispo.

Sobre Nego Bispo e as formas de resistência

Logo no início da entrevista, Nego Bispo se apresenta. Eu não sabia nada sobre ele. Nasceu em uma comunidade onde a linguagem escrita não exista, somente a oralidade, e pela facilidade com que ele apropriou-se das diferentes linguagens ao ingressar na escola, foi escolhido para ser tradutor da linguagem escrita para a linguagem oral, evitando, assim, que a comunidade fosse “passada pra trás” nos contratos com o colonizador. Assim, foi forçado a compreender o pensamento colonialista para se defender dos ataques, e compreender o pensamentos dos seus iguais para fortalecer o campo de defesa. Nego Bispo diz que sua vida está na fronteira do pensamento, lidando com as escrituras e com a oralidade o tempo todo.
Nego Bispo usa muitas analogias para fazer uma relação em como os animais são ou podem ser domesticados, e a forma bruta e violenta com que os colonos tentavam domesticar seus escravos. Enquanto pessoas negras transitavam nos mares nos fundos de caravelas, sendo sujeitos à vários tipos de torturas e desumanidades, outro tipo de deslocamento não previsto pelos colonos também exercia sua força: transfluência.
Transfluência é um conceito desenvolvido por Nego Bispo para tratar sobre as relações cósmicas que carregam, simultaneamente ao transporte físico nos navios negreiros, uma memória ancestral. Povos negros que chegavam no continente se comunicavam com povos indígenas (que possuíam cosmologias parecidas) para resgatar esses saberes e dar início ao processo de resistência contra a colonização.

O que houve com Palmares e todos os Quilombos foi exatamente essa relação de transfluência.
Mesmo os quilombos que não se visitavam fisicamente transfluíam através da cosmologia.
A relação com o mar, com o vento, as estrelas, as plantas.

Nego Bispo, página 211

A questão que Nego Bispo coloca é a forma de saberes que foi desenvolvida tanto do lado de cá do Atlântico, quanto do lado de lá. Como esses conhecimentos eram compartilhados, desde muito antes das navegações acontecerem. “Como era possível a comunicação do Rio São Francisco com o Rio Nilo, se tem um oceano no meio?”

Pelos Rios do Céu, pelas nuvens, pela evaporação.
A imagem que mais me convence sobre a transfluência é esse movimento das águas doces, pois elas evaporam aqui no Brasil e vão chover na África transfluindo pelo oceano sem precisar passar por ele.
Dessa forma que a nossa memória ancestral está aqui, ela vem pelo cosmos.
Esta é, de ponto de vista cósmico e físico, a imagem que tenho da transfluência.

Nego Bispo – página 213

Pensando, refletindo e gravando

Depois de muito tempo sem produzir algo significativo derivado de alguma pesquisa mais intensa, finalmente apresento minha última produção em gravura denominada TRANSFLUÊNCIA.
Esse conceito colocado à mesa por Nego Bispo chegou a mim em um momento de baixíssima criatividade de minha parte. Estava envolvido com outros tipos de trabalho, sobretudo não artísticos, e ter lido esse capítulo reacendeu em minha mente uma chama que parecia estar quase apagada. As palavras de Nego Bispo ressoaram na minha cabeça, enquanto pensava o que poderia fazer com um termo tão potente.
Meus esboços inicias começaram bem objetivos, funcionou quase que como uma nuvem de palavras, um brainstorming do óbvio. Cabeça, mente, chuva, rios, pensamento, ser humano, ciclo. E logo comecei a expandir um pouco essa ideia de comunicação.
Nego Bispo coloca a evaporação e a precipitação como uma analogia dos saberes que são compartilhados nas duas margens do Oceano Atlântico. Minha ideia foi ir um pouco além.
E se todos os conhecimentos forem compartilhados/transmitidos/ensinados através dos mais diversos fenômenos naturais, climáticos e geológicos?
E se a gênese dos saberes está todo na concepção de mundo, e os povos precisassem de todos os elementos do planeta para compreenderem a si e ao outro?

