Ruim demais pra ser mentira #2

Fantasma

Quando eu era pequeno costumávamos ir em família para um sítio que meu avô tinha aqui na região metropolitana. Eu achava super distante, e era um lugar que não havia muita estrutura. Dois clubes, uma lagoa, casas de fim de semana, bares e pequenos comércios. Boa parte da minha família paterna se encontrava aos finais de semana neste sítio, e era sempre muito legal aquela renca de tios/as e primos/as brincando, correndo pra lá e pra cá e praticando diversas atividades. Entre futebóis, piscinas, pedalinhos, buracos e churrascos, eu gostava mesmo é quando saímos em bando para caminhar pela região.
Algum tio animado sempre nos guiava e éramos várias crianças correndo e inventando brincadeiras pelo caminho de rochas gnaisses encrustadas em gramíneas por onde passavam os automóveis, carroças e bicicletas.
Um local na região que gostávamos de ir caminhando nesta época era um hotel que foi abandonado durante sua construção. No meio do nada as estruturas foram erguidas, vários andares, amplos espaços. Quando íamos, só haviam as colunas que formavam o esqueleto da edificação, bem como seus respectivos pisos e tetos. Tudo muito deteriorado, sujo e entulhado. Nós subíamos e descíamos, brincando de qualquer coisa que achássemos esperando-nos no chão. Meus tios falavam, na época, que as pessoas começaram a furtar as paredes do hotel abandonado para construírem suas casas, enquanto apontavam para moradias precárias que eram avistadas na paisagem. Eu imaginava pessoas, literalmente, levando paredes de tijolos montadas até o local onde seria suas residências.
Me lembro bem de um dia que estávamos eu, minha irmã, meus dois primos e meu tio (pai destes primos) caminhando em direção ao hotel. Subimos as ruas que levavam ao fundo de um dos clubes da região, adentramos em um caminho de mato, e lá vimos a majestosa estrutura abandonada.
Logo, eu e meus primos decidimos apostar corrida para ver quem chegava lá em cima primeiro. Largamos a uma velocidade absurda e deixamos para trás meu tio e minha irmã. Nós três acessamos o que poderia ser um saguão, passamos pelo vão que seria de um elevador, chegamos à rampa externa que fazia uma curva em espiral e findava no segundo andar. Subimos correndo, agitados. No segundo andar, avistamos a escadaria e a subimos correndo, demonstrando a incrível habilidade de subir pulando um degrau para ir mais rápido.
Nós três estávamos exaustos, cansados e suados quando chegamos ao último andar, um zuando a cara do outro pela velocidade, pelos tropicões e pelo jeito desengonçado de correr. Quando nos demos conta, percebemos que meu tio e minha irmã já se encontravam naquele andar. Nós nos entreolhamos e fomos perguntar como que eles haviam chegado antes da gente, já que fomos correndo e havíamos deixado eles para trás.
Meu tio virou para a gente e disse:
– Um fantasma trouxe a gente!
***
Na minha cabeça eu associei a figura do fantasma à imagem do Caronte, barqueiro de Hades, presente no filme Fúria de Titãs de 1981. Neste filme, Perseu é levado ao mundo dos mortos pelo Caronte, aquela figura esquelética silenciosa, que coleta suas moedas para transportar pessoas por essas águas neblinadas. Essa é a figura que eu pensava que meu tio e minha irmã haviam topado no trajeto. Inclusive, cheguei a cogitar um elevador fantasma imaginário que subiu pelo vão antes da gente.
A memória desse filme não é a toa. No sítio havia uma VHS desse filme e nós sempre assistíamos quando estávamos lá. Eu adorava. O imaginário e simbolismos das cenas do filme seguem gravados nesta caixa que chamamos de cérebro.
***
Esse mito ficou martelando na minha cabeça por anos. Eu nunca entendi como eles subiram o hotel abandonado antes de três crianças com muita energia pra gastar. Afinal, eu havia crescido e, finalmente, compreendido que mitologia grega tem esse nome por uma razão bem óbvia. No mais puro espírito investigativo, há pouco decidi questionar minha irmã e meu tio sobre esse fato. Me perguntava se eles lembrariam deste episódio, e, se lembram, como foi que aconteceu.
Ao serem questionados em uma reunião de família, minha irmã disse:
– Não me lembro, mas pode ser que tenha acontecido.
Meu tio disse:
– Foi o fantasma que subiu a gente.


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Impressão do livro Haicaipiras

Uma das coisas curiosas que ~felizmente~ surgiram com a pandemia, foi a capacidade de nos aliarmos de maneiras mais sólidas com outrxs artistas. Nos víamos todxs em situação de vulnerabilidade, passando apertos pra pagar as contas, isoladxs da vida social, dos contatos, das redes, e a vida virtual de repente surgiu como uma possibilidade de interação (e hoje eu acho isso um saco, hahaha, mas eu entendo que ficamos muito dependentes das redes nesse período, era uma necessidade). Não que as associações, parcerias e colaborações não existissem antes, mas acho que no contexto pandêmico, sobretudo no início, estávamos mais abertxs à produção coletiva.
Uma das pessoas, que logo se tornaram duas e três, que conheci nesse contexto foi o Vitor Pedroso, aka Piruá Gravuras. O mano tem formação em Grego Clássico e Violão Clássico (ou algo assim) , e descobriu a gravura em uma oficina. Logo foi encantado pela técnica e desenvolveu uma rede enorme de artistas gravadorxs, e durante a pandemia conseguiu desembolar tantos contatos que foi o responsável pelo planejamento da maior troca de gravuras que o mundo já viu, o Escambo Gráfico. E eu digo que logo se tornaria duas e três pessoas, porque é impossível acompanhar as atividades do Vitor e ignorar o corre da Lud e do Joca. O Escambo, hoje, é tocado pelxs três (em maior ou menor proporção, rs) e o trabalho que elxs têm desenvolvido merece toda admiração e respeito possíveis.
Digo isso tudo porque, desde que nos conhecemos virtualmente, eu e Vitor trocamos muitas ideias, sobre técnicas, sobre artistas, sobre grego (hahahaaha) e sobre a vida também. Me lembro que meu pai havia adoecido com menos de 1 ano de pandemia por conta de um tumor, e eu andava meio mal da cabeça por conta de tudo que estava se passando. Conversar com o Vitor sobre isso, sobre minhas tensões e preocupações, e sobre tudo que estava rolando foram momentos importantes nesse processo todo.
Esta poderia, muito bem, se tornar uma postagem de boas memórias e elogios, mas eu gostaria de falar sobre outra questão. Eu e Vitor conversamos várias vezes sobre fazer alguma produção em parceria, mas a logística ou o tempo sempre iriam atrapalhar de alguma forma. Até que o Vitor chegou com uma ideia sensacional: produzir uma edição de um livro de haikais de maneira 100% artesanal. O livro já tinha nome, Haikaipiras ~haikais com a temática caipira.
O projeto demorou algum tempo para sair do papel, mas, para minha surpresa, Vitor já havia se associado a outros dois escritores/poetas para dar corpo à obra. Ele me enviou as páginas já diagramadas no tamanho A5, eu orcei o valor do meu trabalho e dos materiais que iria utilizar, incluindo todos os papéis.
Quando ele me pediu para iniciar a produção, já estava tudo pronto. As telas de serigrafia gravadas com toda a parte de texto só aguardavam a passagem da tinta.
Após a impressão de todas as páginas feitas de forma manual, enviei tudo pelos Correios para Araraquara/SP, localidade onde vivem Vitor e Lud (e Joca). Lá, Vitor pegou as páginas do Papel Pólen Bold que sobraram das impressões, e que foram enviados juntos com as páginas impressas, e imprimiu suas ilustrações em xilogravuras, dialogando com o texto e com a temática da obra.

Recentemente chegou um exemplar aqui em casa. Fiz 54 impressões de cada página, e foi o suficiente para criarmos uma edição fechada de 50 cópias, mais 1 cópia para cada pessoa que participou do processo de produção. O resultado não poderia ser diferente. O acabamento e a costura, também feitas de forma manual, é um espetáculo à parte. O resultado é uma obra incrível, que dá gosto de ver, de manusear, de ler, de observar. O projeto foi manual e artesanal em todas etapas possíveis, e nele é possível perceber cada gota de suor nas páginas impressas em serigrafia e em xilogravura.

Talvez a palavra “orgulho” seja pouco para definir a sensação de ver a matéria desta obra. Ver algo produzido de forma artesanal, com vários mãos e mentes em ação, é algo que dá gosto. Enfim, só tenho a agradecer ao Vítor, Lud, Emmanuel e Fábio (e Joca) por me possibilitarem fazer parte deste processo. Cada haiku que leio me tira desse lugar rígido que é a cidade, me leva prum lugar mais suave, mais sereno, mais maleável. Cada ilustração que vejo me faz lembrar de um tempo mais leve, menos corrido, mais contemplativo. A obra me trouxe uma sinestesia que há muito não sentia. São memórias que retornam, sobre pessoas, locais, gestos e situações. Sem palavras que possam descrever o que se passa na minha cabeça quando escrevo sobre a obra.

Obra: Haicaipiras (2023)
Haikus: Emmanuel Santiago
EpiGrama: Fábio Cairolli
Ilustrações em xilogravura: Vitor Pedroso aka Piruá
Impressão do texto em serigrafia: La Idea
Encadernação e Acabamento: Ludmila Siviero e Vitor Pedroso
Tiragem limitada/numerada em 50 cópias

Finalmente saiu a parceria que tanto almejávamos. A primeira de muitas (assim espero). Foi um prazer e um privilégio produzir com vocês. A minha parte do processo de produção foi toda gravada e pode ser vista no vídeo abaixo.
Obrigado.

Lapsos de Tempo #3

Para cima ou para baixo

– Papai, porque as casas ficam umas em cima das outras?
– Como assim filho?
– Eu olho pela janela, e vejo esse amontoado de casas, uma em cima das outras. Porque elas são assim? Porque os prédios são tão altos?
– Filho, os seres humanos possuem duas formas de interagir com o mundo. Elas são interligadas, uma só existe por causa da outra. Uma tem a ver com a destruição, outra com a construção.
– Não entendi…
– Calma que irei te explicar.

– Já fazem muitos e muitos anos que as pessoas decidiram que gostariam de viver umas perto das outras em espaços de terra que chamaram cidades. Nós hoje vivemos em uma cidade considerada grande. Porém, a cidade não pode existir sem que tenha alguma estrutura que a construa, que abrigue as pessoas, que possa funcionar de alguma maneira. Portanto, dois fenômenos não naturais são muito praticados, e de uma maneira que é bem forte se pararmos para pensar sobre isso.
O primeiro deles diz respeito à construção. As cidades ocupam pequenos pedaços de terra que precisam abrigar um número enorme de pessoas. Portanto, essas pessoas decidiram que queriam subir cada vez mais alto, para caber mais e mais pessoas. Os prédios possuem cada vez mais andares, alcançando alturas inimagináveis. As casas começaram a subir os morros, a ter mais andares pra comportar mais famílias, e ninguém considera o impacto dessa concentração populacional em lugares que já não suportam mais pessoas. As bordas dos rios, córregos e ribeirões já estão tomados por concreto e suas águas já são puro dejetos.
Tudo isso também vem acompanhado de uma produção de bens móveis que são consumidos e descartados aos montes. São coisas essenciais e não-essenciais que fazem parte da vida citadina, mantém o comércio aquecido e a economia girando, geram prazer, deleite, ajudam no social e no profissional. Tudo isto que consumimos hoje são essas coisas que logo serão descartadas. Inclusive alimentos, roupas e itens de higiene pessoal.
O segundo fenômeno é o da destruição. Tudo isso que precisa ser construído sai de algum lugar. Os seres humanos decidiram que era uma ótima ideia criarmos crateras gigantes, de onde pudéssemos extrair de forma predatória todos os recursos do planeta terra, para construirmos mais e mais abrigos, mais e mais itens de consumo essenciais e não-essenciais para a vida no espaço urbano. Acabamos dependendo de tudo isso, da destruição do solo, das matas, dos rios, dos recursos terrenos que são nossa sobrevivência.

– Mas, papai, se precisamos disso para construir abrigos e alimentos, é porque é necessário, não?
– Filho, aqui nós precisamos pensar de uma maneira mais profunda. Nós estamos destruindo o solo e a superfície, esgotando todos nossos recursos para chegar cada vez mais alto com nossos estilos de vida.
Pensa em uma analogia que pode ser interessante: Enquanto construímos nossas casas e abrigos cada vez mais perto do céu, nos aproximamos do inferno a cada vez que destruímos a terra para explorar de maneira predatória seus recursos. O meio termo seria um estilo de vida mais equilibrado, que não fosse tão predatório e que não precisasse amontoar tanta gente num mesmo espaço de terra.
É impensável o que nos aguarda no futuro se mantivermos esse ritmo de construção e de destruição. Lembra daquele cientista que disse que nada se cria, tudo se transforma? E se tudo que passa por uma transformação fosse caminhar para algo pior? Embora hoje tenhamos algumas facilidades, ainda não se justifica o caos do porvir.

– Não sei se entendi bem, papai…
– Quer que eu tente explicar de outra forma?
– Não, você fala muita coisa que não dá pra entender. Melhor deixar pra lá…

La Idea, 2023 – Canon BF-800, Fomapan BW 100

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La Idea novamente na Feira MOTIM

Olá, passando aqui para anunciar que dias 2 e 3 de Dezembro estarei novamente participando da Feira MOTIM, em Brasília. Desta vez, a edição da Feira será no Museu Nacional da República, e estará aberto ao público das 11h às 19h, em ambos dias.
Serão mais de 200 expositorxs, de todo território dominado pelo estado brasileiro, em dois dias de muita doidera. Eu fiz um relato da minha participação na Feira em Maio deste ano, e você pode ler o relato clicando aqui.