E se as formas de organização, luta e resistência fossem auxiliadas e indicadas por todos esses fenômenos?
Essas indagações que faço a partir da leitura de transfluência talvez sejam o comum, se pensarmos a partir de cosmovisões tradicionais, mas pra mim foi um ponto de partida para pensar uma concepção de mundo bem diferente. Começar a expandir um pensamento, uma ideia, a partir deste conceito colocado por Nego Bispo me possibilitou retornar a criar, pensar em uma imagem que pudesse traduzir um pouco minhas pesquisas e reflexões.
O esboço foi feito de maneira digital; a matriz foi gravada manualmente numa placa de microduro (~linóleo); as impressões foram feitas manualmente com tinta preta em papel de arroz (industrial e artesanal); o tamanho gira em torno de um A2.
Essa gravura será lançada na Feira MOTIM, dias 6 e 7/05, em Brasília. Depois desta data poderá ser adquirida pela loja virtual.


Processo completo, do esboço à impressão final

Pintando aquarelas a partir de fotografias com muita luz e sombra bem marcada

Pintar com tintas aquarelas é algo que eu ainda tenho dificuldades. Exige-se compreender os efeitos e transparências, trabalhar com quantidades distintas de água, ora com precisão, ora sem, mas exige-se, principalmente, muita paciência. Eu admito que demorou bastante até que eu conseguisse essa façanha de aguardar que a tinta se seque pra fazer mais camadas de cor. Demorou para que eu entendesse que tinta sobre papel seco e tinta sobre papel molhado também criam resultados distintos. Antes deu saber disso, eu pintava com a tinta muito concentrada direto no papel seco, como se fosse uma acrílica. E é óbvio que eu sempre acabava perdendo o ponto de diluição ou de passagem tonal. No final das contas, ficava tudo muito marcado pelo exagero e por grandes contrastes de cor. Não que isso seja ruim, mas acho que não era o resultado que eu buscava.

Foi vendo amigos aquarelistas pintando que eu fui compreendendo várias coisas que poderia fazer diferente, novas técnicas que eu poderia utilizar, e percebendo que a paciência realmente é necessária para alcançar alguns resultados. Artistas como Daniel de Carvalho e Prisca Paes me ensinaram bastante coisa em uma conversa que tiveram em uma Live no Instagram durante a pandemia. Curiosamente, ambos são formados em serigrafia (que é uma das minhas especialidades) mas se dedicam à pintura em aquarela, e ambos já trabalharam comigo aqui na serigrafia. Foi essa conversa e alguns vídeos que eu vi do processo de produção deles é que me fizeram mudar muito meu estilo de pintura, a buscar mais essa paciência de esperar cada processo se completar, de aguardar a secagem, de saber quando e como utilizar água. E é impressionante como que eu acho que deu certo.

Observando “Fotografias de Rua”

Uma das minhas paixões recentes é essa categoria de fotos conhecidas como “Fotografias de Rua” (Street Photography). Esse tipo de fotos eu já curtia, porém não sabia que havia essa categoria específica. São fotos que registram momentos nas ruas, sobretudo de pessoas interagindo com o ambiente urbano de alguma forma. Dentre as que mais me chamam atenção posso destacar aqui, sem sobra de dúvidas, fotos em que se sente o calor vindo do sol, cuja superfície vertical ao fundo fica evidente e a sombra dos objetos sempre muito marcada. Esse estilo tem me chamado atenção, o que me despertou interesse, inclusive, em sair para fotografar esses momentos dessa maneira. Ainda não consegui fazer isso, mas já tracei como metas em dias ensolarados.

Utilizando essa ideia, essa foi a primeira pintura que fiz. A sombra da luminária projetada distorcida na parede, a sombra do sujeito marcada no piso, um ambiente caloroso com um sol forte vindo de frente, amanhecer ou entardecer? Não sabemos. O sujeito caminha em direção ao sol, cabisbaixo.
A parede foi feita com tinta em papel molhado e o chão foi feito com manchas transparentes sobrepostas. Os elementos mais definidos foram feitos com camadas sobrepostas para dar forma, luz e sombra.

A segunda pintura que fiz utilizando essa mesma ideia, representa uma mulher caminhando em frente a um portão de grades. O portão foi isolado com máscara, e toda a parede surge como um elemento mais fresco ao olhar, se contrapondo à mulher que se protege do sol forte com uma sombrinha, óculos escuros, roupas leves. A sombra bem marcada no chão indica um sol a pino, próximo de meio dia na região entre Trópicos.