Webb Ellis, o mito fundador e os 200 anos de Rugby

Rugby é uma cidade de 78.000 habitantes, localizada 134 km ao norte de Londres, na Inglaterra. No início do século XIX, era muito comum os pais enviarem seus filhos para a Grammar School de Rugby para estudar, sobretudo, línguas.
Em 1823, William Webb Ellis, aluno da instituição, enquanto jogava um tipo de futebol com as regras existentes na época, quebrou as regras pegando a bola com a mão e correu em direção às traves, enquanto seus adversários tentavam agarrá-lo para impedir que Ellis chegasse ao fundo do campo.
A partir daí, começaram as divisões de quem queria seguir com a bola exclusivamente nos pés e quem queria seguir com a bola também nas mãos. Em 1845 três alunos da Escola de Rugby escreveram as primeiras regras conhecidas do esporte, separando, definitivamente, o “Football” do “Football Rugby”. As regras do futebol comum foram escritas apenas em 1863.
Existem muitas dúvidas sobre o mito fundador do esporte, mas essa história do ousado jovem estudante Webb Ellis segue sendo a mais aceita como pontapé inicial do esporte.
Apesar da Inglaterra ter inventado o esporte, várias de suas colônias conseguiram desenvolver muito suas habilidades, criando várias inovações e desafiando, inclusive, as leis vigentes. Tanto é que todo ano a World Rugby faz uma revisão geral das leis do jogo para adaptar a novas situações surgidas em campo, ou para aumentar a segurança dos atletas. E é um calhamaço de 300 páginas que é revisto todo ano, e todas as pessoas envolvidas com o Rugby devem estudar e fazer uma prova para ter o certificado de que estão aptos à participar das atividades do esporte.
O Rugby foi um esporte muito restrito, que evitou seguir os passos do futebol, mantendo-se amador até 1995. A partir de 1995, os clubes, atletas e associações puderam profissionalizar-se. Esse fato reflete-se hoje com uma enorme discrepância de salários, investimentos e ligas, criando um enorme abismo entre as confederações profissionais e as que se mantiveram amadoras. No ranking e nos jogos oficiais da World Rugby, vemos pouca mobilidade das equipes amadoras, que não suportam disputar partidas contra equipes de alto nível profissional.
Pensando nesse sentido, Inglaterra e França são os países do hemisfério norte que mais investem em suas equipes e ligas, pagando altos salários, contratando jogadores de Confederações amadoras e trazendo o rugby pro mundo do marketing com muito mais efetividade. Mas também as Irlandas, País de Gales, Escócia e Itália não ficam para trás. Também a Geórgia tem conseguido desenvolver o esporte para ingressar nesse seleto grupo de potências.
Países do hemisfério sul, como África do Sul, Nova Zelândia e Austrália, sempre tiveram o esporte muito bem desenvolvido, disputando de igual para igual partidas contra as potências do norte. Não é a tôa que são os maiores campeões da Copa do Mundo de Rugby, disputada desde 1987. Essas três equipes mantém franquias, que são times que disputam torneios a nível internacional, e seus atletas abastecem as seleções nacionais, mantendo um nível de jogo sempre muito elevado. A Argentina é um caso à parte: não possui equipes profissionais, apenas ligas amadoras, e ainda assim conseguem manter um nível de jogo altíssimo, conseguindo bons resultados a nível internacional. O Japão é a equipe do “sul” que tem investido muito em suas bases e ligas, e nos últimos anos percebemos a ascensão do esporte no país. Isso sem contar com os “Guerreiros do Pacífico”: Fiji, Samoa e Tonga, que são equipes sempre muito fortes e rápidas, ainda que com pouco investimento.
O Rugby é um esporte de contato, porém não é um esporte violento. Possui uma jogabilidade baseada nos princípios de continuidade e disputa: O jogo é contínuo, dinâmico e sempre que precisar ser reiniciado será através de uma disputa. Ele possui 5 valores que devem ser seguidos: Disciplina, Paixão, Solidariedade, Integridade e Respeito. No rugby, sabemos que só existe jogo porque temos um adversário, porque temos um árbitro, e porque temos apoiadores. Todos devem ser tratados com respeito. Sim, os árbitros são respeitados pra caramba, não precisam levantar voz e falam somente com o capitão da equipe.
Em 2023 acontece a Copa do Mundo de Rugby, evento que é realizado na França. Marca o aniversário de 200 anos do esporte, e esse ano, a África do Sul é o país austral que mais tem chances de vencer o Mundial, e pode ser seu quarto título, sendo que também são os atuais vencedores. Para o hemisfério setentrional, Irlanda (Irlandas unificada) e França (que joga em casa) são as equipes que podem dar bastante trabalho e talvez chegar ao título também. O troféu da competição tem o nome de Webb Ellis Cup, em homenagem ao jovem fundador do esporte.
Fato curioso: o Mundial é disputado de dois em dois anos, sendo que a cada edição alternam-se entre as modalidades feminina e masculina.
Na edição masculina, África do Sul e Nova Zelândia possuem 3 títulos cada, Austrália possui 2 e Inglaterra possui apenas 1. Na edição feminina Nova Zelândia lidera com 6 títulos, seguidos de Inglaterra com 2 e dos Estados Unidos, com apenas 1.

Sobre a ilustração

No primeiro plano, o troféu da Webb Ellis Cup, também conhecida por Copa do Mundo de Rugby. Em seguida, Lukhanyo Am (Springboks) e Portia Woodman (Black Ferns), atletas que admiro muito.
Logo atrás, a bola Gilbert, pois foi o velho Gilbert, sapateiro, que teve a ideia de fazer uma bola oval utilizando solas velhas para que a atração principal do jogo parasse de estourar quando os jovens caíssem por cima dela.
Por último, o palco de jogo, com suas pinturas seccionadas e um grande H, símbolo máximo de pontuações.
É minha singela homenagem ao esporte que amo.
Felicidades.

*Texto escrito originalmente em Agosto/23, antes de começar o Mundial. Enquanto faço essa postagem, mais da metade das partidas já foram disputadas. Minhas previsões estão certas até então.

Testando marcadores “tons de pele”

Uma das coisas que mais sinto dificuldades quando vou fazer trabalhos que envolvem pessoas é compreender, a partir de cores comuns, como reproduzir tons de pele. Meu daltonismo me impede de ter segurança para fazer essas coisas. Nesses kits de marcadores, tintas ou lápis de cor eu nunca sei exatamente o que estou vendo ou usando. Ultimamente, para conseguir fazer alguns estudos (e eu tenho certeza que meu amigo Daniel de Carvalho iria dizer que eu não precisaria disso, rs) eu tenho adquirido kits que já vem com a denominação “tons de pele”. Foram 2 kits de marcadores e 2 kits de lápis de cor (esses eu faço um post mais adiante falando sobre). Nesse post eu escrevo apenas sobre os marcadores Cis Graff Dual e o Faber-Castell Super Soft.
E o estudo começou com esboços feitos a partir de fotografias retiradas do Pinterest.