Nesta outra pintura, o sol vem de lado, forte e intenso, em um fim de tarde ou início da manhã de uma cidade qualquer. O semáforo, aberto para pedestres, também sofre interferência da luz solar. A sombra esticada indica o sol próximo à linha do horizonte, provavelmente entre o Ártico e o Trópico, o asfalto traz uma sensação mais fresca à imagem. O ciclista, sujeito da foto, pedala tangencialmente aos raios de luz, provavelmente fazendo um percurso norte-sul (ou vice versa). É uma imagem que traz consigo algo de paz e tranquilidade, um momento suave e pleno, sem o caos do horário de pico dos grandes centros urbanos. O efeito no asfalto foi produzido com tinta bem molhada e sal grosso, para fornecer uma textura mais rugosa. A sombra, que infelizmente eu escureci mais do que deveria, foi feita apenas com aquarela líquida diluída (ou mal diluída, rs).

Esta última pintura que analisarei talvez tenha sido a que menos curti o resultado. Nesta, a ideia do tempo passando enquanto o sujeito espera algo fica bem evidente. O sujeito está tranquilo apesar do sol direto de meio de tarde. Um período de relaxamento e contemplação do ato de esperar algo (um ônibus, uma companhia?). Uma das questões aqui foi tentar trabalhar a sombra bem marcada em níveis diferentes de paredes. O que me incomodou foi o alto contraste do toldo e da vidraça da porta que está a direita. Sem querer eu errei a mão na diluição e acabou ficando muito marcado, fugindo um pouco da estética que eu usei no restante da pintura. O céu foi feito também com tinta muito molhada e sal grosso, e o rejunte dos tijolos foi feito com máscara vencida.

Enfim, fazer esse tipo de estudo tem me agradado muito, inclusive muitas das minhas pesquisas visuais no Pinterest e no Reddit acabam indo um pouco por esse estilo de fotografias. Buscar o sol, a sombra, sujeitos e o ambiente urbano me permitem sonhar um pouco mais com o artista aquarelista fotógrafo que crio em mim.
Até já.

O Silêncio é Inútil

Fever 333 é uma banda bem daora, que consegue manter as letras altamente politizadas ainda que estejam no mainstream da indústria musical. Lembra algo de Rage Against The Machine, político e popular, requisitados para serem absorvidos pelo capitalismo e se tornarem mais um produto. São sons violentos, de ataque pesado ao sistema. Estão no sistema, mas não se curvam à ele.
Jason Butler, vocalista do Fever 333, é um sujeito bem relacionado, tira fotos e interage com vários ícones da música pop e do cinema estadunidense. Ainda assim, suas letras, desde a época em que cantava no Letlive., são carregadas de conteúdos políticos, de ataque ao capital, à opressão, à autoridade, e fortalecendo a atuação dos movimentos de lutas identitárias, sobretudo ligadas ao levante da população negra.
O grupo iniciou sua carreira tocando em um estacionamento, com pouquíssimos recursos, instrumentos e caixas de som no baú de um caminhão, e uma demonstração de energia intensa em cada movimento que os 3 membros da banda faziam. Uma presença de palco (se é que o chão do estacionamento possa ser chamado de palco) impressionante, inclusive do baterista. De fato, conhecer a banda foi praticamente interesse à primeira escutada. Som cru e direto do jeito que gosto.
O segundo disco da banda, Strenght In Numb333rs (2019), chegou com um desenvolvimento musical impressionante, mais pesado e mais bem trabalhado, e ainda com letras bem profundas e críticas. Duas músicas me chamaram mais atenção: Inglewood (que trata da questão da gentrificação na cidade de Inglewood, CA, que também é um dos temas trabalhados na série Insecure, da HBO) e The Innocent (que eu irei desenvolver um pouco mais sobre essa música nos próximos parágrafos.)

The Innocent

Essa música, particularmente, me tocou muito. Ela fala sobre violência policial, sobre essa política de identificação visual do corpo negro como merecedor de diversos tipos de violências, inclusive a morte. Essa letra não existe por acaso, os diversos vídeos existentes na internet mostram as atrocidades cometidas por agentes de segurança que enforcam, torturam, atiram e matam corpos negros diariamente. Essa prática racista, genocida e eugenista não é exclusiva dos Estados Unidos. No Brasil, por exemplo, ocorrem situações bem similares e com o aval do Estado. A Ponte Jornalismo é uma mídia que divulga a maior parte dos casos, e muitos deles nem aparecem na grande mídia. Se não fossem essas pessoas corajosas para ir atrás dos fatos e divulgar, seguiríamos alienados em relação à violência sofrida pelo povo negro, pobre e/ou periférico.
A letra desta música me tocou muito nesse sentido. “Sem mais desculpas, nós temos que recusar isto, o silêncio é inútil, vida longa aos inocentes. Eles nos contam histórias, das mais belas glórias, este é o seu aviso, vida longa aos inocentes.”. Ela me traz um pouco da questão da história oral/oralidade, do conhecimento que é transmitido por gerações, de histórias das pessoas que lutaram antes de nós, das pessoas que perderam suas vidas para que as verdades sejam mostradas. Das vidas que as pessoas vivem, e daquelas que possuem o direito institucional de violentar e matar pela cor da pele e classe social.

Produção de gravura baseada nesta letra

Na minha produção enquanto artista visual busco, na maioria das vezes, aliar minhas vivências, leituras, músicas e interesses políticos nas imagens que crio. Gosto de ter esses itens como ponto inicial de pensar o processo criativo. Por causa dessa letra do parágrafo anterior (e agora completando 5 anos do assassinato de Marielle e Anderson), me deu vontade de falar um pouco sobre essa arte que fiz em 2020 eu acho, ainda numa pandemia restritiva. Eu não consegui, ainda, materializar em gravura essa imagem. Na época eu já andava criando umas xilogravuras aliando imagens centrais e escritos com muitos contrastes para xilogravura, e acabei criando essa a partir da letra de The Innocent. Ao centro e com mais destaque, Jason Butler gritando no microfone. Abaixo, faixas e cartazes com dizerem de protesto contra o genocídio da população negra, contra a violência policial, símbolo antifa, punhos negros em riste, Dandara, Zumbi e Marielle Franco. Acima, a frase “O SILÊNCIO É INÚTIL“, parte do refrão da música. Foi a forma que consegui de aliar essa música à uma história regional, desde a resistência na época da colonização até os dias atuais. O sistema violenta e tenta calar à todo custo as vozes oprimidas. Mas os movimentos de resistência seguem lutando, se defendendo, contando suas histórias e memórias para que não cesse a luta. Agora, mais que nunca, tenho vontade de colocar essa arte para circular. Vida longa à resistência e aos inocentes.

You gon get this now

You think, I know
Wide eyes got a narrow scope
You’d think that they’d know
Not to shoot a man while he’s on the floor
That’s why these youngins they run before talkin to police because they know the deal
See young Trayvon Martin has just left the market with candy and got his ass killed

No more excuses we must refuse this Silence is useless
LONG LIVE THE INNOCENT
They tell us stories of star spangled glory this is your warning
LONG LIVE THE INNOCENT

Eyes of the law do not look anything like my own
I can see clearly now that the arraignment is gone
Yes I did go head up with that cop tryina do me like radio Rahim
I looked at the judge said ‘I feared for my life and I pray that you’ll do the right thing’

No more excuses we must refuse this Silence is useless
LONG LIVE THE INNOCENT
They tell us stories of star spangled glory this is your warning
LONG LIVE THE INNOCENT

It ain’t what you are it’s what you can be
And I see you, my brotha
All they know is what you show them

No more excuses we must refuse this Silence is useless
LONG LIVE THE INNOCENT
They tell us stories of star spangled glory this is your warning
LONG LIVE THE INNOCENT

The Innocent

Camisas dos Guaxininhos – Pré-venda até 18/03/23

COMPRE CLICANDO AQUI

**PRÉ-VENDA ATÉ 18/03**

Previsão de envio: 15/04/23

Guaxinins expropriadores, invadem espaços abandonados para se apresentarem. Assim funciona o grupo ROBA y COMPARTE, cujxs integrantes fazem uma mescla de instrumentos acústicos e mal regulados para tocar as canções mais ousadas do Folk, da Kumbia, e do Krust, compartilhando ideias e experiências. Em 2023 saem em turnê pelo continente Abya Yala, abrindo os corações e as mentes, liberando os quatro muros de qualquer que seja seu proprietário.
“Kontra toda autoridade, a favor da Koletividade!”

Camisetas tipo Raglan, produzida 100% com algodão ecológico Menegotti, de alta qualidade.
Estampa produzida em serigrafia artesanal, no estúdio La Idea (BH-MG)
Camisa branca com mangas pretas.
Disponíveis em vários tamanhos (Do PP ao XG).