Esboços feitos a lápis numa folha de papel A3

Eu curto fazer o esboço de forma bem solta, sem me apegar muito a proporções ou exatidão à imagem original. Coloco poucos detalhes, poucos preenchimentos. Uso mais como uma referência inicial mesmo. Eu curto fazer assim para usar de uma maneira menos pragmática quando estiver preenchendo com os marcadores na mesa de luz. Eu curto essa maneira mais livre de fazer preenchimentos e detalhes, não me apego muito à representação “ideal” do real não.

Para a versão definitiva, utilizei papel Canson Bristol XL 180g A3, que não possui superfície tão porosa e a tinta adere bem, conferindo um resultado bem suave ao aplicar a tinta dos marcadores. Os brushes Faber-Castell Super Soft possuem uma boa transparência, reagindo bem às superposições de tonalidades, porém deixam em seu rastro uma leve textura, não sei se é por causa do papel. Também achei interessante as tonalidades que são bem quentes e terrosas, com o tom mais claro sendo bem contrastante com o tom mais escuro. Achei que os tons escuros são bem parecidos, fizeram pouca diferença ao meu olhar daltônico.
Os marcadores CIS Graff Duo possuem ponta dupla, uma chanfrada e uma fina, que não é brush, e ambas são bem rígidas. Elas possuem um bom grau de transparência também, e a sobreposição das tonalidades dá uma estética bem massa. Elas não deixam tanta textura no papel como as brushes Super Soft, ficam com uma aparência mais suave a meu ver. Achei a cor das tampas bem diferentes das tintas no papel e senti falta de tonalidades mais escuras. As cores são bem quentes, mas acho que caminham um pouco pr’uma coisa mais “pastel”.
Para alguns acabamentos, utilizei Uni-Pin brush preto e Posca branca 1-M. O resultado está a seguir.

São bons marcadores, fiquei com vontade de adquirir uma gama maior de cores e tonalidades, pra testar de outras formas também, mas acho que dá pra fazer umas peles com o que tenho nesses dois kits. Gosto de me divertir bem solto enquanto desenho e faço os testes, e com certeza essa foi uma experiência bem daora. Podem esperar que em breve eu soltarei mais testes desse tipo.

[litografia] Coruja Cholo

No auge da minha monitoria na disciplina de litografia, lá na EBA/UFMG, andei testando técnicas pra poder compartilhar com xs alunxs um pouco do conhecimento que eu desenvolvia no atelier.
Nesta gravura, eu usei tousche (bastão gorduroso para desenho na matriz litográfica) diluído e aplicado com bico de pena na coruja, aplicado com pincel na moldura oval, e criei uns efeitos com tousche queimado com aguarrás pra dar uma estética meio envelhecida, manchas de mofo/umidade.

Caracterizando os elementos representados – CORUJA

A Coruja tem essa representação ligada ao conhecimento, sabedoria. Durante algum tempo eu curtia muito essa ave, tinha pequenas esculturas de coruja, em 2012 até cheguei a tatuar uma coruja no meu antebraço. Também as usava como personagens de meus desenhos, gravuras e pinturas.
Enfim, a imagem da coruja foi algo que permeou minha criatividade durante muito tempo, e tê-las feito dentro de temas específicos foi algo que curti bastante nesse período. Foi minha porta de entrada pra trabalhar diferentes estéticas a partir de um mesmo referencial. Também foi minha porta de entrada para vestir animais a caráter, algo que faço com mais frequência atualmente. Ao lado está o esboço que fiz no meu bloquinho A5, utilizando canetas nanquim, Posca e marcador Sharpie Tank.
Esta ideia foi especial, uma coruja com vibe meio Ron Swanson Chicano.

Identidade CHOLO

CHOLO diz respeito a uma identidade fronteiriça existente, sobretudo, na divisa entre México e Estados Unidos. Ciudad Juárez (México) e El Paso (Estados Unidos) são cidades surgidas a partir da separação do povoado de Paso del Norte (México), que foi separada na Guerra de 1846, quando os Estados Unidos usurpou metade do território mexicano e decidiu-se que o Rio Bravo, que cortava a cidade, fosse a fronteira entre os países. Apesar de serem divididas por limites transnacionais, as cidades estão situadas no meio de uma região desértica, e elas possuem trocas muito fortes entre si. Grande circulação de mercadorias e pessoas cruzam a aduana, e o fechamento da fronteira é um fenômeno relativamente recente.
Atualmente, uma cerca do lado norte do Rio separam os países, mas como as cidades são co-dependentes, famílias, negócios, movimentos pendulares, comunidades indígenas e recursos foram divididos, criando uma situação ainda mais complexa de circulação. É nesse contexto que surgem os Cholos. Ainda que eu tenha usado essas duas cidades como exemplo, o fenômeno é algo comum em várias localidades da fronteira, não se limitando à fronteira Chihuahua/Texas.
Cholos são caracterizados como seres fronteiriços, que utilizam da estética para se diferenciarem dos estadunidenses, portanto, são mexicanos (ou, atualmente, descendentes de famílias mexicanas).
É uma identidade que foi desenvolvida a partir dos Pachucos, e isso sim tem um teor geográfico mais localizado, pois El Paso também é conhecida como “Chuco”, e Pachuco seria um termo derivado do “Para el Chuco” (Pa’Chuco), pois muito mexicanos faziam o movimento pendular de morar em Cd. Juárez e trabalhar em El Paso.
Caracterizando a estética Chola, calças pantalones (derivadas do Zoot Suit Pachuco), camiseta canelada branca, camisa flanelada xadrez com apenas o botão superior abotoado, muitos usavam bigode e cabelo penteado para trás (alguns usavam um tipo de redinha para manter o cabelo no lugar), outros usavam bandana (marca registrada de muitos grupos até os dias de hoje). O uso de tatuagens também era muito comum, bem como associação com gangues e grupos identitários como forma de defesa.


Moldura

Pensando na questão dos elementos que eu propus nessa gravura, a moldura é algo realmente especial. Com um estilo bem rococó, com arabescos volumosos e bem marcados, a moldura traz um ar de algo clássico, envelhecido, mas que mantém sua nobreza estética. A mesma ideia eu tive com os efeitos de envelhecimento da “foto”, conferindo um caráter de algo antigo, mas que se mantém ainda firme, apesar das adversidades.
A memória é algo que se cultiva, para que não desapareça.

La Idea, 2015 – Litografia sobre papel Hahnemühle, 300g, 33×44 cm

A litografia pode ser adquirida clicando aqui.

[ilustração] Ride in hell

Essa ilustração foi feita sem nenhum propósito aparente. Tava testando alguns efeitos enquanto esboçava alguma coisa e acabei me dedicando à esta tarefa mais que o necessário. Queria testar essas texturas de luz e sombra com retículas, e acabou que virou um emaranhado de retículas, rs. Mas talvez o que eu mais curti foi a brincadeira que tinha feito no Insta. A ideia era abrir a caixa de mensagens para que as pessoas pudessem sugerir uma fala ou uma descrição da imagem. Surgiram alguns muito bons como “Estou indo ver o filme da Barbie” ou “Até o capiroto é mais saudável que eu”. Algumas mensagens que arrancaram gargalhadas de minha pessoa foram “Pedalar, porque essas coxas não vão se definir sozinhas”, “Indo pra casa do boy sedento de tesão”, “Aff, esqueci a mochila do ifud” e “Preciso cortar a unha, tá agarrando no pedal”.

La Idea, 2023

Enfim, ilustração foi feita no iPad, com texturas do pacote gratuito da True Grit. Obrigado à todxs que participaram. Curti muito compartilhar esses momentos de risos com vocês.

Lapsos de Tempo #2

Portuñol avançado

– Olá, bom dia! São ameixas?
– Hola mijita, como vá? Son ciruelas, te salen diez Reales la bolsita.
– Mas isso não parece seriguela, parece mais ameixa…
– Pues son ciruelas… Si quieres, las puede elegirlas tu.
– Obrigada… Posso escolher qualquer uma?
– Si, pero estas de la derecha las tengo que botar…
– Botar na sacola?
– No, las tengo que botar, tirar!
– Botar na sacola e tirar da banquinha?
– No, no, no! Ya están malas. No sirven. Hay que desecharlas. No van para la bolsita!
– Hummm… Entendi… Dez Reais, né?
– Diez por la bolsita llena.
– É isso mesmo! Vou pegar o dinheiro!!
Que se sinta segura, pues te cuida el oso!
– Que osso?
El osito, te mira y te guarda.
– Mas onde que tem osso aqui? É tipo um osso da sorte?
No sé si de suerte, pero es una buen línea pa’ que el cliente se sinta seguro!
– E onde que eu acho esse osso?
Te mira desde el vidrio. Le regale una buen sonrisa!
– Óh!! Hahahaha, não tinha percebido.
– A toda la gente él sabe como sacar una sonrisa.

La Idea, 2023 – Olympus Pen-EE, Samsumg 200 color, vencido.

Eu sei o que estou fazendo, Roberto!

– Você está mexendo no lugar errado, Silvano! Essa mangueira liga diretamente no motor!
– Mas eu lembro de como tava antes! O motor pifou, eu vim aqui pra abrir o capô e eu vi essa mangueira soltar!
– Mas eu tô te dizendo que ela liga diretamente no motor. Não faz sentido ligar no reservatório de líquido arrefecedor!
– Não tem líquido arrefecedor aqui, esse motor tem radiador, ele usa água!
– Água? Não tem dessa não! Nenhum carro produzido depois dos anos 60 usa água. Água só se for pra limpar o pára-brisa!
– Deixe eu fazer o trem aqui Sô, cê fica aí dando pitaco errado. Eu sei como estava antes, isso já aconteceu outras vezes.
– Não Silvano, cê tá tentando enfiar uma mangueira onde não tem lugar pra enfiar, deixa de ser ignorante!
– Se bem que o problema parece estar na válvula esquerda, olha como ela está diferente das outras!
– Com certeza não é esse o problema, cê fica testando coisas que não tem a ver nada com nada, e não consegue enxergar o problema principal!
– Bixo, eu consegui arrumar das outras vezes numa boa! Só porque você tá aqui que esse trem num arruma.
– Agora a culpa é minha?
– Sempre foi. Tô te falando que já rolou isso antes e eu consegui arrumar…
– Arrumou tão bem arrumado que deu problema de novo na mesma coisa. Para de fazer gambiarra, Sô!
– Eu sei o que tô fazendo, Roberto! Faria mais rápido se você num tivesse aqui me enchendo!
– O sinal já abriu e fechou 20 vezes e você continua aí achando que sabe de alguma coisa.
– Aqui cê dêxa! Puta merda, eu mereço…

La Idea, 2023. Canon BF-800, Fomapan BW 100

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[ilustração] Beco do Chá

Meu amigo Sanchez que cria uns blends de ervas que fazem parte do cardápio do O Infusionista me convidou para ilustrar a lata que iria embalar um novo sabor de CHAI, parte de uma coleção dos 4 elementos. Eu fiquei com o elemento TERRA. Chai é uma das minhas misturas favoritas, e o Sanchez faz uma versão especial, bem tropical.
Eu não perdi tempo. O Sanchez me deu total liberdade de criação com minhas ideias e meu estilo e é lógico que eu já pensei num beco mais underground, quente, com diversidade de pessoas, várias referências estéticas, intervenções, animais e qualquer coisa que a minha cabeça sugerisse na hora.

La Idea – Ilustração Original

E assim surgiu esse beco. Passagem de pessoas e mercadorias, com cartazes e adesivos colados, pixações, graffitis, personagens icônicos que vivenciam o dia a dia daquele espaço, tributos a atrações locais, ervas e temperos pendurados, gente mascarada preparando e servindo infusões, animais exóticos vivendo… Toda uma cena que rodeia o chá.


Obrigado pela confiança Sanches, curti muito o chá e a experiência de ter feito parte desse processo.

Você pode encontrar os produtos clicando AQUI ou AQUI.

Aquecendo os dedos com doodles

Uma forma de exercitar um pouco a criatividade é criando personagens aleatórios a partir de formas aleatórias. Eu pedi pra minha companheira desenhar formas numa página virtual, e a ideia era criar rostos com essas formas. É uma atividade bem divertida, que te ajuda a fugir do bloqueio criativo.

Nenhuma atividade é sem sentido. Eu gosto de usar essa técnica pra testar cores, efeitos, pra aquecer os dedos e os punhos, pra fugir do bloqueio criativo e pra me divertir também, porque não? Imaginar é uma ótima maneira de construir algo, e as diversas artes nos possibilitam materializar o que está em nossas mentes.
Segue abaixo time-lapse da atividade.

La Idea presente na III Feira do Livro Anarquista de BH

Dias 19 e 20 de Agosto estarei com banquinha montada participando da 3ª Feira do Livro Anarquista de Belo Horizonte. O evento será realizado dia 19 no Espaço Comum Luiz Estrela e dia 20 no Centro Cultural Vila Aparecida. Confira a programação a seguir:

Para mais informações acessem:
https://feiraanarquistabh.noblogs.org/
https://www.instagram.com/feiraanarquistabh/

Organização: Kasa Invisível e COMPA (Coletivo Mineiro Popular Anarquista)



La Idea presente na Feira Vendo / Nossa Feira

Anota na agenda aí:
Dia 12/08, das 10 as 18h, estarei no Arreda Galeria e Estúdio com banquinha montada participando da Feira Vendo.