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Processando…
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Roba y Comparte – Abya Yala gira 2023

Roubar e compartilhar pelo continente é o tema da banda imaginária Roba Y Comparte, composta por Guaxinins vestidos a caráter, enquanto tocam belas canções de protesto ao som de Kumbia, Crüst e FolkPunk. A ideia surgiu a partir de um diálogo com minha amiga Laís, onde ela falava sobre o simbolismo anarquista dos guaxinins, que roubam, furtam e enfrentam autoridades, sempre de forma coletiva. Ela me enviou vídeos para demonstrar isso. A analogia com anarkopunx foi imediata. A ilustração foi produzida no início de 2023, bem como alguns cartazes e em breve será feita estampa de camisas também.
Sobre as bandas colocadas nas estampas, patches e adesivos nas vestimentas e instrumentos dos Guaxininhos, aqui vai uma lista:
– Bestiärio
– Cólera
– GBH
– Days n’Daze
– Against Me!
– Pigeon Pit
– Dead Kennedys
– La Lira Libertária
– Black Flag
– Las Calles
– Los Dolares
– Los Crudos
– Fun People
– Tragedy
– Crass
– Rastilho
– Doom
– DER

O PÔSTER EM SERIGRAFIA, TAMANHO A3, PODE SER ADQUIRIDO CLICANDO AQUI.

Pensando alto sobre o Livro dos Vivos, de Binho Barreto.

O Livro dos Vivos me chamou atenção pelo nome. Me ofereceu um contraponto instantâneo ao Livro dos Mortos, e eu queria entender o que há nesse livro que possa celebrar a vida como celebramos a morte. Namoro este livro já há algum tempo, desde que vi um exemplar em uma promoção no site da Editora Impressões de Minas, mas não tinha recursos para comprar na e´poca. Hoje escrevo isso e parece bobo, mas quando se está desempregado, comprar livros talvez não seja uma necessidade. Consegui comprar o livro nas mãos do próprio Binho Barreto durante a Feira Urucum. Ele estava expondo seus materiais ao lado da minha banquinha, e foi a chance que tive de trocar uma breve ideia com ele sobre a impressão que o livro dele poderia me fornecer. Desde o falecimento do meu pai, em 2021, que as reflexões sobre vida e morte vagam na minha cabeça. Refletir sobre esses processos me traz uma dor boa, dessas de me sentir vivo e saudosista, de rememorar situações em cada lágrima que escorre. Mas, principalmente, me traz uma vontade de vivenciar coisas diferentes, de correr atrás de sonhos e desejos, de não cair na apatia da sociedade consumista e sem sentido que o kapitalismo impôs.
Não faz nem uma semana que adquiri o exemplar, e agora já tentarei escrever sobre essa obra devorada em poucas horas. É uma escrita tranquila, fluida, em que a todo tempo nos questionamos sobre a veracidade das cenas descritas com uma quantidade de detalhes impressionante. É como se durante a leitura você se colocasse no lugar do autor, e observasse com seus próprios olhos cada elemento da cena que foi narrada. A narrativa tem um cuidado enorme com a memória. Sabemos que a memória nos prega peças, e é bem possível que tudo que Binho Barreto experimentou através de seus olhos não seja exatamente assim. Mas são muitos detalhes que ficaram marcados na pressa cotidiana e que são descritos como um observador nato.
São cenas do cotidiano, efêmeras, captadas somente por quem está atento à tudo que acontece ao seu redor. São segundos que te fazem esquecer do mundo para se concentrar somente nesta cena curiosa. De memória ou in loco cada capítulo traz pessoas vivendo, sendo afetadas por uma situação, por uma discussão, por uma vontade, por um problema, por uma curiosidade. São pessoas que se afetam e são afetadas por diferentes estímulos, e tudo isso é registrado por quem está presente. Lendo estas páginas me senti em um espaço-tempo onde só a observação da cena me importava. Fiquei preso na imaginação, e retornei ao fluxo de leitura.
Belo Horizonte é uma cidade jovem, que se desenvolveu com uma mistura de referências artísticas e arquitetônicas, uma atropelando a outra, que criou avenidas como se fossem muros, que vivencia suas contradições desde sua gênese. Binho parece transitar por estes espaços para descrever o que há de interessante nessas passagens, nesta história que é escrita a cada dia, longe dos holofotes da grande mídia ou do turismo. Cenas comuns, banais e efêmeras (utilizando as palavras da Elza Silveira no posfácio do livro) se tornam situações carregadas de significados, sobretudo pra quem, assim como eu, é de BH, e que todo dia tenta entender qual é a proposta desta cidade fincada no alto das serras entre ecossistemas distintos.
Nós que nos interessamos pela lógica das cidades, das vivências e das relações, percebemos as cenas, mas a correria nos impede de registrar esses momentos. Este livro talvez seja um convite à aguçar a percepção, a exercitar o registro, a viver. Parece cliché falar desta forma, mas a morte é a única certeza que temos. Iremos chegar lá algum dia. Até lá, nós viveremos.