Será um dia de evento de flashes tattoos, exposições e muita gente cabulosa mostrando seus trabalhos, com muita coisa massa sendo vendida pra aproveitar a celebração do dia dos pais também pra fazer girar uma verba pra quem é artista.

Feira Vendo / Nossa Feira
Sábado, 12/08, 10 as 18h, Rua dos Aimorés, 1167 (Arreda Galeria Estúdio), BH/MG

Guaxipunx por Abya Yala de volta em Pré-venda

Roba Y Comparte, o grupo de Fölk, Kümbia, Krüst formado por Guaxicrusties está de volta em pré-venda. Agora em modelo todo preto também.
A Pré-venda será até o dia 15/08, com previsão de entrega para Setembro. A primeira pré-venda feita em março se esgotou rapidamente, e agora é provável que eu não faça tantas unidades extras como na primeira vez.
ACESSE O SITE CLICANDO AQUI PARA RESERVAR A SUA

Ruim demais pra ser mentira #1

Censura

Quando eu era pequeno, gostava de escutar o disco dos Mamonas Assassinas. Na época era a melhor coisa que podíamos escutar. Me lembro bem de me fantasiar com peças de roupas aleatórias, adereços incomuns e fingir que eu cantava as músicas enquanto corria pela pequena sala, do pequeno apê em que morávamos. Ia da cozinha para os quartos, pulava de cabeça no sofá, rolava no chão. Eu sabia todas as letras de cor e salteadas, e esse momento sempre era o ápice de minha apresentação para um público insano, enlouquecido, fanático, porém imaginário.
Mas uma coisa que eu sempre quis saber é o que significavam as letras das músicas. Eu perguntava para adultos o que significava, e ninguém me explicava. Eu cantava em voz alta com uma alegria imensa, versos que continham analogias que eu não fazia ideia, e na minha cabeça tudo soava bem literal.
Eu tenho um tio que exerceu um papel importante na minha vida de descobertas. Ele me explicava o que significavam as palavras que eu dizia, seja em xingamentos, seja cantando. Uma vez eu disse que ia “arregaçar” alguém na rua. Ele me disse que “arregaçar” significava “dobrar”, e que eu não tinha condições de dobrar ninguém, afinal eu era apenas uma criança, por isso deveria parar de falar isso. Desde então, eu apenas arregaço as mangas, mas não arregaço pessoas, pois não tenho capacidade de dobrá-las.
Certa vez estávamos reunidos em família e começamos a cantar Mamonas Assassinas na sala. Aquela meninada toda berrando os versos “Roda roda vira, solta a roda e vem, me passaram a mão na bunda e ainda não comi ninguém…”. Curiosamente, meu tio começava a falar um som de “pi” horrível, estridente, enquanto cantávamos algumas partes da música: “Roda roda vira, solta a roda e vem, me passaram a mão na PIIII, e ainda não PIIII ninguém…”. De acordo com ele, essas palavras não poderiam ser ditas por crianças. Nós, como crianças responsáveis, passamos a cantar tudo com “pi” estridente, até que os adultos nos proibiram de cantar essa música, pois seus ouvidos já não aguentavam mais esse som horrível proferido pelas crianças.
Eu, como uma criança que investigava o fato, fui atrás do porque das palavras não poderem ser ditas por crianças. A palavra “COMI” eu até entendia a proibição, pois crianças ainda não conseguiam comer outras pessoas, faltavam alguns anos para que virássemos canibais. Logo, se não podemos comer outras pessoas, não podemos falar que comíamos. Mas eu até hoje nunca entendi o porque de não poder falar bunda.
Meu tio nunca explicou.


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Serigrafia – Brinque com sua fera

Em 2023 eu fui selecionado, mais uma vez, pra participar da troca de gravuras denominada Escambo Gráfico. É uma iniciativa que o Vitor Pedroso (aka Piruá) e a Ludmila Siviero, de Araraquara, organizam anualmente. Eles fazem uma seleção “por ordem de chegada”, separam as inscrições em diversos grupos, recebem as cópias das gravuras de cada participante, criam as pastinhas de cada grupo, e reenviam para cada participante o combo de gravuras de gente do mundo todo. Mó trampo. Mas é com muita satisfação e orgulho que eu digo que gosto de participar destas trocas, conhecer novxs artistas, novas formas e técnicas de gravar e de imprimir, ver novos estilos, novas temáticas, é muita riqueza envolvida em todo esse processo. O Escambo surgiu durante a pandemia e tem produzido ótimos resultados em compartilhar ideias, técnicas e colocar pra circular conhecimentos. Só tenho a agradecer pela existência dele.

Para este ano, eu tive a ideia de criar uma serigrafia de 4 cores em um processo completamente analógico. Desde a pesquisa de referências, de temáticas, até a gravação e a impressão. A pesquisa imagética foi feita exclusivamente a partir de livros. Os esboços foram feitos a lápis em papel, todo o acabamento do desenho foi feito com caneta nanquim. Os vegetais para gravação das telas foram preparados com caneta Posca e mesa de luz. As telas foram gravadas com emulsão pré-sensibilizada (Agabê Unifilm-WR) em poliéster amarelo, 90 fios. Foram utilizadas tintas a base de água Gênesis Grafcryl e a impressão foi feita em papel Vergê Plus, 220g, cor Ônix. Essas últimas informações foram essenciais para se pensar no que é surpresa em um processo de impressão artesanal.

O esboço foi feito em um papel branco utilizando nanquim preto. Já a impressão foi feita em papel preto e o desafio maior foi pensar em como ficariam as cores na impressão, já que eu não usei nenhum tipo de recurso digital para fazer esse teste antes. Todas as sombras, luzes e detalhes foram somente imaginados em como poderiam resultar ou funcionar. Foi um verdadeiro achômetro, ainda mais partindo de alguém que é daltônico. Muita ousadia de minha parte. O resultado foi esse, um caos de linhas, ora luzes, ora sombras, ora pinturas corporais. Uma cena, talvez noturna ou aquática, de duas crianças indígenas brincando com sua fera, enquanto esta utiliza uma máscara de dragão e se emaranha com as sutilezas das crianças.

Não aprisionar, não maltratar, não ter medo. Brinque com a fera.
Esta gravura está disponível para venda clicando aqui.

O Escambo Gráfico é um projeto cuja participação é 100% gratuita. Porém, possui custos elevados de logística. Todos os participantes que podem, doam alguma quantia de qualquer valor para ajudar nos gastos, mas ainda assim há muitos artistas que não podem doar. Se você quer ajudar o projeto, compre a gravura na minha loja virtual que eu repasso parte do valor da venda para ajudar o projeto, ou faça uma doação de PIX de qualquer valor para a chave graficoescambo@gmail.com
Obrigado.

Brinque com a Fera – Serigrafia em papel Vergê Plus 220g – Tiragem: 48 cópias – La Idea 2023
Veja o processo de produção neste vídeo

Lapsos de tempo #1

Um lado que vem e outro que vai

Me detive sobre uma passarela e observei a paisagem que margeava a ponte suspensa. De um lado vinha o ribeirão, rasgando o concreto, com força, com fluxo. Vinha de edifícios carregados, densos. O ribeirão abria passagem em meio ao caos, sua existência nunca pôde ser ignorada. Chegava a mim de forma abrupta, porém silenciosa. Do outro lado, o ribeirão vai se distanciando, sereno. Seu caminho já está traçado, aberto em uma paisagem tranquila. O horizonte está logo ali, apenas esperando sua passagem.
Onde estou? Exatamente no momento da mudança de humor do ribeirão. Onde a cidade, talvez, começa respirar.

La Idea, 2023. Olympus Pen-EE, Doble-X BW 200, vencido.

Caramelitos

“Qué pasó con esa gente? Me han dicho que este haberia de ser un buen punto pa’ ganar platitas. Estoy todo el dia parado aqui, y todavia no vendí lo que necesito pa’ pagar las cuentas. Ahí viene un auto, voy a ver que sale!”

– Oye Señor, buendía! Te puedo ofrecerle caramelitos para tus ninõs, pa’ que regale a alguien que te gusta? Hay muchos sabores, hay de chocolates, de frutas, hay de eses que dejan la lengua azul, todos muy ricos!! Te gustaria? Con solamente dos reales te puedes llevar una bolsita con 5 caramelos! Que crees?”

“Hijo de la chingada, putamadre. Manejas un auto importado y ni siquiera bajó el vidrio para escucharme! No aguanto más esa gente! Piensan que los pobres no son problemas de ellos. Voy por el otro!”

– Buendía papito, como vamos hoy? Todo al cien? Hay caramelitos que saben bien a toda familia, vamos por una bolsita ahora? Hay de muchos sabores…

“Qué coño!! Viste como me ignoras? Puro mamón! Con el semáforo verde solo puedo aguardar el próximo puto que se detiene ahí en la calle. Voy mirar al inicio de la calle, pues de ahí viene mi próximo cliente.”

La Idea 2023. Canon BF-800, Fomapan BW100.

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Desaparecer virtualmente (ou uma paralaxe analógica)

Outro dia eu me dei conta de que eu nunca me vi. Faço uma ideia de como seja minha aparência, mas eu mesmo nunca conseguirei saber realmente como sou. Bom, através do tato consigo sentir meu rosto, a textura da minha pele, as curvas salientes, meus curtos pelos arrepiados ou a barba grossa. Consigo sentir a gordura da pele, a maciez da carne ou a dureza do osso. Consigo sentir as lágrimas saindo dos meus olhos e escorrendo pelas bochechas, enquanto minhas mãos tentam enxugá-las. E, talvez, próximo disso seja tudo que conseguirei experimentar e descrever sobre minha aparência real.
Quisera eu saber realmente como sou, pois apenas me conheço virtualmente. Necessito da lente de uma câmera, de uma superfície espelhada, dos olhos de outra pessoa que me observa por alguns instantes e marca no papel o que foi registrado em sua memória sobre a minha aparência. Para eu saber como sou, dependo sempre de outra pessoa, de outro objeto, de algo que capte a luz refletida pelo meu rosto.

Outro dia, caminhando pelas ruas de BH, me deparei com algumas vidraças espelhadas. Ainda que eu tentasse fugir do meu reflexo, meus olhos sempre enxergavam minha imagem. Meus olhos são dois globos captadores de luz, dispostos na cabeça de uma maneira que captem luz de diferentes ângulos, e meu cérebro faz o serviço de juntar essas duas imagens em apenas uma imagem coerente. Nossos dois olhos enxergam muito mais do que a gente supõe ser real. Nossos olhos nos tiram da superfície plana e nos fornece algo de profundidade, de forma, de relevo.
No reflexo das vidraças, alguma parte de mim sempre aparecia. Não consegui me esconder por inteiro, meus olhos me enganavam. Decidi registrar essa tentativa frustrada de não aparecer, de ver meu reflexo como eu me vejo.

Portava comigo uma câmera Olympus Pen-EE, com um filme PB Double-X, ISO 200, vencido. Através do visor posso ter apenas uma noção do que será registrado na película. O que eu miro não é o que a câmera capta. Eu sempre via algum reflexo de mim na vidraça, uma parte do corpo cuja luz não escapava aos meus olhos. A câmera, com sua lente única, apenas compreende o sentido de planificar a luz sob o mesmo ângulo. Ela não capta a luz como meus olhos. A fotografia me forneceu o momento de desaparecimento, de não me enxergar virtualmente, de não me enxergar mesmo com ajuda do espelho. Era pra registrar a frustração de enxergar uma imagem sempre virtual, e a câmera possibilitou que eu enxergasse o sujeito que se deteve alguns minutos para registrar o momento. Me encontrei na ausência.

Eu sou real, estou aqui, não me vejo. Todos me veem de alguma forma, sempre diferente do que eu imagino. Nesta fotografia, apenas o eu real, fotógrafo-artista-andarilho-flaneur-amador sem saber o que faz da vida, existe. Ou existiu naquele momento passado analógico.

La Idea, 2023

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NUH! Festival de Artes Gráficas

Dias 16, 17 e 18 de junho eu estarei na Funarte participando do NUH! Festival de Artes Gráficas. Serão 3 dias de atividades, mostras de vídeos, feiras, palestras, exposições, mostra de vídeos, live-painting, DJ´s, etc… Estarei com todo meu leque de gravuras, camisetas, adesivos, zines, spokecards, prints e cartazes para venda.

16 de Junho – Sexta – das 18 às 21h
17 e 18 de Junho – Sábado e Domingo – das 11 às 19
Funarte – MG: Rua Januária, 68 – Centro de BH

Reunião Aberta – Kasa Invisível – 27/05 – parte 1

No último sábado, 27/05, teve a reunião aberta da Kasa Invisível juntamente com a inauguração da Biblioteca Invisível, nesta Okupa que já marcou seu lugar na história do Centro de BH.


As atividades estavam marcadas para serem iniciadas às 15h, e nós chegamos pouco antes das 16h e a Biblioteca ainda não havia sido devidamente inaugurada/apresentada. Foi ótimo poder ver a apresentação e o acervo da Kasa que tem muitos títulos, extremamente organizado. Minha salva de palmas para o GT Biblioteca. O acervo pode ser consultado no link https://kasainvisivel.librarika.com e o aluguel/cadastro é feito na própria Kasa Invisível.