O Livros dos Vivos – Binho Barreto – Selo Leme/Impressões de Minas

Afetar e ser afetado

A Sete Palmos (Six Feet Under) – 2ª Temporada, Episódio 13 – The Last Time

Logo nas primeiras cenas deste episódio Nate Fisher vai de encontro ao seu amigo Aaron Buchbinder. Aaron está em uma cama, olhos vidrados no nada, aparelhos respiratórios ligados, e recebe Nate com os dizeres “Vá embora!“. O que se segue disso, é uma encenação de um processo de morte devido a um câncer de pâncreas em estágio avançado que foi desenvolvido no personagem de Aaron. Ele diz para Nate: “Eu quero que isso acabe!“, e logo depois começa a faltar ar, combustível essencial para a existência dos seres vivos. Aaron diz: “Não estou pronto, me ajude!“, e toda uma representação do estado agonizante acontece a partir daí. A cena termina no minuto 5:33, com o personagem de boca aberta, travado na mesma posição, e o escrito clássico da série com o ano de nascimento e de falecimento da pessoa: 1976 – 2002. 26 anos.
O personagem de Aaron apareceu na série apenas na segunda temporada, e teve uma passagem que, apesar de curta, foi bem marcante para mim. Ele foi diagnosticado com câncer de pâncreas em estágio avançado, e os médicos afirmaram para ele que a morte poderia chegar a qualquer momento. A única reação de Aaron diante deste diagnóstico foi esperar a morte chegar. Rompeu qualquer relação que tinha com familiares, com sua namorada, com seus amigos, com seu trabalho e com seus estudos, com o lazer, com a vida social, com tudo. Assim, aguardou solitário chegar o momento certo. Esse tempo durou por volta de 1 ano. 1 ano em que tudo foi deixado de lado, pra viver em função da morte que nunca chegava.
Nate Fisher conviveu com a morte durante sua infância, pois sua família administrava uma empresa de serviços funerários na sua própria casa. Nate fugiu para Seattle para não herdar os negócios, e jurou que não trabalharia com funerária. Após o falecimento do pai, Nathaniel, logo no primeiro episódio da série, Nate se vê colocado um pouco nessa posição de ajudar nos negócios da família, e acaba virando diretor de funerais na empresa. No episódio 11 da segunda temporada, Nate chega até Aaron por uma indicação de uma Rabina, que ofereceu os serviços da Fisher and Sons para Aaron, e indicou Nate para ajudá-lo no processo de “funeral pré-arranjado”. Ao se conhecerem, Aaron questiona os motivos de fazer um funeral para as pessoas que ficam, e ele tem uma mentalidade que se expressa na frase em que ele diz em bom tom para Nate: “E se sua vida foi uma perda de tempo para todo mundo? Até mesmo para você?“, e segue afirmando para Nate que o que ele está vivendo naquele momento é apenas uma prorrogação da vida, pois ele já deveria ter partido. Depois disso, ainda tardou 2 episódios para Aaron falecer.
A nível teatral de conteúdo televisivo de entretenimento, Aaron conseguiu trazer um pouco do drama e da agonia durante sua partida, e Nate participou do processo como o único sujeito a oferecer suporte a quem já havia desistido de viver. Nate viu a morte chegar e carregar Aaron nos ombros. A última cena desta tomada, de Aaron de boca aberta, corpo rígido, olhando para o nada, me marcou profundamente.

2 anos

Hoje completam-se 2 anos do falecimento do meu pai. Da descoberta do tumor até o falecimento foram apenas 3 meses. Infelizmente, não tivemos certeza de nada, porque não foi feita a biópsia. Mas tudo que os exames indicavam, sugeriam uma neoplasia periampular, câncer no pâncreas. Esse tipo de tumor somente dá alguns sintomas quando já está em estágio avançado, por isso é tão fatal. As últimas palavras do meu pai foram “Eu quero dormir!”. Se fosse um episódio da série, apareceria uma tela branca com o nome do meu pai escrito, além dos anos de 1960-2021, logo depois do meu pai conseguir, finalmente, dormir.
Diferentemente do personagem Aaron, meu pai não desistiu de viver. Viveu intensamente tudo que queria e tudo que pudemos fornecer para ele. Diferentemente de Aaron, meu pai perdeu muito peso, perdeu muitos músculos, sentia muitas dores, e acabou ficando um pouco dependente de outras pessoas para ajudá-lo nas atividades diárias. A alimentação era especial, controlada. Eram tempos complicados de pandemia, então as visitas não poderiam ser tão frequentes e descuidadas.
Eu vi a morte chegar e carregar meu pai nos ombros. Retirar-lhe o ar e o deixar agonizando, enquanto olhava vidrado e rígido o sol que nascia pela Serra, no horizonte vasto. Meu pai tardou várias horas para dar seu último suspiro no processo lento da morte, Aaron teve alguns segundos no 13º episódio da 2ª temporada para conseguir partir em paz.

Eu não vejo mais a morte como eu via antes. Talvez hoje eu tenho um pouco dessa certeza de que a morte chegará para todos nós, e o que fica nesse tipo de reflexão é justamente sobre o que fazemos com nossas vidas. Eu tinha conflitos com meu pai, assim como pais e filhos sempre acabam se desentendendo em alguns pontos de suas vidas, e me arrependo de não ter lidado melhor com várias situações, e talvez até aproveitado mais a presença dele. Imagino que ele poderia pensar o mesmo sobre mim, e isso não necessariamente é um alívio. Fico pensando no personagem de Aaron e na relação que tive com meu pai, e o único que consigo pensar são nas coisas que a gente constrói enquanto sujeitos. Nós somos pessoas sociais, políticas, humanos que erram e aprendem, e que precisamos aprender a viver em sociedade de alguma forma.
Aaron desistiu de completamente tudo, meu pai resistiu enquanto pôde, manteve suas relações e alegria de sempre, não quis preocupar ninguém em nenhum momento. E eu vejo o quanto meu pai afetou as pessoas com quem se relacionou. No velório, em plena pandemia, haviam muuuitas pessoas, e várias mensagens de carinho apareciam no Instagram e Facebook dele (Tá, isso eu acho bizarro). A Federação Mineira de Natação fez uma publicação em memória a meu pai, um atleta PCD amador. Aaron entrou na vida de Nate para lhe dar alguma perspectiva de vida. Meu pai entrou na vida de muitas pessoas para simbolizar várias outras coisas.
Imagino que ele deve ter olhado para tudo que vivenciou e disse: “Acho que foi uma vida bem daora!“. E talvez seja isso que devemos buscar em vida, construir relações, afetos, divertir, buscar os sonhos e desejos, não desistir. Imagino que essa ideia seja o simbolismo que eu gostaria de significar a morte, um movimento em busca de afetos.

Ps.: Na série A Sete Palmos, todo mundo ali precisaria de uma terapia de verdade. É muito trauma e muita treta acumulados, sem verbalizar e sem tentativas de lidar com as emoções de uma maneira mais saudável. Parece que todo mundo é egoísta, sem empatia, e tenta impor o que quer o tempo todo. Nenhuma relação assim pode ser saudável, fato.
Ps.2: Margareth, a mãe da Brenda nesta mesma série, é uma péssima terapeuta. Não veja a atuação dela e ache que seja uma regra dentro da psicologia. Obviamente ela está lá para enriquecer em cima das celebridades, e dar pitaco errado na vida das pessoas. Isso não é terapia.

Banquinha no 10º Velada Libertária

Dia 28/01 terá a 10ª Velada Libertária, com lançamento da biografia escrita da banda Consciência Suburbana, e gig com Consciência Suburbana, Apatia Social, Distúrbio Sub-Humano, Johnny Álcool e Kaos Attack. O evento será no Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania, no bairro Santa Tereza em BH.
Eu estarei com minha banquinha montada, expondo/vendendo gravuras, pôsteres e camisetas. Outrxs expositorxs também estarão por lá com seus materiais, além de rango vegano no local.
Só chegar chegando!!