Logo após a inauguração da Biblioteca Invisível, no primeiro andar, subimos para a reunião aberta no segundo andar, onde foram apresentados alguns slides sobre o que é a Kasa Invisível, de onde ela surgiu, histórico, suas ações, o Coletivo que pensa a gestão do espaço, as dificuldades, redes de solidariedade e o que desejam/sonham para o futuro do espaço.

Histórico

No início da apresentação, alguns membrxs do Coletivo gestor do espaço se apresentaram e logo já afirmaram as 3 linhas de pensamento/ação/práxis que atua a Kasa: Ação Direta, Apoio Mútuo e Autonomia.
A ocupação da Kasa aconteceu em 2013, e foi antecedida por outras ações de ocupações do espaço urbano, sendo que xs integrantes da Kasa participaram de várias destas movimentações. Na apresentação foi falado sobre algumas iniciativas que dialogam mais diretamente com a Kasa, portanto, irei dar mais ênfase à elas, tangenciado algumas outras iniciativas que já foram descritas por Lucas Pereira no texto sobre Heterotopias Belorizontinas.
Das experiências narradas na apresentação, o Domingo 9 e 1/2 (2007-2010) talvez tenha sido a experiência mais duradoura e que possibilitou a consolidação da rede de jovens ativistas que hoje estão presentes ou que apoiam a atuação da Kasa Invisível. O evento consistia em encontrar um domingo por mês, no palco que foi construído debaixo do Viaduto Santa Tereza, de frente à entrada da Serraria Souza Pinto. O espaço havia sido recém reformado, e pouco tempo depois foi ocupado, por exemplo, pelo Duelo de MC´s. O Domingo 9 e 1/2 eram encontros de chamada aberta para discussões, bate-papos, contrainformação, amizades, apresentações artísticas, que não necessitavam de tópicos especiais/pré-determinados, nem de alguém responsável pelas convocatórias. Os encontros simplesmente aconteciam.
Também foi apresentada a iniciativa da Loja Grátis (2008-2009), ideia surgida no Domingo 9 e 1/2 e que acabou virando um espaço físico. Durante o Domingo 9 e 1/2 as pessoas poderiam levar pertences em boas condições de uso e disponibilizar para que qualquer pessoas pudesse pegar e usar, sem a necessidade de troca. Porém, com o tempo, as pessoas não levavam os pertences não coletados de volta, e um companheiro acabou acumulando tudo em casa. Daí veio a necessidade de um espaço físico onde esses pertences aptos para doação pudessem ser encontrados por qualquer pessoa, sem a necessidade de acúmulo na casa de ninguém, nem de um evento específico para que os objetos pudessem ser expostos. Assim surgiu a Loja Grátis que ocupava uma pequena loja no Mercado Novo, local este que estava em um andar marcado pelo abandono pós-incêndio, e que estava sendo cotado para se tornar um grande estacionamento no centro da capital.
Outra iniciativa que apareceu na apresentação foi o Espaço Ystilingue (2008~2012). O Espaço era uma sobreloja situada na varanda do Edifício Maletta, local que ficava fechado para transeuntes a partir de certo horário da noite. Lá era um ponto de apoio para guardar materiais, livros e também um espaço de encontro para saídas, reuniões, pequenos eventos, galeria de arte, biblioteca comunitária, videoteca, cooperativas.
Todas estas iniciativas eram marcadas por forte experimentalismo, também com propostas em compreender espaços que estão vagos/em desuso e como podem ser utilizados de outras formas.

Além disso, o início da Praia da Estação em 2010, com chamada aberta para concentração aos domingos às 9 e 1/2 da manhã (horário sugestivo) é também um tema que merece seu espaço no histórico de luta, pois o evento cresceu de tal forma que ampliou seu espaço de atuação, moldou-se a partir de outras estratégias e foi, posteriormente, cooptado por “lideranças políticas” cujo intuito era crescer dentro da política institucional. O Chamado aberto para a Praia foi uma resposta ao decreto de lei do então prefeito Márcio Lacerda que proibia eventos na Praça da Estação, sendo sua justificativa o excesso de barulho, multidões, vandalismos, etc.
Também foi comentado, sobretudo entre pessoas que estavam presentes na apresentação, de outra proposta que também atuou no Maletta de forma similar: o Gato Negro. O Gato Negro é um coletivo de difusão de ideias, discussão, ação direta sobre anarquismo/veganismo. O espaço contava com biblioteca, videoteca e também era um ponto de encontro e foi um espaço onde muitas redes foram criadas, inclusive por pessoas que hoje estão ativas na Kasa. O Ystilingue “bebeu” muito da experiência do Gato Negro, inclusive ambos espaços funcionavam em lojas cedidas por um compa que herdou as lojas no edifício.
As Jornadas de Junho (2013), série de manifestações contra o aumento das passagens de transportes coletivos, contras os gastos em reformas de estádios e a realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas no país e contra a utilização dos megaeventos como justificativa para remoção e despejo de milhares de famílias também foi um evento marcante, onde mais redes de luta e de apoio mútuo se consolidaram, e ocorreu no mesmo ano de ocupação da Kasa Invisível. Também foi um marco importante no fortalecimento de assembleias como a APH (Assembleia Popular Horizontal) e de alguns Grupos de Trabalho (essas informações ainda precisam ser confirmadas), como o GT de Mobilidade (que gerou Tarifa Zero).

Acho que vale a pena pontuar, também, outras iniciativas que ocorreram na capital e que não foram apresentadas/ou foram apresentadas de forma rápida na apresentação, e que EU considero que também foram atividades importantes, muitas também descritas no livro de Lucas Pereira linkado acima:
Vendendo Peixe (Mercado Novo), Escola Autônoma de Feriado – EAF (Casa Azucrina, e depois Casa Somática), Casa Somática (Vila Suzana), Terra Preta (Ocupação Guarani-Kaiowá/BH), Vá de Branco (Praça da Estação), Bicicletada (ruas de BH), Olympia Coop-bar (Maletta), Carnaval Revolução (aconteceu em diversos espaços, durante o período de carnaval), Insituto Helena Greco – IHG (Santa Tereza), Universidade Pirata (Viaduto Santa Tereza), Piolho Nababo (Leilão itinerante de arte com valor mínimo de R$1,99).

Como podemos ver, vários desses espaços, antes ocupados por iniciativas de jovens ativistas que lutaram muito para conseguir o direito à participação na vida urbana, hoje são espaços gentrificados ou em processo de gentrificação, voltados para um público da elite intelectual e negados à população comum. Bares com valores inacessíveis, ambientes livres de ambulantes e com alta vigilância. Essa discussão se encontra presente nas atividades da Kasa, pois ela se encontra em uma enorme região de disputa, um bairro nobre na região central da cidade, cada vez mais visada aos processos de gentrificação e higienização. A consolidação desta okupação como um ponto de referência para atividades e encontros para estes tipos de discussões e ações, trafegam na contra-mão da especulação imobiliária e dos planos que a política institucional propõem para a região.